O direito a brincar, reconhecido na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, deve continuar a ser um direito nas escolas portuguesas. Quem o assegura é Tiago Brandão Rodrigues, Ministro da Educação: “As crianças têm de continuar a brincar e têm de ter os instrumentos para continuar a brincar tanto no primeiro, segundo e até terceiro ciclos” para “ludicamente aprenderem”. Sobre crianças que ficam fechadas toda a manhã ou tarde sem poderem sair das salas de aula e ir ao recreio, o Ministro responde com a apologia das “soluções criativas” que muitas escolas conseguiram encontrar adaptando os recreios para permitir o convívio. “Temos de encontrar estratégias para que o isolamento social não exista”, afirmou o Ministro da Educação no programa da VISÃO de entrevistas aos principais protagonistas políticos.
“Infraestruturalmente as escolas não foram pensadas para um momento Covid”, sublinhou. “O ensino tem de continuar a acontecer com os condicionalismo que temos. Não temos a escola sonhada, nem a escola ideal, mas a escola possível.”
Não temos a escola sonhada, nem a escola ideal, mas a escola possível
“Não me quero impor ao papel das direções das escolas. Não podemos dizer na segunda, quartas e sexta que as escolas têm autonomia e responsabilidade, e nas, terças, quintas e sábados dizer que a autonomia é só algo que está nos normativos legais e o Ministro da Educação tem de dizer o que fazer. Nunca a autonomia foi tão importante como num momento como este. As escolas têm feito um trabalho muito meritório”, disse o Ministro.
Sobre os 12 surtos que existem agora nas escolas portuguesas, com 78 casos positivos, como foi anteontem revelado pela DGS, Tiago Brandão Rodrigues não se deixa impressionar. “Temos 1, 4 milhões de pessoas nas nossas escolas e 78 casos nos últimos dias. Não estou a minimizar nem a diminuir a importância destes números, mas o certo é que se olharmos para o sistema de ensino como se fosse uma região do País, o número de casos positivos nas escolas é o mais baixo do País, mesmo mais baixo do que o que acontece nos Açores e a Madeira, onde há poucos casos.” As razões para estes baixos números são explicadas pelos protocolos instituídos nas escolas. “Partimos em vantagem nas nossas escolas, porque ao termos as bolhas e os circuitos e sabermos quem convive com quem é muito mais fácil detetarmos e isolarmos profilaticamente um conjunto de pessoas do que acontece na sociedade.”
Interrogado sobre a falta de professores e ao arranque do ano letivo com turmas sem vários docentes, Tiago Brandão Rodrigues diz que “a substituição dos professores é um sistema muito oleado”. “Conseguimos substituir os professores com relativa celeridade. Todas as semanas correm reservas de recrutamento que substituem os professores que eventualmente estejam num sistema de proteção por baixa médica ou que pertençam aos grupos de risco”, explica. “Sabemos que as necessidades que temos de professores e a oferta disponível são uma luva e uma mão que não encaixam perfeitamente”, admite porém.
Acerca de um caso concreto, na Escola Rainha Dona Amélia, em Lisboa, onde algumas turmas arrancaram o ano com falta de professores em seis disciplinas, o Ministro é perentório: mais do que falta de diligência, houve “negligência”. “A diretora da escola foi negligente na substituição [dos professores] e não pediu aquilo a que tinha direito. E os serviços do Ministério da Educação contactaram a diretora para entender o que tinha acontecido. As pessoas erram, nós entendemos, mas a escola não fez o trabalho que devia ter feito”, afirma.
Acreditamos que nas próximas semanas as escolas possuam começar a ter estes assistentes operacionais
Sobre os 1500 assistentes operacionais anunciados para reforçar a equipa existente, o processo está em curso. “Acreditamos que nas próximas semanas as escolas possuam começar a ter estes assistentes operacionais”, disse o ministro. Ontem foi divulgado um inquérito OCDE, realizado em 2018, durante a realização dos testes PISA, que revelou que Portugal é o terceiro país da OCDE onde os diretores das escolas mais sentem a falta de recursos humanos e consideram que isso influencia negativamente o desempenho escolar dos alunos.
Computadores para os mais desfavorecidos
“O Ministério da Educação vai distribuir já neste primeiro período um conjunto de 100 mil computadores com conectividade, mas a escola digital é muito mais do que isso”, sublinhou o Ministro da Educação.
A pandemia vem agravar diferenças sociais – com este mesmo estudo a mostrar que Portugal o quarto país da OCDE onde os alunos desfavorecidos mais reprovam. “Sabemos que numa situação pandémica, o facto de as crianças estarem em casa agoniza ainda mais as diferenças socioeconómicas. Por isso é tão importante estarem nas escolas, porque a escola é o serviço público com maior capilaridade que funciona como verdadeiro elevador social. O lugar das crianças é nas escolas, e aí podemos dar a volta a esta quase inevitabilidade e não tornar irrevogável o caminho destas crianças. E temos de acompanhar estas crianças.”
Esse trabalho [de construção do currículo da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento] foi feito por um conjunto de especialistas com muita transversalidade e sem nenhum tipo de ideologia agarrada a esse trabalho cientifico e técnico
Sobre a polémica da disciplina da Cidadania e Desenvolvimento, Tiago Brandão Rodrigues diz que já foi dito tudo o que havia para dizer sobre esta matéria. “Era uma disciplina que já existia nos governos constitucionais de Passos Coelhos. “Todos entendemos o quão crucial e vital é uma verdadeira educação para a cidadania.” Rever currículos, nomeadamente em matéria de identidade de género que mais contestação suscitou, não é uma opção. “Esse trabalho [de construção do currículo da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento] foi feito por um conjunto de especialistas com muita transversalidade e sem nenhum tipo de ideologia agarrada a esse trabalho cientifico e técnico.”
“Esta foi uma questão que tomou aspetos esdrúxulos porque alimenta uma partilha ideológica extremada, e tem um grupo de precursores que a quer utilizar para terreno fértil extremismos”, rematou o Ministro da Educação.
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