António Costa pode ser Presidente do Conselho Europeu, mas estar em Bruxelas não o afastou da política nacional. E as declarações do líder da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS – uma das estruturas mais importantes do partido – fizeram-no mesmo sair “em defesa da honra do PS”, num artigo de opinião, no Público, que assina com José Leitão e Pedro Silva Pereira.
O ataque à ideia de que a Câmara de Loures poderia tirar casas municipais a pessoas que se tenham envolvido nos tumultos que se seguiram à morte de Odair Moniz começa por ser jurídico, mas é essencialmente político. Costa diz mesmo que “é uma ideia que ofende os valores, a cultura e a identidade do PS”.
“A identidade do PS foi construída ao longo da sua história de intensos combates políticos, desde sempre ancorados nos valores do humanismo, da liberdade, do Estado de Direito, da igualdade e da justiça social”, lê-se no texto, que destaca “o legado do Partido Socialista nas políticas públicas de integração dos imigrantes, pelas quais os signatários foram responsáveis em diversas posições e diferentes momentos históricos”.
E esses momentos históricos, recordam os autores do artigo, marcaram sobretudo a FAUL, a estrutura socialista da qual o autarca de Loures é o presidente recém-eleito.
“Convém lembrar que foi justamente na FAUL (Federação da Área Urbana de Lisboa, do PS), entre os anos de 1990 e 1992, que se começaram a desenhar as primeiras políticas públicas socialistas a favor da integração dos imigrantes, que vieram a inspirar importantes projetos de lei atributivos de direitos, elaborados com a participação ativa das associações de imigrantes”, recordam, notando que foram Governos socialistas que criaram o Alto-Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas e mais tarde a AIMA, mas também direitos para o trabalho sem discriminação, o direito a prestações sociais como o Rendimento Mínimo Garantido, o direito de acesso ao Serviço Nacional de Saúde, o direito de acesso à habitação social e o direito à participação nas eleições locais.
O ataque a Pedro Nuno Santos
Se Pedro Nuno Santos defendeu também a matriz socialista, acabou por desvalorizar o peso das declarações de Ricardo Leão, referindo-se a eles como “um momento menos bom”. Mas o texto assinado por António Costa defende que é impossível desvalorizar um posicionamento que contraria o legado humanista do PS.
“Quando um dirigente socialista ofende gravemente os valores, a identidade e a cultura do PS, não há calculismo taticista que o possa desvalorizar. É esse legado do Partido Socialista que sentimos agora o dever de recordar e defender. Em defesa da honra do PS!”, lê-se no texto.
O ataque feito por António Costa fragiliza politicamente Ricardo Leão. E esse é um problema acrescido para Pedro Nuno Santos, que quis sempre gerir com pinças o distanciamento em relação a Leão neste caso.
É que, além de líder da FAUL, Ricardo Leão é presidente da Câmara de Loures – que conseguiu conquistar ao PCP – e deverá ser candidato nas próximas autárquicas naquela é atualmente uma das maiores autarquias nas mãos do PS.
O tema dividiu o núcleo duro pedronunista, entre os que consideraram inaceitável a forma como Ricardo Leão aprovou uma recomendação do Chega em Loures e fez um discurso populista anunciando sanções que violam a lei e a Constituição e os que entendem que Leão é demasiado importante na estrutura socialista para ser deixado cair e que o seu pensamento não anda longe do que pensam outros autarcas do partido e é uma forma de impedir André Ventura de, a nível local, se apresentar como a única força política que contraria o facilitismo na atribuição de apoios sociais.
O texto de António Costa não podia ser mais claro na resposta que dá aos que defendem essa tese. “Enfrentar o Chega exige firmeza nos princípios e combater as perceções fáceis com a realidade dos factos, o que tem de ser possível num dos países mais seguros do mundo, em que está comprovado que não existe nenhuma relação entre criminalidade e imigração e em que, pelo contrário, a contribuição da imigração para o crescimento económico e para a sustentabilidade do Estado Social é objetivamente reconhecida”.