Era dos discursos mais esperados deste sábado e é, até ao momento, o momento alto do Congresso. A intervenção de Luís Montenegro foi a que galvanizou mais as hostes sociais-democratas. O ex-líder parlamentar do PSD deixou vários recados a Rui Rio e conseguiu que as atenções se centrassem em si. Não apenas pela rigidez da sua mensagem como também pelo anúncio que fez já perto do final: “no dia 5 de abril cumpro 16 anos de trabalho parlamentar intenso e, por isso, escolhi esse dia para deixar o Parlamento.” Os congressistas começaram a olhar-se mutuamente tentando esconder o espanto enquanto mantinham a atenção.
O anúncio foi direto e deixou no ar do Centro de Congressos de Lisboa um silêncio que ainda não tinha sido percetível neste segundo dia da reunião magna do PSD. Seguiu-se a garantia de que iria andar por aí, “nas rádios e nas televisões”, a combater politicamente e a “defender o partido.”
Mas antes da nota pessoal, que apanhou os congressistas de surpresa, houve ataques a quem o criticou e avisos duros à nova direção. “É um erro dizer que temos de nos recentrar porque nós nunca nos descentrámos”, disse para introduzir no seu discurso o tema do bloco central, que utilizou para desferir os primeiros golpes ao líder eleito. Ao longo da campanha eleitoral Rui Rio nunca se opôs à hipótese de vir a fazer parte de um bloco central “num cenário extraordinário.” Questionando-o, Montenegro estava a pôr em causa a linha de argumentação do novo presidente laranja. Conotando o PS como um partido controlado pelos bloquistas, o deputado considerou que seria um “suicídio político” se o PSD transformasse “na bengala desse partido socialista bloquista.”
As críticas, que já geravam desconforto em alguns congressistas apoiantes de Rio, intensificaram-se. Luís Montenegro colocou um prazo de validade ao novo presidente social-democrata, dirigindo-se diretamente ao seu destinatário: “Rui Rio e o PSD só podem ter um cenário: ganhar as terceiras eleições legislativas consecutivas e alcançar uma maioria não socialista no parlamento.”
A cada frase, a cada sounbite, o ainda parlamentar ia conquistando os delegados ao Congresso. A atenção de toda a sala estava concentrada no palco. Reservou as últimas palavras para aqueles que o acusaram de “falta de coragem ou de taticismo.” Depois de pedir desculpa à mesa pela extensão do seu discurso, disse reprovar “todas as provocações e insinuações” que lhe foram feitas nas últimas semanas. “Se me querem dar o selo de calculismo podem dar, mas não se esqueçam de que há aí alguém que tem a caderneta cheia.” Tirada forte, reação entusiasta. Começava a ser um padrão. Plateia e orador pareciam sincronizados, esperando sempre da outra parte a atitude correspondente.
Garantiu que não seria “oposição interna de Rui Rio” mas não se pôs de parte para uma futura luta pela liderança do PSD: “Desta vez disse não mas se alguma vez disser que sim não vou pedir licença a ninguém.” Os presentes, como que por impulso, levantaram-se e a aplaudir. Para o fim, ficou uma palavra de boa sorte – ou um presente envenenado? – para Rui Rio: “Desejo para si aquilo que desejaria para mim no seu lugar.” A plateia ficou de pé, dedos em forma de “vê” em riste, balançando ao ritmo dos gritos “PSD, PSD.” O primeiro passo de Luís Montenegro no caminho para a liderança do partido pode ter sido dado hoje. Chegará em primeiro?