O estado do Alabama, no sul dos EUA, executou mesmo esta quinta-feira o recluso Kenneth Eugene Smith, de 58 anos, com gás nitrogénio, método utilizado pela primeira vez no país e alvo de críticas internacionais. A execução foi realizada no Centro Correcional William C. Holman, em Atmore.
Smith, condenado à morte por ter assassinado uma mulher por encomenda em 1988 e no corredor da morte há 28 anos, foi declarado morto às 20h25 (02h25 desta sexta-feira, em Lisboa), depois de inalar gás nitrogénio através de uma máscara e ficar sem oxigénio. O processo começou às 19h53 locais, segundo funcionários do Departamento de Correções do Alabama.
De acordo com testemunhas que assistiram à execução – a mulher e outros familiares estavam presentes – este processo durou cerca de 22 minutos e o homem terá aparentemente permanecido consciente durante vários minutos. Não se sabe, contudo, exatamente quanto tempo Smith demorou a morrer.
Isto contraria as previsões das autoridades, que tinham previsto a perda de consciência em segundos e a morte em minutos, ou seja, um processo rápido. O estado do Alabama, que trabalha há anos num protocolo para aplicar a pena de morte com esta nova técnica de hipóxia por azoto, argumentou em tribunal que este “método de execução é o “mais indolor e humano que se conhece”.
“Não vimos alguém a ficar inconsciente em 30 segundos. O que vimos foram minutos de alguém a lutar pela vida”, afirmou, por outro lado, o reverendo Jeff Hood, conselheiro espiritual de Smith, que assistiu à execução. “Vimos todo o tipo de coisas a sair da máscara. A máscara estava amarrada à maca, rasgando-lhe a cabeça (…) vezes sem conta”, acrescentou, referindo ainda que foi “a coisa mais horrível” a que já assistiu.
Durante pelo menos dois minutos, o recluso pareceu tremer e contorcer-se, tendo-se seguido vários minutos de respiração profunda, até que a respiração deixou de ser percetível, referiram ainda as testemunhas.
Já o comissário John Hamm disse, numa conferência de imprensa, que o homem parecia estar a suster a respiração “o máximo que podia”. “Houve alguns movimentos involuntários e alguma respiração agónica, o que era de esperar e faz parte dos efeitos secundários que vimos e investigámos sobre a hipoxia de azoto”, referiu ainda, acrescentando que “nada” decorreu “foi fora do normal” do que se previa.
Numa declaração antes da execução, Smith disse que “a humanidade tinha dado “um passo atrás” e que ia “embora com amor, paz e luz”, agradecendo, depois, à família por todo o apoio.
Na última quarta-feira, o Supremo Tribunal dos Estados Unidos tinha autorizado a execução com gás nitrogénio apesar da indignação que surgiu um pouco por todo o mundo e dos pedidos para que as autoridades norte-americanas interviessem a tempo.
Ravina Shamdasani, Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, afirmou estar “seriamente preocupada” com a utilização deste novo método e apelou ao estado do Alabama para suspender a execução e abster-se “de efetuar mais execuções deste tipo”.
Peritos das Nações Unidas referiram ainda estar alarmados com a possibilidade de uma execução com gás nitrogénio “resultar numa morte dolorosa e humilhante”, uma vez que que não existem evidências do contrário. Os especialistas alertaram ainda para o facto de este tipo de método poder “violar a proibição da tortura e de outras penas cruéis, desumanas ou degradantes”.
A organização não governamental de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional advertiu também que “este novo método não testado pode ser extremamente doloroso” para o preso, “em violação dos tratados internacionais de direitos humanos que os Estados Unidos ratificaram”.
Já a defesa argumentou que o direito de Smith a não ser sujeito a penas cruéis, consagrado na Oitava Emenda da Constituição, foi violado.
“Smith obteve o que pediu”, afirma governadora do Alabama
No método de execução por azoto, é colocada uma máscara aos condenados, que cobre a boca e o nariz e que substitui o oxigénio por gás nitrogénio, ou seja, a pessoa continua a respirar normalmente, mas sem a presença de oxigénio. Em teoria, isto provocará a morte em poucos minutos.
Numa declaração, Kay Ivey, governadora do estado do Alabama, afirmou que “a execução foi legalmente levada a cabo por hipóxia de azoto, o método anteriormente solicitado por Smith como alternativa à injeção letal”.
O Alabama é o primeiro estado a desenvolver uma alternativa às injeções letais, o método mais comum nas últimas décadas, dada a dificuldade para adquirir os medicamentos nos últimos anos, devido à recusa das empresas farmacêuticas em utilizá-los para este fim, tendo sido aprovado em mais dois estados norte-americanos: Oklahoma e o Mississippi.
“A 18 de março de 1988, a vida de Elizabeth Sennett, de 45 anos, foi-lhe brutalmente tirada por Kenneth Eugene Smith”, acrescentou ainda Ivey, referindo que “após mais de 30 anos e tentativas sucessivas de burlar o sistema, Smith pagou pelos seus crimes horríveis”.
Elizabeth Dorlene Sennett foi espancada e esfaqueada repetidamente por Smith em 1988, em Colbert County, no norte do Alabama, sendo que o condenado admitiu ter sido contratado pelo marido da vítima. Na altura de definir a sentença de Smith, um júri votou por 11 a 1 para decidir pela prisão perpétua, mas o juiz anulou a decisão e enviou o homem para o corredor da morte. “Finalmente, Smith obteve o que pediu e este caso pode finalmente ser encerrado”, rematou a governadora.
Mike Sennett, filho de Elizabeth, referiu, numa declaração aos meios de comunicação social após a morte de Smith, que o dia foi “agridoce”. “Nada do que aconteceu aqui hoje vai trazer a minha mãe de volta”, disse. “Vou terminar a dizer que Elizabeth Dorlene Sennett teve a sua justiça esta noite”, rematou.
O Alabama tentou executar Smith em novembro de 2022, mas não foi possível inserir as injeções intravenosas. No âmbito de um acordo de confissão subsequente, o Alabama comprometeu-se a nunca mais tentar matar Smith por injeção letal.