O Parlamento do Uganda vai voltar a discutir um projeto de lei que criminaliza a homossexualidade e a identidade de género, cuja eventual aprovação irá violar vários direitos fundamentais, denunciou hoje a organização não-governamental Human Rights Watch (HRW).
O “Projeto de Lei Anti-Homossexualidade 2023” foi apresentado esta quinta-feira ao Parlamento em Kampala por um deputado, Asuman Basalirwa, e apresenta-se como uma versão revista e ainda mais abrangente do que a Lei Anti-Homossexualidade de 2014.
Essa lei reforçava as penas de prisão existentes por conduta sexual entre pessoas do mesmo sexo e proibia a “promoção da homossexualidade”, mas foi derrubada por um tribunal por motivos processuais.
“Uma das características mais extremas deste novo projeto de lei é que criminaliza as pessoas simplesmente por serem quem são, para além de infringir ainda mais os direitos à privacidade, e as liberdades de expressão e associação, já por si comprometidas no Uganda”, sublinha Oryem Nyeko, investigador ugandês da HRW, citado num comunicado divulgado pela organização de defesa dos direitos humanos.
“Os políticos ugandeses deveriam concentrar-se em aprovar leis que protejam as minorias vulneráveis e afirmem os direitos fundamentais e deixar de perseguir as pessoas LGBT para alcançarem capital político”, acrescentou.
Tal como a lei aprovada em 2014, este projeto alarga a criminalização de atos entre pessoas do mesmo sexo, incluindo proibições como a de atos como tocar noutra pessoa “com a intenção de cometer um ato de homossexualidade”.
As pessoas consideradas culpadas da “ofensa da homossexualidade” podem ser presas por um período máximo de dez anos. O projeto inclui igualmente uma punição de até cinco anos de prisão pela “promoção da homossexualidade” e declara toda a conduta sexual entre pessoas do mesmo sexo como não consensual.
O código penal do Uganda já pune “o conhecimento carnal contra a ordem da natureza”, expressão interpretada como significando a interação sexual entre pessoas do mesmo sexo, com uma punição prisão perpétua, embora esta pena, sobrevivente da moldura penal colonial, raramente seja aplicada.
O deputado que assina o novo projeto de lei admitiu que o seu objetivo é “olhar para esta lei colonial e sintonizá-la com a situação atual”.
Esta não é a primeira vez que o Parlamento ugandês tenta voltar a criminalizar a homossexualidade desde que a lei de 2014 foi derrubada. Em 2021, aprovou o Projeto de Lei de Crimes Sexuais, que criminalizou qualquer “ato sexual entre pessoas do mesmo sexo”, bem como o sexo anal entre pessoas de qualquer sexo, com até 10 anos de prisão.
Em 3 de agosto de 2021, o Presidente Yoweri Museveni rejeitou o Projeto de Lei sobre Crimes Sexuais e devolveu-o ao Parlamento, declarando que cobria crimes já previstos no Código Penal.
Estas tentativas de criminalização da homossexualidade são sempre seguidas de períodos de aumento da repressão das minorias sexuais no Uganda, alerta ainda a HRW.
“No espaço de cinco meses após a aprovação da Lei Anti-Homosexualidade de 2013, as pessoas LGBT enfrentaram um aumento notável de detenções arbitrárias, abuso e extorsão policial, perda de emprego, despejos e sem-abrigo, e muitas pessoas fugiram do país”, sublinha-se no comunicado.
“O facto de o Governo ugandês visar uma minoria vulnerável e desviar a atenção de uma maior repressão dos grupos defensores de direitos é uma tática demasiado familiar”, segundo Nyeko.
“O que o Governo está a tentar fazer deve fazer soar o alarme entre os grupos da sociedade civil no Uganda, e na comunidade internacional, uma vez que assinala um aumento da repressão e a asfixia das vozes da oposição e dos grupos da sociedade civil em geral”, acrescentou o investigador da HRW.
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