Universidades públicas reabriram na quarta-feira, pela primeira vez, em seis províncias afegãs desde a tomada dos talibãs em agosto de 2021, com algumas alunas a frequentarem aulas.
Desde a tomada de posse dos talibãs que as estudantes do sexo feminino foram proibidas de regressar ao ensino secundário e superior, medida que veio reforçar o receio de que as mulheres fossem impedidas de prosseguir os estudos – como já havia acontecido no passado governo talibã de 1996 a 2001.
Apesar dos apelos de ativistas, estudantes e da própria comunidade internacional, desde o fim das férias de verão que apenas os estudantes do sexo masculino regressaram às aulas, regra que se manteve até à passada quarta-feira.
Desde agosto do ano passado que as mulheres têm enfrentado o regresso de muitas medidas que restringiram, no passado, as suas liberdades, tendo sido proibidas de seguir a sua carreira em muitos setores com exceção da saúde e ensino. Já as estudantes do sexo feminino foram proibidas de seguir para o ensino secundário e superior.
As universidades públicas nas províncias de Nangarhar, Kandahar Helmand, Farah, Nimroz e Laghman estão agora abertas a mulheres, apenas 6 em 34 províncias do Afeganistão.
Shaker Wahidi, o Ministro para a Educação Superior no Afeganistão disse, em resposta à CNN, que a abertura das universidades nestas províncias estava ligada às temperaturas amenas que as caracterizam. Universidades em zonas mais frias como Cabul, cujas temperaturas têm tendência a manter-se nos graus negativos, vão reabrir em março tanto para homens como para mulheres, afirma.
Ainda assim, o governo talibã tem sido bastante vago nos seus planos para a educação feminina, referindo apenas estar a preparar “instruções especiais” para a educação de estudantes do sexo feminino.
As restrições
De acordo com o Ministério da Educação do ex-governo afegão, 10% dos 12 mil estudantes da Universidade de Kandahar eram mulheres antes da tomada de posse dos Taliban. Uma testemunha disse à Reuters que na cidade de Jalalabad, no leste do país, viu estudantes do sexo feminino a entrar por uma porta diferente na Universidade de Nangarhar, uma das instituições reabertas esta semana às mulheres.
Também à Reuters uma estudante de medicina da Universidade de Nangarhar confirmou que as aulas foram separadas por género, mas não ficou claro se poderiam ser dadas por professores do sexo masculino ou se poderiam interagir fora da sala de aula com alunos do sexo masculino.
“Apenas os nossos turnos de estudo são separados, embora nos tenham dito para não andarmos pela universidade até que o tempo dos meninos termine”, disse a estudante. “Apesar de todas as mudanças e condições, ainda quero continuar porque a minha educação não deve ficar incompleta”, acrescentou.
No que toca ao ensino secundário, Bilal Karimi, porta-voz dos Taliban, confirmou à CNN que o Ministério da Educação do Afeganistão está a trabalhar num plano para reiniciar o ensino secundário das estudantes do sexo feminino no novo ano letivo, em 21 de março. O governo negou, inclusive, as alegações de que as alunas afegãs seriam banidas das escolas secundárias, mas acrescentou que só poderão regressar depois de desenvolvido um sistema de transporte seguro para as mesmas.
O que diz quem está de fora
A comunidade internacional fez da educação das meninas e mulheres uma das principais exigências nas negociações internacionais, à medida que o próprio governo talibã procura ajuda externa.
De facto, o próprio governo Taliban já veio culpar a comunidade internacional pela crise vivida atualmente no Afeganistão, reforçando, até, em conferência de imprensa, que não pretende ajuda “para os responsáveis (do regime)”. “Precisamos disso para o nosso povo”. O governo acrescentou ainda que cumpriu as promessas de paz e segurança e que devia ser reconhecido.
Essa paz e segurança partem, também, e sob o olhar internacional, do reconhecimento dos direitos das mulheres, constantemente exaltados e reforçados por organizações como a ONU. “Vamos todos apoiar o regresso dos jovens estudantes afegãos do sexo feminino e masculino às universidades em todo o Afeganistão”, escreveu a enviada especial do secretário-geral da ONU para o Afeganistão, Deborah Lyons, num tweet.
A advogada de direitos humanos e membro do Programa de Resposta a Crises da Amnistia Internacional, Nicolette Waldman, também saudou as vagas nas universidades, mas relembrou que é necessária mais orientação para as estudantes mais jovens. “Agora esperamos por notícias semelhantes sobre as escolas secundárias, que a grande maioria das meninas afegãs ainda está impedida de frequentar”, escreveu Waldman também na sua conta de Twitter.
A crise afegã tem causado preocupação na comunidade internacional e vários grupos de ajuda vieram chamar a atenção para a situação financeira do país, à qual se aliam décadas de guerra que têm empurrado o Afeganistão para uma crise humanitária.
Segundo a ONU, mais de metade dos 39 milhões de habitantes do país sofre fome extrema e o secretário-geral da ONU, António Guterres, já descreveu o Afeganistão como estando “pendurado por um fio”.