A estabilidade foi, durante 16 anos, o principal trunfo político que Angela Merkel serviu aos alemães. Esse tempo chegou ao fim, e as eleições de domingo, 26, foram claras quanto ao que os eleitores querem para o futuro: uma mudança na governação e, acima de tudo, alguém em Berlim que os possa ajudar a enfrentar, com êxito, os grandes e urgentes desafios com que o país se confronta, como as alterações climáticas, a transição digital e a modernização das infraestruturas. De preferência, já sem os compromissos paralisantes e a ausência de decisões estratégicas que marcaram os últimos anos da chamada Grande Coligação (entre democratas-cristãos e sociais-democratas), chefiada por Merkel. Estas tarefas são mais urgentes do que nunca e, se não forem bem-sucedidas, podem abalar seriamente a poderosa economia alemã, que parece inabalável quando vista de longe, mas que, de perto, se percebe estar seriamente ameaçada. Num mundo em que o centro geoestratégico começa a deslocar-se para a região do Indo-Pacífico, em vez do Atlântico, de facto, a economia alemã continua assente na indústria do século passado e está muito exposta aos riscos que se avizinham, como foi evidente na tragédia das inundações do verão passado, bem como na quase falta de comparência que os alemães demonstram, atualmente, nas empresas tecnológicas que irão marcar o futuro.

Ao fragmentarem a distribuição de lugares no parlamento, de uma forma nunca vista, os alemães ditaram que, embora o SPD (social-democrata) e a CDU/CSU (democratas-cristãos) continuem a ser os partidos mais votados (ambos em redor dos 25% de votos), o futuro tem de ser planeado e gerido com a ajuda de outros mais pequenos. A continuação da Grande Coligação – que há quatro anos demorou seis meses a ser formada – não é desejada por ninguém, embora ainda seja matematicamente possível. Também não se pode ainda excluir a hipótese de tanto o social-democrata Olaf Scholz (25,7% dos votos) como o democrata-cristão Armin Laschet (24,1%) poderem ocupar o lugar de Merkel – apesar de o segundo estar a perder terreno, dia para dia, atacado no interior do seu partido, depois de ter protagonizado o pior resultado de sempre na história da CDU. Do que ninguém tem dúvidas é, isso sim, a quase inevitabilidade da presença, na coligação do próximo governo, dos Verdes e dos liberais do FDP. É para eles que Scholz mais olha, convencido, até, de que poderá alcançar um acordo mais rápido do que muitos pensavam.