Mǎ Yún, mais conhecido pelo pseudónimo Jack Ma, é um empresário e investidor, mas também filantropo chinês: além das bolsas que a sua fundação entrega, durante a pandemia doou dezenas de milhões de equipamentos de proteção individual em todo o mundo, além de mais de 2 mil ventiladores à cidade de Nova Iorque. Cofundador e presidente executivo do Alibaba Group, um conjunto de empresas tecnológicas multinacionais, é considerado um dos homens mais ricos do mundo: com uma fortuna avaliada em mais de 45 mil milhões de euros, é também frequentemente listado como dos mais poderosos pela Forbes. É verdade que, em novembro de 2018, o chinês Diário do Povo o identificou como membro do Partido Comunista da China, mas isso foi algo que muito surpreendeu os observadores estrangeiros, como notava então o Wall Street Journal.
Há mês e meio, deu nas vistas com um discurso muito crítico à conduta financeira do seu país. A China reagiu, pressionando as suas empresas e provocando uma enorme queda na sua cotação. Mas de Jack Ma nem sinal: há semanas que deixou de ser visto nos circuitos do costume.
Foi em 24 de outubro de 2020, durante uma cimeira, que o magnata da tecnologia de 56 anos atacou publicamente o sistema bancário da China e apelou a reformas profundas – instando as autoridades chineses a “não utilizarem a regulamentação de ontem para gerir o futuro” e insistindo que o país precisava de “menos burocracia”. Terá mesmo dito, segundo os media internacionais, que “os bancos chineses operam com uma mentalidade de loja de penhores”. Um mês depois, era esperado no último episódio do “Africa’s Business Heroes”, um programa de talentos da fundação com o seu nome através do qual 10 empresários africanos emergentes recebem uma bolsa partilhada de 1,2 milhões de euros para concretizarem as suas ideias.
Mas em vez de Jack Ma apareceu Lucy Peng, cofundadora da Alibaba, a famosa cadeia de lojas online – e a sua fotografia, nota o Financial Times, foi também retirada da página do júri. Um porta-voz da companhia terá justificado que “o Sr. Ma já não podia fazer parte do final do programa devido a um conflito de horários”. Mas logo muitos lembraram que, em agosto, no seu twitter, Jack Ma garantia que mal podia esperar para apresentar os seus prémios. E os rumores sobre o seu paradeiro avolumaram-se ainda mais depois de terem sido conhecidas uma série de medidas contra as suas empresas, incluindo uma investigação sobre alegadas más condutas empresariais.
Logo a seguir ao famoso discurso num fórum em Shangai, a China impediu a Oferta Pública Inicial do grupo Ant, o braço financeiro da Alibaba, que tencionava abrir o seu capital ao público, naquela que seria a maior entrada em bolsa de sempre. Mas não só: semanas mais tarde, o governo chinês abriu também uma investigação às suas empresas, acusando-o de forças outras a assinar acordos exclusivos. O regulador do país considerara que a empresa expandira a sua participação na cadeia de lojas Intime Retail sem autorização e multou a subsidiária de livros eletrónicos China Literature, também propriedade da Alibaba. Já na semana passada, o governo chinês ordenou ainda que o Ant Group, dono igualmente da maior plataforma de pagamento digital da China, Alipay, reduzisse suas operações após expressar preocupações de que a sua governação corporativa “não era sólida”. Citado pela CNN, o analista de mercado da Oanda, Jeffrey Halley, considerou logo óbvio na altura que “os comentários claramente não ressoaram nos corredores do poder em Pequim”.
Sem sinais do multimilionário, os efeitos económicos de tudo isto não demoraram, acentuando-se a tendência de queda do valor das suas ações em bolsa, com o grupo a registar uma tendência de queda acentuada desde o verão e perdas da ordem dos 9 mil milhões de euros. “Sem dúvida, o objetivo é controlar Ma”, disse ao Wall Street Journal um consultor do comité anti monopólio do conselho de estado da China, o principal órgão governamental do país, antes de se socorrer de uma comparação fora do comum – mas que poderá dar um outro tipo de pista sobre os acontecimentos: “Estão a querer colocar uma rédea num cavalo.”
É que, se até há pouco, a popularidade de Jack Ma no seu país estava no auge, agora está abaixo de zero. Perante as acusações de monopólio e outras práticas corporativas, Ma tornou-se mesmo o homem que os chineses adoram odiar e passou a ser chamado de “vilão” e “capitalista maligno”. Nas notícias publicadas a seu respeito, um número cada vez maior de leitores deixa comentários a citar Marx: “Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos”. Um ressentimento que, sublinha ainda a Folha de São Paulo, o governo chinês parece muito mais que disposto a aproveitar.