Emmanuel Macron fez tudo como mandam as regras. Para arranque da campanha à segunda volta das eleições presidenciais, marcou um encontro com os delegados sindicais da fábrica da Whirlpool, na sua Amiens natal, a mesma cidade onde, há uns meses, rodeado de amigos e familiares, tinha anunciado que seria candidato à corrida ao Eliseu. Foi naquela cidade do norte de França que fez a escola primária e o liceu e que, em 1993, escandalizou a comunidade ao se apaixonar (e ser correspondido) por uma professora de francês e latim, dinamizadora de um grupo de teatro, 24 anos mais velha. Ele tinha 15, era um aluno brilhante; ela tinha 39, era casada e já tinha três filhos. A história começou aí e, por mais que tenha sido contrariada, acabaram por casar, em 2007.
Foi portanto na sua terra natal que Emmanuel quis começar esta aventura presidencial. E foi também aí que deu o pontapé de saída para a segunda volta. Escolheu uma fábrica onde estão em risco 290 postos de trabalho e se vive o fantasma da deslocalização para a Polónia
Macron marcou a conversa com os delegados sindicais e estava no interior das instalações enquanto a sua adversária, Marine Le Pen, improvisava uma visita surpresa ao parque de estacionamento onde muitos trabalhadores esperavam, para ter os seus minutos de fama. Marine posou em fotografias, tirou selfies e garantiu que, com ela, a Whirlpool Amiens não fecharia. “Disse-o, repito-o, assumo-o e comprometo-me firmemente”, deixou Marine escrito, num comunicado enviado às redações. À saída do encontro, Macron tinha tudo contra si. Ex-ministro da Economia, não podia garantir que a fábrica não fecharia. E por mais que jurasse que aquela era uma promessa que a sua adversária não poderia cumprir, os semblantes sorridentes que apareceram nas fotografias com Marine, no dia seguinte, nas bancas, eram bastante mais agressivos.
Mostrando as imagens de um e de outra com os trabalhadores, o jornal Libération escrevia “La guerre est déclarée” (a guerra está declarada), o Courrier Picard titulava “Choque frontal”, enquanto o 20 minutes preferia “Coup de show”. O mote estava dado, para os últimos 12 (hoje, dia 27, já são 11) dias da campanha. Marine Le Pen há de aproveitar toda a sua experiência, todo o seu populismo, as armas que foi recolhendo ao longo da sua já longa carreira política no Front Nacional (partido fundado pelo seu pai, Jean Marie Le Pen), para abater o seu rival, sem filiação partidária nem carreira política (além de uma passagem, como ministro da Economia, pelo governo de Manuel Valls, entre 2014 e 2016).
Campanha de ideias ou por imagens?
Tudo parece ter começado mal, para Macron. À saída da sede de campanha, na noite eleitoral, foi jantar com a sua equipa ao restaurante La Rotonde, em Paris. Não foi ao melhor nem ao mais caro restaurante da cidade, mas deu azo a muitos comentários – desde aqueles que questionavam o que teria Macron a festejar, tendo em conta que ainda haveria segunda volta, àqueles que perguntavam o preço que terá pago com os festejos (a sua equipa garantiu que o menu foi simples e os preços em nada comparáveis ao do Fouquet, onde Sarkozy comemorou a vitória de 2007).
Seguiram-se as primeiras páginas dos jornais e o “descubra as diferenças” entre a passagem de cada candidato pela fábrica de Amiens. Na campanha, poderá surgir o debate de ideias. Para já, fica apenas a guerra das imagens. Por isso, o jornal Nouvel Obs, consultando vários especialistas, foi comparar os cartazes com que cada candidato se apresenta aos franceses, na segunda volta.
Ambos escolheram, como base cromática, o azul. É, entre as cores da bandeira tricolor, aquela com que os franceses gritam pela equipa de futebol nacional – “Allez les bleus!”
Mas no cartaz de Emmanuel Macron, não há nada mais do que o azul, enquanto Marine Le Pen, apoiada a uma mesa, tem como fundo uma biblioteca. François Jost, professsor de ciências da informação e da comunicação na Sorbonne, não vê nesta imagem a biblioteca com que François Miterrand se fez retratar oficialmente. Para o professor, consultado pelo Nouvel Obs, Marine quererá antes remeter para um ambiente mais intimista e para a uma “âncora intelectual a que nunca tinha feito referência”.
Macron tem uma imagem mais limpa, despojada, direta, sem riscos. Apenas ele e o seu eleitorado, sem ruído, numa fotografia que poderia muito bem estar no seu documento de identificação. Marine adota exatamente a estratégia inversa. De saia curta e preta, mostra-se mais feminina (e sedutora, destaca a especialista em Semiologia Élodie Mielczareck) do que é costume. “Esta posição tinha um objetivo muito preciso: ‘mostrar a coxa de Marine foi discutido. É um parti pris assumido e uma mensagem subliminal em relação ao Islão'”, refere o Nouvel Obs, citando o jornalista do L’Express, Alex Sulzer.
Está, de facto, encostada a uma mesa, de ombros relaxados (um mais descaído do que o outro), mais descontraída, mais “humanizada”, intimista, menos crispada, menos combativa do que em palco ou na televisão. Não têm faltado vozes críticas ao uso abusivo do Photoshop na sua cara que, para Jost, pretende adoçar a sua expressão.
Macron usa o slogan “Ensemble, La France!” – cuja tradução se aproximaria mais de “estamos juntos, franceses!” do que a tradução literal “Juntos, França!” E põe o seu nome em destaque, como que para reforçar a sua notoriedade. Marine lança-se com um “Escolher a França” e, ao contrário do seu adversário, remete o seu nome para o fundo da página, retirando o apelido Le Pen da imagem. Parece querer afastar-se da conotação que este lhe traz, mostrando-se mais abrangente entre o eleitorado.
A guerra está na rua. A vitória dependerá do voto dos franceses, a 7 de maio.