A deslocalização de três secretarias de Estado para o interior do País, decidida pelo Governo de António Costa, não terá efeito prático na valorização daquelas regiões, defende Marques Mendes, para quem a medida é mesmo uma “brincadeira.” “É engraçado, é António Costa a fazer uma ‘santanice’,” considerou esta terça-feira o advogado e comentador televisivo durante o VII Encontro Fora da Caixa, no Algarve. A tirada é uma alusão à medida tomada por Pedro Santana Lopes em 2004, quando transferiu para o Algarve a secretaria de Estado do Turismo.
Quinze anos depois da transferência no Turismo, o governo socialista vai levar para Guarda, Castelo Branco e Bragança as sedes das secretarias de Estado, da Ação Social e da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território e da Valorização do Interior, esta última já deslocalizada na última legislatura. “Não existe e não cria emprego. É uma brincadeira, é pura demagogia” rematou o antigo ministro social-democrata durante a entrevista a Mafalda Anjos, diretora da VISÃO.
Marques Mendes, que falava no encontro organizado pela Caixa Geral de Depósitos e do qual a VISÃO é parceiro de media, analisou ainda a situação política da atual legislatura, que acredita que continuará a ser marcada, do lado do Executivo, por uma política de contas certas, ausência de défices, redução da dívida, carga fiscal que vai continuar muito elevada e alguma melhoria no investimento público.
Se se espera uma vida mais difícil no plano social – com mais reivindicações das corporações e dos sindicatos, nomeadamente os que estão ligados ao PCP, que “precisa de compensar na rua o que perde nas urnas”, – acredita que o Governo durará os quatro anos, mais que não seja pelo preço politico que pode custar derrubar o Executivo nas atuais condições económicas. “Se as previsões se confirmarem, ninguém derruba um governo com crescimento de 1,7%, acima da média europeia. Seria preciso juntar todas as forças de esquerda e direita e isso é praticamente impossível,” defendeu, recordando que a última vez que isso aconteceu, no chumbo do PEC IV de José Sócrates, custou a cabeça de alguns líderes partidários.
Costa pisca olho às empresas no Orçamento
O primeiro teste de fogo, a passagem do Orçamento do Estado para 2020, deverá ser tranquilo, na ótica do comentador, bastando a abstenção dos partidos à esquerda e possivelmente, no futuro, o PSD, se Rui Rio se mantiver na liderança. No próximo OE, Costa terá no bolso um trunfo que Marques Mendes revelou na sua conversa durante o Encontro Fora da Caixa que o documento orçamental terá vários benefícios fiscais dirigidos às empresas, fruto de um acordo de Concertação Social no âmbito da política de rendimentos e competitividade das empresas.
“Vai ser um bom número. Tem a ver com a habilidade política de António Costa,” resumiu Marques Mendes. “E vai ter também um bom número na presidência do Conselho da União Europeia” em 2021, ano que espera de maiores dificuldades para o Executivo, seja por causa das eleições autárquicas (que poderão não ser favoráveis ao partido no poder), seja porque a presidência da União Europeia distrairá o foco dos governantes do contexto nacional.
Onde não se deverão esperar novidades nesta legislatura é nas reformas estruturais, uma matéria que diz que não está na “massa do sangue” do primeiro-ministro. “Não é um reformista. Se alguém pensar que nos próximos quatro anos vai haver reformas de fundo em matéria de Estado, Segurança Social ou Justiça, o melhor é esperar sentadinho. Não aconteceu nos últimos quatro anos, quando havia boas condições, e não vai acontecer agora,” confiou.
No imediato, Marques Mendes elege como áreas prioritárias de atenção a saúde e o Serviço Nacional de Saúde e o sistema fiscal, que necessita de “uma mexida fiscal muito significativa” para pôr o País a crescer mais. “Mas para isso,” argumentou, “era preciso fazer reformas. Para baixar impostos sem ter um buraco era preciso diminuir despesas no estado. E isso ninguém quer fazer,” concluiu.
O Encontro Fora da Caixa foi aberto oficialmente por Paulo Macedo, presidente da Caixa Geral de Depósitos.