– O discurso inicial de Ricardo Salgado
O antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES), Ricardo Salgado, considerou hoje no parlamento que o colapso do banco se deveu às exigências excessivas do Banco de Portugal (BdP) em termos de constituição de provisões, num curto espaço de tempo.
“Salvo erro no dia 23 de julho [de 2014], o BdP enviou uma carta ao Dr. Joaquim Goes dizendo que quer que o banco constitua uma provisão no mínimo de dois mil milhões de euros. Foi um exagero. Foi imposta e isso está registado em ata”, afirmou Salgado.
O antigo banqueiro tinha sido questionado acerca das razões que estavam na base das elevadas imparidades do BES, tendo realçado que, durante o seu mandato, sempre foram constituídas as imparidades à medida que iam surgindo.
Salientando que saiu da liderança do BES no dia 13 de julho, e realçando a oposição do Crédit Agricole, um dos acionistas de referência do banco, às exigências do BdP, Salgado disse aguarda as conclusões da auditoria forense.
“Nunca violámos esse aspeto. Sempre que era preciso reforçar os capitais fizemo-lo”, sublinhou, apontando para os dez aumentos de capital para assegurar o rácio ‘core tier 1’ feitos durante a sua gestão.
“Não consideramos ter violado as disposições do BdP. Tivemos sempre, pelo menos, até à minha permanência no banco, os rácios adequados”, afirmou o responsável.
E realçou: “Fizemos um aumento de capital de mil milhões de euros, quando o BdP em março tinha pedido 700 milhões de euros e a venda da BES Vida”.
A operação foi “amplamente acima do que o BdP exigia” e, nessa altura, a gestão colocou “o nível de capitalização do banco dentro dos patamares exigidos por Basileia III”, frisou, considerando que “o banco ia resistir aos testes de ‘stress'”. Daí, Salgado concluiu que “o grupo entrou em colapso por não haver tempo”. E assegurou: “Não houve fugas de dinheiro do banco para quem quer que fosse. Posso assegurar-lhe isso e espero que as auditorias intensas feitas possam provar isso”.
Salgado apontou para o plano de recapitalização a médio prazo que estava a preparar para o BES e o Grupo Espírito Santo (GES) e considerou que o mesmo só não foi aplicado devido à pressão exercida pelo supervisor bancário. “A única coisa que pedimos ao BdP foi tempo e tempo foi algo que não nos foi dado”, disse.
“Ninguém se apropriou de um tostão”
O líder histórico do Banco Espírito Santo (BES), Ricardo Salgado, garantiu hoje que nem os administradores, nem a família, nem os quadros diretivos se apropriaram de dinheiro da instituição, ao contrário das suspeitas que têm sido levantadas.
Questionado sobre o alegado esquema de compra de obrigações através da Eurofin, e do ‘desaparecimento’ de mais de 700 milhões de euros de mais-valias realizadas com o mesmo, já na última fase da antiga equipa de gestão do BES, Salgado afastou qualquer tipo de atos ilegais de gestão
“Os ganhos que o intermediário fez foram reinvestidos em dívida do grupo que estava nas mãos de clientes que não estavam protegidos pela provisão dos 700 milhões de euros. Eram clientes na sua maioria do exterior e o objetivo foi retirar-lhes esse risco”, afirmou Salgado.
“Nunca dei instruções a ninguém para ocultar passivos”
“Nunca dei instruções a ninguém para ocultar passivos do grupo”, disse, reforçando que não deu essas instruções a Francisco Machado da Cruz, contabilista responsável pelos números da ESI.
“Machado da Cruz assumiu totalmente a responsabilidade dos seus actos”, prosseguiu Salgado, que fala desde as 09:10 na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do GES.
O buraco na ESI foi somente conhecido em novembro de 2013, declarou o antigo banqueiro, frisando que em análises ao passado se verificou então as incongruências nas contas vinham desde 2008.
“As contas foram assinadas e assumimos todos a responsabilidade. Não dei instruções para ocultação do passivo e só passámos a conhecer a situação em novembro de 2013 e, numa análise para trás, vimos que essa situação vinha desde 2008”, sublinhou.
Frisando que Machado da Cruz prestou “bons serviços” ao longo de mais de vinte anos, e assumindo que não vê o contabilista “há largos meses”, Salgado lembrou que o responsável “assumiu totalmente a responsabilidade dos seus atos” e reiterou que não deu instruções para a ocultação de passivos.
Idoneidade
Ricardo Salgado disse ainda que em 22 anos, e até ao momento da sua saída do banco, nunca foi questionada a sua idoneidade para liderar a instituição.
“Tendo, certamente acertado e falhado muito na minha vida, sempre em consciência me considerei idóneo para servir na sucessão daqueles que fundaram e prestigiaram o GES”, declarou o antigo banqueiro.
Sublinhando ter a “humildade de reconhecer que cabia a outros na supervisão o permanente julgamento” da sua idoneidade, Salgado realçou que “ao longo de 22 anos ninguém com poder para tal (…) a questionou”.
“Eu e a minha família fomos julgados na praça pública”
O antigo presidente executivo do BES Ricardo Salgado disse hoje que “nunca” deu instruções a ninguém para “ocultar” passivos da Espírito Santo International (ESI), sublinhando que se dedicava “a 100%” à área financeira do Grupo Espírito Santo (GES)
O líder histórico do BES, Ricardo Salgado, lamentou esta terça-feira o julgamento público que diz ter sido alvo, a par da sua família, ao longo dos últimos meses, negando a retirada de milhares de milhões de euros do banco para benefício próprio.
“Durante semanas e meses a fio eu e a minha família fomos julgados na praça pública”, afirmou o homem que liderou o Banco Espírito Santo (BES) durante 22 anos, durante a sua intervenção inicial na comissão de inquérito ao caso BES.
Salgado apontou para as notícias que o acusaram de ter sido o responsável por “fugas em escassas semanas de milhares de milhões de euros” que foram utilizados para comprar “vivendas em Miami e castelos na Escócia”.
Ainda assim, o responsável admitiu que poderá ter cometido erros durante o longo período em que liderou o BES. “Em 22 anos de presidente executivo do BES poderei ter tomado decisões que podem nem sempre ser acertadas”, sublinhou.
Salgado iniciou a sua intervenção no parlamento a agradecer a oportunidade que lhe é concedida para falar sobre as causas que levaram à queda do império Espírito Santo, manifestando-se totalmente disponível para regressar, caso seja esse o entendimento da comissão de inquérito.
“Obrigado pela oportunidade que me estão a dar. Tenho total disponibilidade para aqui regressar se entenderem necessário”, lançou. E realçou: “Depois dos factos que aconteceram no início de agosto, nunca tive oportunidade de falar. Apenas num momento, por insistência dos jornalistas, disse que estava a trabalhar para defender a dignidade e a honra da minha família”.
Salgado puxou de um ditado chinês para dar a entender que quer limpar o seu nome, e o da sua família, das acusações que lhes são feitas acerca das responsabilidades na queda do Grupo Espírito Santo (GES).
“O leopardo quando morre deixa a sua pele e um homem quando morre deixa a sua reputação”, ilustrou. “Fiz um trabalho de profunda reflexão durante estes mais de quatro meses em que me encontro nesta situação. Ficará para mais tarde o juízo definitivo sobre a atuação dos poderes políticos e regulatórios”, afirmou, considerando que essa atuação deve ser avaliada pela Assembleia da República. Salgado compareceu no parlamento acompanhado pelo seu advogado pessoal, Francisco Proença de Carvalho.