Pedro Pablo Pichardo conquista a quarta medalha para a Missão Portuguesa nos Jogos Olímpicos Tóquio2020. Torna-se o quinto atleta português da história a ganhar uma medalha de ouro no maior evento desportivo do planeta. Reforça um desempenho muito positivo do atletismo nacional com resultados de grande nível. A sua vitória resulta de uma atuação de elevadíssimo nível, só ao alcance dos predestinados.
No reverso da medalha, o êxito de Pedro Pablo Pichardo trouxe para a praça pública a discussão da atribuição da nacionalidade.
Não vislumbro qualquer pecado mortal no indivíduo que escolhe um país diferente daquele onde nasceu para realizar o seu projeto de vida, partilho a minha solidariedade absoluta com aqueles que não podem “existir” em países com regimes totalitários que coartam a sua liberdade e a dos seus. Mormente por esses motivos em nada me choca a opção pessoal, seja em que área for, de mudar a sua residência ou a sua nacionalidade.
No caso do desporto, compreendo a frustração daqueles que, querendo evoluir, desenvolver todas as suas capacidades e alcançar uma superação pessoal, procurem encontrar um local onde tal seja possível. Acresce que, sendo um admirador confesso da excelência desportiva, um apaixonado pela capacidade humana de ultrapassar os seus limites, tenho a maior consideração por aqueles que não se resignam e entregam o seu melhor para atingir esse desígnio – mesmo que tal os obrigue a sair da sua pátria, da sua família ou da sua área de conforto.
O que já́ não posso concordar, por ser uma deturpação de todos os valores que defendo, é com a institucionalização de um sistema de importação de atletas para potenciar a conquista de medalhas, potenciar o sucesso.
Consentir a atribuição de nacionalidade num processo “via verde” tendo como único objetivo que esse atleta possa faturar medalhas é sinal de subdesenvolvimento, mesmo que tal possa ser legitimado por interpretações extensivas ou lacunas da lei. Não devemos aceitar, descontraidamente, que um indivíduo e a sua família emigrem para trabalhar por necessidades económicas, escapar do próprio país por questões políticas e tenham de aguardar anos para obter a nacionalidade e outros, só́ porque têm desempenhos desportivos de excelência, possam obter em poucos meses essa nacionalidade.
Felizmente, existem, no sistema desportivo nacional e internacional, mecanismos para permitir a atletas, em situações plenamente justificadas e comprovadas, competir sem terem a necessidade de mudarem de nacionalidade.
Este fenómeno não pode ser aceite com leviandade, pois a banalização dos valores ou a sua ausência só́ nos pode levar à barbárie, assim o demonstra a História. Além de ser um sinal de subdesenvolvimento, importar atletas terá́, mais tarde ou mais cedo, um impacto muito negativo no sistema desportivo português: as medalhas devem resultar de um equilíbrio eurítmico entre uma base e uma elite de desportistas que da mesma sobressai, e não numa de uma política de contratações.
Portugal é um país livre e aberto, uma nação que colonizou e que emigrou, pelo que tem de abordar esta questão com rigor, inteligência e humanidade. Por isso as naturalizações por motivos desportivos devem ser muito bem clarificadas. Desde logo para que o Estado não perca o controlo da situação ao ponto dos governos serem surpreendidos, quantas vezes à última hora, por situações de difícil explicação que colocam em causa as próprias políticas públicas.
Ao analisar estas questões tenho sempre presente o princípio que decorre da Carta Olímpica de que o desporto é uma filosofia de vida que deve estar ao serviço do homem e não da sua exploração. Seja ela qual for.