A Santoro, de Isabel dos Santos, impediu ontem a cisão dos ativos angolanos e portugueses no BPI, defendida pelo conselho de administração. Com o voto contra dos 18,6% dos angolanos, a assembleia geral não conseguiu reunir os dois terços necessários à aprovação, apesar de ter reunido o ‘sim’ de 63% dos votos presentes (82,35%). Este resultado deve-se ao facto de ainda estar em vigor a blindagem dos direitos de voto no BPI, que limita a 20% a capacidade de voto do maior acionista, a espanhola CaixaBank. Ficaram, assim, sem votar 24,1 % dos 44,1% detidos pela instituição financeira que integra o grupo La Caixa.
“Foi a primeira vez que a blindagem dos votos impediu a aprovação de uma boa solução para o banco”, frisou o presidente Fernando Ulrich, que agora considera “importante eliminar a limitação dos direitos de voto”. Aliás, esta mesma proposta já foi apresentada para ser discutida em assembleia geral extraordinária, mas ainda não tem data marcada.
Se não houvesse blindagem, “a proposta teria passado com 73,8% dos votos presentes e 26,2% contra”, precisou Artur Santos Silva, chairman do BPI. “Esta solução permitiria, permitirá e permite que um banco que tem grande relevo no mercado angolano continue associado aos interesses do BPI”, num momento em que “há desafios muito importantes e relevantes no sistema financeiro europeu e português.”
Ulrich sublinhou não ter sido dado nenhum argumento por parte de quem chumbou a decisão.
Recomposição acionista mais equilibrada
O BPI está numa das maiores encruzilhadas da sua vida. Por determinação do BCE, tem de arranjar, até 10 de Abril, uma solução que reduza a sua exposição a Angola. A solução que foi consensualizada previa a criação de uma nova holding, que replicaria a participação no atual BPI, e que deteria, por sua vez, o BPI sem ativos africanos, e uma outra SGPS que reuniria mais de 50% do BFA (Angola) e 30% do BCI (Moçambique).
“Era a melhor proposta e os reguladores europeus estavam satisfeitos”, contou Artur Santos Silva. Ulrich acrescentou: “Em meados de dezembro, chegou a existir consenso de que a cisão seria aceite, desde que angolanos conseguissem reequilibrar posição na sociedade que agrupava as participações africanas.” O que significava ainda que os espanhóis do CaixaBank aceitavam reduzir a sua participação, com vista a um real equilíbrio de poder entre os dois maiores acionistas do BPI. “Há semanas atrás, a cisão era aceite, desde que houvesse uma recomposição acionista mais equilibrada.”
CMVM não dispensa OPA
Só que a empresa de Isabel dos Santos pretendia fazer esse reforço no capital “sem que tivesse de lançar uma OPA”, contou Ulrich. Mas a CMVM não concordou com a dispensa dessa OPA. E com OPA, não há cisão, pelo menos no entender da Santoro.
“A situação é complexa”, justificou o presidente do BPI. “Angola está a passar por uma situação complicada devido à queda do petróleo. É normal que as autoridades angolanas também estejam preocupadas, uma vez que isto envolve o principal banco do seu sistema financeiro.
Todo o conselho de administração do BPI tentou mostrar otimismo na viabilização de uma solução consensual até ao prazo limite imposto pelo BCE. “Estamos num grande momento de transição da União Europeia. Até ao ultimo momento, iremos negociar. Tem havido uma atitude construtiva por parte de todos os intervenientes: Santoro, Unitel, CaixaBank, autoridades europeias e angolanas.”
Sem fusão, não há desblindagem.
Mas esse otimismo ficou um pouco ofuscado perante as declarações de Mário Silva, representante da Santoro. No jardim de Serralves, onde se reuniu a assembleia geral, Mário Silva foi taxativo: “Não faz sentido insistir nesta solução, que não respeita os quadros contratuais e legais. Carece de autorização dos diferentes reguladores. E isso não é possível obter.”
Mário Silva deixou o repto á administração do BPI para que “trabalhe outras soluções possíveis”. “O melhor é ajustar a rota e trabalhar em alternativas viáveis”, disse, sem que tivesse sugerido qualquer outra solução.
Quanto à proposta de desblindagem, que a Santoro já chumbou, também não podia ter sido mais claro: “Mantenho posição. Gostava que o BPI pudesse ser parte ativa em soluções que tragam consolidação ao sistema financeiro português.” Na memoria de todos está ainda a proposta de fusão do BPI com o BCP que a Santoro já pôs em cima da mesa. O BCP tem também como grande acionista a empresa estatal angolana Sonangol, na qual Isabel dos Santos está a assumir um papel cada vez mais preponderante. Ou seja, a Santoro só aceitará a desblindagem por troca de uma solução que agrupe as participações africanas no sistema financeiro em Portugal. Sem fusão, não há desblindagem.