Fotógrafo dos jornais Blitz e Independente no final dos anos 80 e em meados dos anos 90, Daniel Blaufuks trazia sempre a máquina fotográfica consigo. Durante a pandemia, decidiu revisitar os negativos dessa época – e assim surgiu o livro Lisboa Clichê, lançado em setembro pela Tinta-da-China (já na segunda edição), memórias escritas a partir de imagens, aquilo que Blaufuks considera “um livro de texto” – porque nele trata as imagens como texto –, e não de fotografia.
Ao ser convidado pela diretora do Museu de Lisboa para expor o projeto, o artista resolveu fazer algo que se distanciasse do que tinha publicado. Ao “livro de texto”, contrapôs uma exposição de fotografia. São 81 imagens, todas do mesmo tamanho, sem quaisquer palavras, arrumadas em grupos, para transmitir a ideia da cidade como uma multiplicidade simultânea de lugares. A senhora do Bairro Alto podia estar à janela vendo passar na rua o poeta Al Berto. Um avião podia passar por cima da ponte sobre o Tejo enquanto o Chiado ardia. Alguém podia beber café enquanto marinheiros corriam pelas ruas… “Quando uma cidade está em movimento, estamos sempre a perder alguma coisa”, diz Blaufuks à VISÃO.
A escolha das fotografias, afetiva e sentimental, teve também em conta um caráter documental: as empregadas das fábricas que já não existem, a rotativa do Diário de Notícias que já não imprime, a tasca que fechou. Num fluxo cinematográfico, as imagens estão sequenciadas numa narrativa subtil. Sem pretensões de construir as memórias da sua geração, Blaufuks procura-se a si próprio neste olhar atual pelo que fotografava, e como fotografava, há 30 anos, a preto e branco. Imagens de um tempo de descoberta da cidade, da fotografia e da própria vida.
Lisboa Clichê > Museu de Lisboa – Palácio Pimenta, Pavilhão Preto > Campo Grande, 245 > até 27 fev, ter-dom 10h-18h > €3