Entramos na sala e somos já demasiados. No rés do chão do Torreão Poente da Praça do Comércio não cabem todas aquelas caras, 26 retratos de filhos, netos, irmãos, pais de pessoas torturadas, assassinadas e desaparecidas durante a Operação Condor, título da exposição de João Pina. Condor foi uma operação concertada de serviços secretos das ditaduras militares latino-americanas destinada a aniquilar os movimentos de esquerda da região nos 70/80. Dali, o espectador decide para onde vai.
Na sala da esquerda, dedicada a julgamentos que vieram a ser feitos, carrascos e vítimas são colocados no mesmo espaço, indiciando uma ideia de confronto mas também de um todo, todos parte de um mesmo povo. Ao centro, como um altar, está a imagem de um enterro. Na sala à direita, três fotografias formam a série Absurdo: um avião velho, um estádio e uma árvore. Mais à frente, está uma das fotografias mais impactantes da exposição, pelo véu de invisibilidade com que cobre toda esta questão. É o canto de uma casa forrado a papel de parede com flores. “Aqui a fotografia funciona com a literatura, a palavra é fundamental”, refere o brasileiro Diógenes Moura, curador da exposição. O texto indica-nos que aquele canto não é o de um lar mas o de uma sala de tortura. O avião era usado para fazer os Voos da Morte, que atiravam pessoas vivas ao rio La Plata e ao oceano Atlântico; o Estádio Nacional do Chile servia de campo de concentração; a árvore está onde funcionou um campo clandestino de detenção e tortura na Bahia Blanca. “Vamos descobrindo e vamo-nos emocionando”, continua Diógenes. “É como se fosse algo a que vamos puxando a pele, tirando-a, suando, sangrando.”
Segue-se um corredor labiríntico, escuro, com fotos de prisões que nos aparecem em flashes. Há também uma instalação de vídeo. “É uma reflexão entre o que aconteceu nesses países e a forma como Portugal lidou com isso”, conta João Pina. A projeção é a da imagem do rio Tejo, do lado de fora do edifício, outrora do Ministério do Exército, situado naquela praça crucial para a Revolução de Abril.
Operação Condor é também um livro (Tinta da China), cuja segunda edição se lança agora. “A narrativa do livro é: tu não sabes onde estás, não há um conjunto separado de fotos. A exposição é o contrário disso”, explica João Pina.
Operação Condor > Torreão Poente > Pç. do Comércio, Lisboa > 21 abr-18 jul, ter-dom 10h-18h > €1, €2, €4