Tal como Claude Chabrol e Jean-Luc Godard, antes de ser um dos mais marcantes realizadores europeus da sua geração, François Truffaut foi crítico de cinema nos Cahiers du Cinema. Assim, a sua cinematografia assenta numa base cinéfila, de reflexão e debate sobre a arte e o ofício. Uma das paixões de Truffaut era o cinema de Alfred Hitchcock. O francês descobriu e desvendou a obra do grande realizador inglês. E se hoje parece óbvio que, apesar de trabalhar sempre dentro do sistema da indústria de Hollywood, Hitchcock é um autor, em 1962 havia muitos que o consideravam apenas um entertainer, recusando à sua obra qualidades artísticas. Truffaut, vindo de um meio independente e experimental, extremamente autoral, de alguma forma legitimou e afirmou veementemente a qualidade artística do cinema de Hitchcock, chamando a atenção, desde logo nos seus artigos, para os pormenores que fazem do inglês um dos maiores realizadores de todos os tempos. Essa profunda admiração levou Truffaut a escrever uma carta a Hitchcock, desafiando-o para uma longa entrevista. Mais do que o simples desvendar de intenções, técnicas e conceitos dos filmes de Hitchcock, tornou-se uma das mais relevantes obras de teoria cinematográfica. São essas conversas que agora são adaptadas ao cinema, não como uma redundante leitura audiovisual do livro mas como um complemento híbrido, em que se fala muito de cinema e cinefilia.
Em 1962, quando Truffaut e Hitchcock se encontraram, o francês tinha apenas 30 anos e o inglês, 63. Depois disso, Hitchcock haveria de realizar ainda sete filmes, até falecer em 1980. Truffaut, que estava ainda no início de carreira, filmaria mais 18 filmes, até morrer em 1984, com apenas 52 anos.
Hitchcock/Truffaut > De Kent Jones > documentário > 80 min