Para quem apenas ouve música – ou, neste caso, até escreve sobre ela – é sempre muito fácil: ou se gosta ou não se gosta. É certo que, dentro destes parâmetros, há diversas variáveis, como o passado, o legado, o respeito e a simples simpatia pelo artista, mas, mesmo assim, tudo se resume ao mesmo: ou nos toca ou não nos toca. Para quem a faz, à música, pelo contrário, é tudo muito mais encruzilhado. Veja-se o caso de Luís Represas, cujo nome, só por si, já é merecedor de uma vénia, por tudo o que fez pela música portuguesa ao longo de 40 anos de carreira (sim, já são tantos), quer com os Trovante quer a solo.
Luís não precisava de fazer muito mais; bastava-lhe ir recuperando o que fez até aqui, tanto no sentido mais literal como no recorrente, e nos sempre celebrados regressos dos Trovante ou no simples multiplicar das mesmas fórmulas (e porque não, se resulta?). Há, no entanto, um momento em que “já não dá para adiar o recomeço”, como o próprio Luís Represas anuncia em Boa Hora, a faixa que abre o disco ao qual dá o nome. Há nela qualquer coisa de Trovante, sim, mas sem saudosismos fáceis, apontando antes para o futuro. A letra é de Jorge Cruz, o líder dos Diabo na Cruz, ele próprio um assumido fã dos Trovante e que acabou por funcionar como desbloqueador para aquilo em que viria a tornar-se este disco. Seria ele a sugerir o nome de Fred Ferreira para produzir grande parte deste trabalho, embora não a totalidade: B Fachada, Ivan Lins, o ex-Trovante Manuel Faria, o filho deste, Francisco Faria, e o próprio Luís Represas participam na produção de alguns temas. Um encontro de amigos, lá está, de agora e de sempre, como acontece em Cinema Estrada, uma “sequela do 125 Azul”, com Jorge Palma e Paulo Gonzo, em Asas de Anjo, com Ivan Lins, na Curva do Horizonte, com Mia Rose, em Se Achas que Sim, com o moçambicano Stewart Sukuma, ou no dueto com Carlos do Carmo em No Colo do Vento. Sim, é o velho Luís Represas de sempre, mas que volta, finalmente, a soar como novo.
Veja o vídeo de Na Curva do Horizonte, com Mia Rose: