Se nos deixarmos embalar pelas conversas em torno dos saberes e sabores desta Praça, instalada nos antigos edifícios da Manutenção Militar, na zona oriental de Lisboa, facilmente nos sentimos a passear num campo de cultivo, numa vinha ou até mesmo no interior de um fumeiro transmontano.
Dos queijos aos azeites, dos enchidos aos vinhos, são eles os verdadeiros protagonistas deste projeto vencedor do concurso lançado pela Start Up Lisboa para a área de serviços do Hub Criativo do Beato. Aos produtos, juntam-se os seus produtores e artesãos de norte a sul do País. “É importante mostrar a cara e as histórias de quem produz”, diz Cláudia Almeida e Silva, responsável pela Praça. Por isso, não é à toa que ao lado de alguns destes pitéus encontremos as suas fotografias e uma breve descrição do seu trabalho.
Focada no produto nacional sustentável, orgânico e tradicional, de pequenos e médios produtores, a Praça começou a dar os primeiros passos em agosto de 2020 com o lançamento da loja online, onde se vende fruta, hortícolas, queijos, enchidos e vinhos, e que vai manter as entregas na Área Metropolitana de Lisboa. Após o pop-up que decorreu em junho e julho deste ano, a Praça abriu definitivamente as suas portas, no passado sábado, 24. E, apesar de o projeto ainda não estar completo, nesta altura já há muito para degustar e comprar. Antes de se sentar à mesa, e para se inspirar, vale a pena espreitar as prateleiras que se encontram espalhadas ao longo desta espécie de armazém.
UM GRANDE MERCADO
Para se perceber a dimensão da Praça (que tem duas entradas, uma pela Travessa do Grilo e outra pela Avenida Infante D. Henrique), há que ir com tempo para ouvir quem sabe, mas também para provar verdadeiras preciosidades gastronómicas. Como o queijo chèvre ribatejano, feito por Adolfo Henriques, em Maçussa, no concelho da Azambuja, que apetece repetir uma e outra vez, bem como o presunto bem curado por Rui e Manuel Jerónimo, dois irmãos que gerem a empresa Feito no Zambujal, em Alcoutim, e que pede por uma fatia de pão e um copo de vinho.
Na ementa, há tábuas mistas (€11,50/3 produtos), sanduíches de presunto (€8), entre outros petiscos. Ao lado do (tentador, diga-se) balcão de queijaria e de charcutaria, recheado de iguarias, fica a zona dedicada ao azeite. “Queremos dar a conhecer a riqueza deste produto de excelente qualidade, mostrar quem o faz e também dar a experimentá-lo em diferentes provas”, explica Cláudia Almeida e Silva.
Subindo as escadas, que dão acesso à mezzanine, encontra-se a garrafeira – por aqui chamam-lhe adega –, com mais de 200 vinhos de pouca intervenção, essencialmente biológicos, naturais e biodinâmicos, que surgem organizados por tipo de solo (granito, calcário e xisto, só para dar alguns exemplos) e não por regiões. Tudo o que se encontra à venda na loja, pode ser comprado para levar para casa ou saboreado numa das mesas perto do balcão e também na esplanada.
No centro do edifício, destaca-se o Fórum, um espaço de programação pensado para receber os produtores convidados em conversas à volta da sustentabilidade, entre outros assuntos relacionados com produção e gastronomia. Será ainda palco de concertos de jazz, todas as quintas, a partir das 19 horas, fica a dica. Já na mercearia improvisada (há de passar para um segundo edifício, mesmo em frente, mas ainda em obras), há mel, sal, chocolates, arroz, chá, entre outros miminhos ideais para oferecer. Por fim, chegamos à zona de petiscos, por agora a ocupar a futura padaria da Praça, mas que já produz diariamente pão, com farinhas de moleiro. À prova, entre outros petiscos, há xérem de abóbora e cogumelos (€11), filetes de polvo (€12), sanduíche de cachaço de porco (€12) e sanduíche de cogumelos com manteiga de couve-flor (€12).
“O nosso propósito é ser uma montra para os bons produtos que se fazem por cá e fazê-los chegar ao consumidor urbano e citadino. Por isso, vamos continuar a procurar quem ainda produz de forma artesanal e sustentável”, afirma Cláudia, sublinhando que o mais preocupante é que alguns destes produtores não têm sucessores e o seu trabalho corre o risco de desaparecer. “Deveriam ser considerados património gastronómico”, defende.
No torreão deste mesmo edifício, onde antes funcionava a escola dos filhos dos militares, abrirá num futuro próximo (ainda sem data prevista) uma academia de cozinha, em parceria com a Escola Superior de Hotelaria de Lisboa, mantendo desta forma a sua missão de ensinar. Passando a esplanada, que tem a grelha como ponto central, espreitamos o edifício em frente, antigo refeitório do pessoal. Será ali que a partir de novembro, espera-se, funcionará o restaurante principal. Já para visitarmos a peixaria, o talho (com raças autóctones e serviço de grelha) e a mercearia, essencialmente com venda a granel, teremos de esperar pela próxima primavera.
Praça > Hub Criativo do Beato > Tv. do Grilo, 1 / Av. Infante D. Henrique, Lisboa > T. 91 242 1223 > qua–qui, dom 17h-23h, sex-sáb 17h-24h
Agenda de outubro
Concertos de jazz Com Luís Lélis Trio, às quintas-feiras
Provas de vinho “6ª Feira Abro eu”, às sextas. Nomes confirmados: Maria Aguiar (21 out, 21h) apresenta o vinho Magnum Piollot, come des tallants, Champagne, França; e João Palma (28 out, 21h) põe à prova o Magnum Burja, Noir 2018, Vipava, Eslovénia.
Prova e conversa Prova de maçãs do produtor Youssef Ferrão Ouazad, da Quinta da Mascote (22 out, às 18h). Para além da prova de seis variedades distintas, o produtor falará sobre a diferença entre elas e o método de produção.
LUGAR AOS PRODUTORES
Algumas iguarias à prova e à venda para levar para casa. Tudo feito de forma artesanal
Granja dos Moinhos É na sua aldeia natal da Maçussa, que Adolfo Henriques produz queijo chèvre. Há mais de 40 anos, quando começou a fazer esta iguaria, teve de comprar cabras originárias da Suíça, que agora andam em pastoreio naquela aldeia do concelho da Azambuja. De pequena produção (cerca de 100 unidades por mês), este queijo (com bolor e envolto em carvão) apresenta um travo macio que vai aumentando de intensidade com o tempo. Além dos queijos, Adolfo Henriques produz vinagre, compotas e pão de trigo-barbela.
Romeu Atualmente é o tetraneto João Menéres que dá continuidade ao trabalho iniciado por Clemente Menéres, em 1874, em Mirandela. O azeite Romeu, produzido a partir de oliveiras próprias de variedades autóctones, em lagar com moinho de granito, tem rótulo biológico e DOP, e é considerado um dos melhores azeites do mundo. Com aroma intenso a erva, flores e azeitona, no palato é denso e fluído.
Feito no Zambujal Há sete anos que os irmãos Rui e Manuel Jerónimo se dedicam à agropecuária, no Zambujal, no concelho de Alcoutim. Além da criação de porco preto, produzem, de forma artesanal, chouriço, barriga, papada e torresmo prensado.