O outono chegou de mansinho e convidativo a saídas. Ao final da tarde são muitos os turistas nesta rua, embora esteja à margem do bulício citadino, com o centro da cidade a poucos metros de distância. Ao entrarmos no número 49 da Rua Firmeza, no Porto, no The Artist Porto Hotel, observamos a azáfama dos alunos da Escola de Hotelaria e Turismo do Porto – onde se insere o hotel -, na preparação do jantar, sem carta, com combinações improváveis e de registo experimental, que iremos provar a seguir. No único hotel e restaurante/escola do Porto, a funcionar desde 2014 na antiga Escola de Artes Decorativas Soares dos Reis, o novo ano letivo está a começar e há algumas novidades. Mas já lá vamos.
Antes, seguimos até ao B’Artist, o bar onde os alunos trocam os cadernos pela bandeja, vestem o avental, e surpreendem-nos com a entrada de barriga de porco com maçã verde e café, seguida de vieira com cremoso de couve flor e pinhão. Ainda nos servem, como aperitivo, o Chilcano, um cocktail de maracujá e manjericão, com uma nota ligeiramente alcoólica.
A campainha toca – literalmente – e seguimos para o restaurante, ou sala de aula para os alunos, onde estes já nos aguardam num espaço que mais parece ser uma galeria de arte, tantos são os quadros expostos nas paredes. Serão cinco os momentos do jantar, com sobremesa incluída, numa viagem outonal, à qual não faltam o fumo, nem a humidade das primeiras chuvas.
Como o restaurante não tem carta, a surpresa continua a ser a chave do sucesso do The Artist que, a partir de agora, passa a chamar-se A Escola by The Artist, uma das novidades deste ano letivo. “É o refinar do conceito, dar-lhe o nome certo, sem o separar do hotel”, diz-nos Isabel Tavares, a diretora de marketing, que acrescenta: “Somos uma escola, e pretendemos que quem nos visita faça parte desta formação.”
À mesa, podemos escolher uma de duas experiências sensoriais (5 pratos €30 ou 7 pratos €40), sem sabermos o que nos vão servir. Apenas nos perguntam se temos alguma intolerância alimentar ou se há algum ingrediente do qual não gostamos. “É um restaurante sem carta, mas damos alguma segurança, para não comer nada que seja alérgico”, diz o chefe Hugo Dias, responsável pelo curso de cozinha, acrescentando que o “menu é feito à medida do cliente”. Depois, fica-se nas mãos do chefe e dos alunos, claro. Hugo Dias conta-nos que o menu é constituído por “experiências”, onde ele “coloca os sabores, mas troca os sentidos”. E é do esboço feito a partir de ideias dos alunos que se compõe o jantar.
A refeição começa com uma ligação de terra e mar, servida num recipiente de bambu, protagonizada por um fumegante salmonete com rabo de boi e romã em calda de wakame e katsuobusbi, acompanhado por um espumante Filipa Pato 3BB. O tempero muito fresco fica no palato, muito depois da ingestão. Do oceano seguimos rumo “à horta” e, enquanto tomamos o gosto ao suave Burmester reserva branco, de 2015, servem-nos o segundo momento. É como se fosse uma composição artística “desenhada” com cogumelos florestais em texturas, beterraba, gema a baixa temperatura, trufa e fumo de funcho. “Este outono sabe muito a floresta, com fumos e vapores, cogumelos e frutos de inverno, como castanhas, dióspiros e figos”, frisa o chefe Hugo Dias. E, com eles, viajamos até às primeiras chuvas, o cheiro de terra molhada e a humidade, acrescente-se. Por momentos, até parece ouvir-se o crepitar da lareira.
Já na cozinha é o calor do fogão e a adrenalina de servir uma sala cheia, que vai ditando o ritmo do jantar. Ao lado do chefe Hugo Dias e do sub-chefe João Miguel Rodrigues, está Ricardo van Parys, 24 anos, aluno da Escola de Hotelaria e Turismo do Porto, que nos confessa ser “muito bom, enquanto estudante, ter uma experiência no mundo do trabalho”. O futuro cozinheiro, que esteve envolvido no planeamento e na preparação do jantar, confessa-nos que “a pressão é muito grande”, para que não haja falhas a registar. Mas não há que recear, a lição foi bem estudada e a aula decorre sem erros.
No terceiro momento da refeição, mantém-se a harmonização, com o vinho Burmester reserva branco, de 2015, a acompanhar o pato com beirão, toranja e avelã, envolvido numa espécie de capa translúcida. A entrada na quarta experiência faz-se na companhia de um vinho Burmester tinto touriga nacional, de 2016, que nos vai levar por sabores de veado com cremoso de cenoura, crocante de tomate e nabo em sabayon de touriga nacional. O prato “obriga” os alunos a regressar à mesa, num toque final para desmontar o crocante e deixar na dúvida os convivas, sobre os sabores escondidos.
É chegado o quinto momento da refeição – é um jantar para demorar, pelo menos três horas –, com um prato alusivo ao outono, inspirado nas pinceladas do nova imagem do restaurante. É com um clássico Porto tawny 20 anos, da Casa Burmester, envelhecido em cascos de carvalho, que nos servem “A Escola”: uma sobremesa em forma de parfait de figo com glace de dióspiro e tela de serra, abóbora, figo, castanha e dióspiro. É a arte feita na cozinha, através de finas camadas sobrepostas, que nos guia pelos gulosos e coloridos sabores de outono. No final, é-nos entregue uma ficha para avaliar o jantar e os alunos – convém recordar que estamos num restaurante/escola, onde a opinião dos clientes é importante. E os alunos, esses, agradecerão as boas (ou as más) notas. Nós, demos quase nota máxima.
A Escola by The Artist > R. da Firmeza, 49, Porto > T. 22 013 2700 > seg-qui 12h30-14h30, 19h30-22h30, sex-sáb 12h30-14h30, 19h30-23h30, dom 12h30-14h30 > €30 a €40 (jantar)