O consumo de álcool e de tabaco são fatores de risco há muito associados ao cancro, e os que surgem na zona da cabeça e do pescoço não são exceções, mas nos últimos 10 a 15 anos tem vindo a consolidar-se entre a comunidade médica a certeza de uma relação direta entre o vírus do papiloma humano (HPV) e o cancro da garganta. A ex-tenista Martina Navratilova, vencedora a solo de 18 torneios do Grand Slam, revelou agora que sofre deste mal (além de cancro da mama, ambos em fase inicial e tratáveis), provocado precisamente pelo vírus HPV, cuja infeção que dele decorre é a doença mais comum no mundo entre as sexualmente transmissíveis. Em 2013, o ator Michael Douglas já tinha trazido o tema para a agenda mediática, ao assumir que o cancro na garganta de que padecia tinha na sua origem a prática de sexo oral.
De facto, é através da atividade sexual, vaginal, anal ou oral, que este vírus se propaga (embora, em casos mais raros, ocorram transmissões de mãe para filho, durante o parto). Na maior parte das vezes, a infeção acaba por ser eliminada pelo próprio sistema imunitário e sem causar sintomas no paciente, mas também pode permanecer indetectável no organismo, durante anos, até provocar um tumor. A prevalência estimada nos Estados Unidos da América andará próxima dos 70% entre os cancros da cavidade oral. Por cá, dados da Liga Portuguesa Contra o Cancro indicam que esta é a causa de 36% dos cancros na zona da cabeça e do pescoço. Em ambos os países, o certo é que os diagnósticos de cancro da garganta associados ao vírus HPV têm vindo a crescer consideravelmente.
Nos EUA, o risco é cinco vezes maior nos homens do que nas mulheres e “parece estar fortemente associado ao número de parceiros sexuais do longo da vida de cada pessoa”, refere, ao The Washington Post, Erich Sturgis, docente universitário na Baylor College of Medicine.
Segundo a página oficial do SNS24, a infeção por HPV “é mais frequente em jovens entre os 15 e os 25 anos de idade”, ou seja, nos primeiros dez anos após o início da atividade sexual, e afeta, em alguma fase da vida, 50 a 80 por cento dos indivíduos, quase sempre sem evolução “para doença sintomática”. Nos grupos de maior risco, a entidade do Ministério da Saúde inclui grávidas, pessoas com o sistema imunitário enfraquecido e com maior número de parceiros sexuais, agravado no caso de prática de sexo sem proteção.
Se, no caso de uma infeção por HPV na região genital (potencialmente causadora de cancro no ânus, na vagina, no pénis ou no colo do útero), podem surgir sinais de alerta, como dor, hemorragias fora do período menstrual ou anomalias no exame de rotina Papanicolau, já uma comichão ou inflamação na garganta podem mais facilmente passar despercebidas ou confundir diagnósticos. É por isso habitual que, nestes casos, a doença só seja detectada numa fase mais adiantada, quando um tumor se começa a manifestar – foi o que aconteceu com Martina Navratilova, que reparou num nódulo no pescoço.
Apesar do aumento do número de casos, sublinhe-se que a evolução para um cancro na garganta continua a ser a exceção e não a regra de uma infeção por HPV na cavidade oral. Importa também acrescentar que estes tumores associados ao vírus do papiloma humano apresentam um prognóstico mais favorável do que os relacionados com o consumo de tabaco e de álcool.
Não havendo tratamento para as várias infeções causadas por HPV, os especialistas recomendam a vacinação como medida de prevenção. Em Portugal, a vacina contra este vírus faz parte do Programa Nacional de Vacinação e deve ser administrada antes do início da atividade sexual.