Os números revelam a dimensão do problema: 300 milhões de pessoas de todas as idades sofrem de depressão. A psicoterapia é a principal arma, mas há mais formas de combater a doença. Sofia Figueiredo, psicóloga clínica e psicoterapeuta no Hospital CUF Sintra, e Maria Veludo Chai, psiquiatra no Hospital CUF Tejo, explicam os sinais de alerta e como se pode tratar a depressão
Sinais de alerta
Sentimentos persistentes de tristeza, inutilidade, desesperança, impotência, pessimismo ou culpa são indicadores do problema
Sentimentos persistentes de tristeza, inutilidade, desesperança, impotência, pessimismo ou culpa, são estes, segundo Sofia Figueiredo, alguns dos sinais. Mas há mais, diz: “energia reduzida, fadiga ou uma sensação de paralisia mental e física, assim como inquietação, irritabilidade e dificuldade de concentração, de tomada de decisões ou problemas de memória”. Além disso, acrescenta, “é muito comum experienciar interrupções no sono (insónia, acordar cedo ou dormir demais) e no comportamento alimentar (alterações do apetite, perda ou ganho de peso)”. Já os sintomas físicos persistentes “podem incluir dores de cabeça, distúrbios digestivos e dores crónicas”. A especialista nota ainda que a depressão é também “acompanhada por ansiedade e ataques de pânico”. Pode surgir “aparentemente do nada”, explica, ou “vir na sequência de uma derrota, perda pessoal ou qualquer outra adversidade da realidade”. Hoje em dia, de acordo com Sofia Figueiredo, há “evidências crescentes de que a depressão pode, na verdade, ser uma estratégia de defesa necessária do corpo, um tipo de paralisação ou de imobilização em resposta a um sentimento de perigo ou de ameaça”.
Medicamentos e psicoterapia
O tratamento da depressão pode ser medicamentoso ou através da psicoterapia, adianta a psicóloga clínica Sofia Figueiredo. “Um pode excluir o outro, ou ambos podem coexistir”, refere, dizendo que, de acordo com a sua experiência clínica, “um paciente que está medicado psiquiatricamente nunca, ou raramente, deixa de ter indicação para psicoterapia”. Até porque, nota, “é transversal nos estudos sobre a depressão que a psicoterapia é altamente eficaz não só no tratamento como na prevenção de recaídas”. Já a “terapia medicamentosa costuma ser útil no alívio de sintomas, como a ansiedade severa, o que, por vezes, é necessário para que as pessoas possam tomar a decisão de iniciar um processo psicoterapêutico capaz de dar um sentido e um significado ao seu sofrimento e experiências emocionais”, esclarece ainda.
O papel da psicoterapia é, explica a psicóloga, “procurar uma compreensão daquilo que desencadeia o abatimento e a sensação de paralisia do pensamento e da ação”. Ou seja: não se trata só “de ajudar a desenvolver ferramentas adequadas para encontrar uma saída mas também de criar novos recursos internos”.
Um dos objetivos da psicoterapia é “restaurar um sentimento de controlo, de capacidade de pensar sobre aquilo que está a acontecer consigo mesmo, algo que nenhum medicamento pode proporcionar”, indica Sofia Figueiredo, acrescentando: “O objetivo da psicoterapia é construir os pilares da saúde mental.” No entanto, a psicóloga admite que a eficácia terapêutica está profundamente ligada à qualidade da relação entre paciente e terapeuta – a chamada “aliança terapêutica”. O vínculo que se estabelece entre o paciente e o terapeuta talvez seja o mais importante instrumento de apoio e de reparação.
A psicoterapia é altamente eficaz não só no tratamento como na prevenção de recaídas
Sofia Figueiredo
Psicóloga clínica e psicoterapeuta no Hospital CUF Sintra
No que se refere às terapêuticas farmacológicas, a psiquiatra Maria Veludo Chai garante que estas “têm evoluído com o aparecimento de fármacos de segunda e terceira gerações”. Há novas formas de administração e apresentação, desde comprimidos, gotas, comprimidos orodispersíveis até mais recentemente “um spray nasal e injetáveis que podem ser administrados mensalmente ou a cada três meses”.
Eletroconvulsoterapia
A eletroconvulsoterapia (ECT), ou seja terapia por choques elétricos, é uma das opções de tratamento, “com as vantagens de apresentar rápido início de ação, eficácia e a ausência de contraindicações absolutas”, confirma Maria Veludo Chai, explicando que consiste “na indução de uma convulsão controlada através de um estímulo elétrico adequado, sob uma anestesia de curta duração, não provocando dor ao doente”. Está indicado para várias perturbações, refere, como a depressão grave. “De todas as técnicas usadas em psiquiatria, a ECT é a mais utilizada e robusta, em termos de resultados”, indica, esclarecendo que “é efetuada em meio hospitalar, com um psiquiatra, um anestesista e a restante equipa multidisciplinar e com a monitorização do doente”. Já a duração do tratamento varia, podendo ser efetuado duas ou três vezes por semana, inicialmente, e depois, na fase de manutenção, mais espaçadamente.
Estimulação cerebral
“A estimulação magnética transcraniana repetitiva (rTMS) é um tratamento não invasivo que, através de um campo magnético sob corrente elétrica aplicado no couro cabeludo por microssegundos, causa uma despolarização neuronal na área cortical e subcortical”, diz a psiquiatra da CUF Tejo, acrescentando que este tratamento “implica a regularidade de várias sessões semanais de cerca de 40 minutos, cinco vezes por semana”. E os efeitos verificados são animadores, pois tem-se verificado bons resultados na depressão, adianta.
Segundo a médica, há ainda “outras duas técnicas”, mas, quer “pela natureza invasiva quer pelos resultados, são menos usadas e apenas indicadas em casos graves. Uma é a estimulação do nervo vago (VNS) “que está aprovada como tratamento coadjuvante com medicação antidepressiva em doentes que sofram de um episódio depressivo refratário, que não tenha melhorado com a terapêutica instituída”. Esta técnica, conta Maria Veludo Chai, consiste na aplicação de um estímulo elétrico no nervo vago, implicando uma cirurgia para a colocação do cateter e de um dispositivo no organismo. Há ainda outra técnica que se chama “estimulação cerebral profunda” (DBS) “que costuma ser usada na perturbação obsessivo-compulsiva refratária” (sem resposta ao tratamento) e que “induz um estímulo elétrico usando-se elétrodos intracranianos, o que implica uma cirurgia”.