“Se juntarmos a infeção do vírus da Covid-19 com a exposição, a longo prazo, à poluição do ar, temos um efeito adverso na saúde, em particular no que diz respeito ao coração e aos vasos sanguíneos”, avisa Thomas Munzel, biólogo vascular e autor da mais recente análise sobre o tema.
Publicada na Cardiovascular Research e divulgada pela Sociedade Europeia de Cardiologia, a investigação resultou da combinação de dados sobre saúde e doenças com a informação existente sobre exposição a partículas poluentes em suspensão no ar, recolhida pelos satélites e pelas redes terrestres de monitorização da poluição. No entender dos seus autores, a exposição à poluição “agravou as comorbidades que levam a resultados fatais” — daí concluir-se que aquelas mortes “representam um excesso potencialmente evitável”.
Na Ásia, onde se registam dos mais altos níveis de poluição do planeta, foram cerca de 27% as mortes causadas pela Covid-19 que podem ser associadas aos efeitos da má qualidade do ar sobre a saúde. Na Europa, o valor médio é de 19% (oscilando entre os 29 % na República Checa, 26 % na Alemanha, 21% na Bélgica, 19% nos Países Baixos, 18% em França, 15% em Itália, 11% em Portugal e 9% em Espanha) e nos Estados Unidos ronda os 17 por cento.
Partículas poluentes estimulam atividade de proteína que facilita infeção
Segundo Thomas Munzel, especialista do Centro Médico Universitário da Universidade Johannes Gutenberg, em Mainz, na Alemanha, o que acontece é que as partículas poluentes estimulam a atividade da ACE-2, uma proteína existente à superfície das células e que funciona como recetora do SARS CoV-2, facilitando a entrada do vírus no nosso organismo. Jos Levieveld, do prestigiado Instituto Max Planck de Química, e outro dos autores do estudo corrobora: “As partículas poluentes são um fator de agravamento da doença”, disse, citado pela AFP.
Numa altura em que já morreram mais de 1,1 milhões de pessoas por Covid-19 desde o início da pandemia (dados da Universidade Johns Hopkins, nos EUA), os autores insistem que “sem uma mudança fundamental na forma como as cidades se organizam, incluindo uma transição para fontes de energia limpa e renovável”, a poluição continuará a agravar o estado de saúde de um grande número de pessoas – e que isso se prolongará para lá do momento em que os valores da Covid-19 baixarem.
“A pandemia termina com a vacinação da população ou com a imunidade de grupo, alcançada depois de uma boa parte da população ter contatado com o vírus”, rematam os autores. “No entanto, não existem vacinas contra a má qualidade do ar. O único remédio é a mitigação das emissões.”