Nos últimos dias, os testes serológicos passaram a andar de boca em boca como uma resposta para sabermos qual a percentagem da população que estaria imunizada.
Explique-se desde já que os testes não identificam o vírus em si, mas a resposta imunitária que o nosso sistema imunitário instalou contra o vírus. Ou sejam, as pessoas que já foram infetadas e foram consideradas curadas vão ficar com a memória do vírus dentro de si porque o sistema imunitário criou anticorpos para lutar contra a infeção e memorizou essa “batalha”. Além disso, há pessoas que terão sido infetadas e não sabem, os chamados assintomáticos. Assim, com a realização destes estudos serológicos em larga escala seria possível saber a percentagem de pessoas imunizadas. Só que não é bem assim.
“Estes testes só examinam dois tipos de anticorpos. Só é possível saber se a pessoa teve contacto com o vírus e se foi há muito ou pouco tempo, não é mais do que isto.”, explica Manuel Santos Rosa, imunologista e professor catedrático da Faculdade de Medicina de Coimbra. O problema, lembra, é que “não se pode dizer que a pessoa ficou imunizada” ou não, porque ainda não se sabe a quantidade de anticorpos necessários para isso. Assim como também ainda se desconhece se uma pessoa fica imune e porque quanto tempo e se a carga viral que tem “pode ou não infetar outra pessoa”. Por isso, quando o médico ouve dizer que “temos uma baixa taxa de imunização”, dado o número de pessoas infetadas, levanta logo o sobrolho. “Mas qual? O número de pessoas infetadas? Nem seque sabemos se podem ou não ter outra vez a Covid-19”, argumenta.
Luís Graça, investigador principal do Instituto de Medicina Molecular, em Lisboa, alerta para o perigo de alguém ter um “teste serológico positivo” e assumir, desta forma, que já teve a doença, e pode “não ser bem assim”. Ainda é grande o caminho de investigação por explorar à volta do novo coronavírus. O especialista refere que “não será útil fazer este teste à população toda”, sendo melhor estudar primeiro a melhor forma de fazer os testes.
No entanto, há um fator em que podem ser bastante úteis neste momento se fossem feitos nalguns locais. Manuel Santos Rosa dá o exemplo de Ovar, onde ainda não foi levantada o cerco sanitário. Caso fossem feitos testes a estes habitantes, seria possível saber como foi a disseminação do vírus, se lenta ou rápida. “Teríamos mais dados sobre a velocidade de propagação.”
A aplicação dos testes ainda está em estudo pelas autoridades de Saúde. Graça Freitas, diretora-geral de Saúde, explicou há dias, num dos boletins diários, que é preciso ainda decidir que “tipo de testes se vão utilizar”, a metodologia a seguir e “o nível de anticorpos que é protetor”, o que o Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge está a analisar.
“Para o sarampo, nós sabemos. Para a papeira, nós sabemos. Para a rubéola, nós sabemos. Mas eu só posso saber para este novo coronavírus quando houver mais estudos porque ter anticorpos pode não ser suficiente para dizer que estou protegido, tem de haver um número suficientemente elevado de anticorpos para haver proteção,” disse a diretora-geral na mesma conferência de imprensa.