A insustentabilidade das pescas é um problema crescente. Mas, enquanto sobreexploramos os recursos marinhos, ignoramos o potencial dos rios. Está na hora de mudar esse paradigma, diz Rodrigo Castelo. “Comer sustentável é consumir o produto dentro da sua época e ir buscá-lo dentro do nosso ‘habitat’. No caso do peixe do rio, é pescá-lo na temporada certa.”
Na Conversa Verde da VISÃO, o chefe do restaurante Ó Balcão, em Santarém, apela à captura de siluro (também conhecido por peixe-gato-europeu) e do lúcio-perca, duas espécies predadoras “forasteiras”, que dizimam os peixes mais pequenos. “São devolvidas ao rio depois de apanhadas, na pesca lúdica, e isso não devia acontecer, porque acabam por comer as outras espécies que já cá existiam e correm o risco de deixar de existir. Devia haver sempre pesca desses peixes e serem retirados do rio.”
A segunda fase passa por estimular o consumo do peixe de água doce. “Nós, enquanto cozinheiros, devemos desenvolver técnicas para cozinhar o peixe, que é mais salobro, e incentivar ao seu consumo. O que eu tenho feito no Ó Balcão, com a minha equipa, é desenvolver técnicas de cura e de fumagem, e incentivar os pescadores a pescar o maior número possível de peixes, para colocarmos no mercado.
Esse trabalho já tem dado alguns resultados, estimulando a economia local. “Já há bastantes pescadores. O pescador com que trabalho mais tem nove pessoas com ele. É uma pesca já profissional, com redes. Mas não há tantos como gostaríamos. Acredito que dentro de uns anos, se nós, cozinheiros, incentivarmos e começarmos a olhar para o peixe de outra maneira, vai haver mais pescadores.”
Rodrigo Castelo sabe, no entanto, que não é fácil competir convencer as pessoas a comerem peixe de água doce, sustentável, quando há peixe tão bom no nosso mar. “Temos uma costa lindíssima e ótima, e as pessoas pensam: porque é que vou comer peixe de rio quando temos este mar? Eu nasci em Santarém, à beira-rio, e sou apologista de comer aquilo que tenho a meus pés, e isso é o mais sustentável.”
Mas, quando não há alternativa, a escolha está feita. “Dentro do meu restaurante, é por menu de degustação. Se fosse à carta, as pessoas iam para peixe de mar e não de rio. Assim, estão nas minhas mãos e só comem peixe de rio”, brinca. “As pessoas têm a ideia de que o peixe de rio tem muita espinha e só se come em escabeche ou em sopa, mas cabe-nos a nós trabalhar outras técnicas para o trabalhar, como a técnica do sal e da água com gás e do açúcar e da fumagem…”
Isto não significa que se deva abandonar o outro peixe, acrescenta. “Devemos consumir também peixe de mar. Não sou fundamentalista. Mas temos de olhar para o rio e consumir peixe do rio. Porque depois somos obrigados a conservar as margens e o caudal o rio. O rio precisa de nós.”
O chefe é embaixador gastronómico de Santarém, com tem trabalhado em parceria para incentivar ao consumo de peixe de rio. “O trabalho com o rio começou este ano”, explica, “e há o compromisso de tornar o rio melhor, com uma grande preocupação na sustentabilidade do rio e nas suas espécies, e na investigação.”
Há ainda quem tenha dúvidas sobre a qualidade das águas, mas Rodrigo Castelo assegura que há muito que isso não é um problema. “A água do rio não está poluída em Santarém há muitos anos. O robalo aparece aqui, da maré que vem do mar, à procura de alimento; se a água estivesse poluída, o peixe não vinha aqui. Agora é preciso tornar o rio mais navegável, desassorerá-lo.”
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