Por um lado, os recursos marinhos estão a ser sobre-explorados. Por outro, a alternativa – a aquacultura – é um mundo sujo, feito de antibióticos, hormonas e peixe sensaborão, alimentado a farinha ou, pior, alimentado a peixe capturado em alto-mar. Ou seja, é tão ou mais insustentável do que a pesca convencional.
Nada disso, garante Elisabete Matos, coordenadora técnico-cientifica do Laboratório Colaborativo para a Bioeconomia Azul (CoLAB B2E), na entrevista semanal da VISÃO VERDE. “A produção é sustentável dentro da União Europeia, onde temos regras muito apertadas”, diz a especialista. “Temos consciência de que, se não formos sustentáveis, não temos futuro.”
Fora do espaço comunitário, talvez não seja bem assim, acrescenta, o que levanta questões de sustentabilidade, mas também de concorrência desleal. “Quem importa para a UE tem de cumprir a legislação europeia, mas isso nem sempre é fácil de assegurar. Um produtor na Turquia terá outro tipo de vantagens. É por isso que o nosso produto é mais caro. Também não vamos ao supermercado comprar uma garrafa de vinho por um euro a esperar que tenha a mesma qualidade que um vinho de 15 ou 20 euros.”
Não é só uma questão de cumprir com a legislação. “Os produtores têm cada vez mais consciência da sustentabilidade ecológica. A pressão vai partir do consumidor e das cadeias de produção: a indústria tem melhorado a pedido dos seus clientes.”
O mito das hormonas de crescimento
Talvez a maior questão relacionada com a sustentabilidade da aquacultura seja a fonte de alimento, que em grande parte se baseia em peixe capturado no mar. Mas isso está a mudar, diz Elisabete Matos. “A tendência é procurar alimentos cada vez mais sustentáveis, de economia circular, que não estejam em competição com a alimentação humana. É esse o caminho que a indústria está a fazer com sucesso. Conseguimos baixar cada vez mais a fonte de pescas e encontrar alternativas. Por exemplo, subprodutos da indústria conserveira, com partes que não são aproveitadas para consumo humano, são transformados em ingredientes para aquacultura. Isso permite reduzir o impacto nas pescas.”
Há um preconceito contra a aquacultura que faz a responsável do CoLAB B2E sorrir: que os peixes são alimentados com “farinha”. “Não é farinha, pelo menos não no sentido que as pessoas julgam. A receita [da ração] tem de garantir que todas as necessidades de nutirção estão cobertas. É como fazer um bolo: um bocadinho de milho, um bocadinho de trigo, um bocadinho de farinha de peixe, até termos o perfil ideal de proteína que a espécie precisa. E depois aidcionamos a gordura, que tem de ter ácidos gordos essenciasi, como ómega-3, vitaminas, minerais. E a mistura é cozinhada, como fazemos os cereais do pequeno-almoço.”
A alimentação é estudada para ter todos os ingredientes de que o peixe precisa. E não o torna diferente do peixe de mar. “O tipo de proteínas com que alimentamos o peixe não tem impacto no sabor. No caso da truta, acontece até ter um teor de gordura superior à selvagem, pelo que os portugueses preferem esse peixe. Em termos de saúde, também é mais vantajoso: tem mais benefícios para a saúde. Quando sujeito a uma prova cega, um português tanto escolhe uma dourada de mar como de aquacultura como sendo a sua preferida.”
E quanto às acusações de que os peixes vivem em más condições, e apertados? Outro mito, assegura Elisabete Matos. “Quanto melhor o nivel de bem-estar estiver uma exploração, mais rentável e maior rendimento tem. Portanto, os produtores têm todo o incentivo para potenciar o bem-estar animal. Se eu exceder a capacidade da jaula, aumento a capacidade haver doenças, problemas de pele por abrasão, perdas de escamas… Às vezes, vemos que os peixes estão todos juntos, mas esquecemo-nos que esses peixes, no meio natural, nadam em cardume.”
E para o fim, mas seguramente não menos importante: não há hormonas de crescimento nem uso profilático de antibióticos: as primeiras foram banidas em 1981 e os segundos, enquanto medicamento preventivo, em 2006.
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