Já pensou como seria Portugal sem as suas praias? Os areais são parte essencial da nossa identidade cultural e um recurso natural valioso. No entanto, a ocupação massiva do litoral e a artificialização das praias têm dificultado a sua adaptação natural às mudanças ambientais.
Em termos de areal, as praias não são mais do que acumulações de sedimentos de diferentes origens. Em Portugal, os rios são um os seus principais fornecedores. Além de serem espaços de lazer e turismo, as praias protegem o litoral da ação das ondas, funcionando como uma barreira natural ao avanço do mar e contribuindo para a nossa segurança.
A erosão costeira tem-se intensificado devido à subida mais acelerada do nível do mar, à redução do aporte sedimentar pelos rios devido à construção de barragens, à retenção de areia por obras de engenharia costeira como molhes portuários e esporões nas praias, e exploração de sedimentos costeiros para diversos fins.
Para combater a falta de areia nas praias, uma prática comum em todo o mundo é a alimentação artificial. Esta técnica foi utilizada pela primeira vez nos EUA na década de 1920 e consiste em dragar sedimentos de locais onde tendem a acumular, como estuários, deltas e lagoas costeiras, para restabelecer praias em erosão. Em Portugal, a primeira alimentação artificial ocorreu em 1950, no Estoril.
A alimentação artificial pode ser feita de duas formas: diretamente na praia para aumentar o volume do areal (como na Costa da Caparica, em Almada) ou um pouco mais ao largo para criar bancos submersos que diminuem a energia das ondas (como na Costa Nova, em Aveiro). A qualidade do sedimento, a sua granulometria e os fatores económicos são os principais critérios de decisão.
Por outro lado, quando se dragam canais de navegação para manter o acesso a portos ou para melhorar a qualidade da água de lagoas, é frequente verificar que os sedimentos são muito mais finos, possuem muito mais conchas e são mais escuros do que os das praias. Quando estes sedimentos são depositados nas praias, algumas pessoas reagem mal ao verem o areal ficar escuro e a água ganhar uma cor nada fotogénica. Importa clarificar que esses efeitos são temporários e não têm quaisquer impactes significativos no meio ambiente ou na saúde humana. Em poucos dias, o sol e as correntes farão com que a – agora muito maior – praia recupere as suas cores.
Outro argumento habitual de quem se opõe às alimentações artificiais baseia-se na constatação de que, ao fim de uns anos ou ao fim de um temporal mais severo, o areal volta a desaparecer. Convém perguntar: o que teria acontecido a essa praia, aos paredões, aos passeios marítimos e às casas junto ao mar se o reforço extra de sedimento não tivesse sido feito? Ou seja, quando um grande temporal “apenas” leva toda a areia de uma praia, significa que a alimentação artificial teve sucesso. Sem ela, os danos poderiam ser muito mais graves, incluindo a destruição de infraestruturas e perda de vidas humanas.
A alimentação artificial é, portanto, uma medida baseada na natureza com impacte ambiental baixo e reversível, mas que requer repetição regular. Os seus efeitos colaterais são residuais se comparados com os das obras de engenharia pesada, como esporões e quebra-mares.
É, portanto, crucial assegurar que os recursos sedimentares, fluviais e costeiros, sejam geridos de forma integrada. Se até ao final da década de 90, os sedimentos comercializados, hoje, os dragados dos portos são utilizados, de forma muito mais sustentável, para alimentar praias, com 90% das alimentações artificiais a utilizarem estas fontes sedimentares.
A ciência apontou o caminho. Depois de alguns erros no passado, a governação já tomou o rumo certo. Por exemplo, em julho de 2024, assinou-se mais um protocolo para a realização de uma nova alimentação artificial na Costa da Caparica com cerca de 1 M m3. A alimentação artificial de praias é, de longe, a mais eficiente e mais sustentável forma de fazer face à erosão costeira. Apoiá-la é encorajar os nossos políticos a não voltar atrás.