A julgar por um estudo recentemente publicado na revista científica Nature Climate Change, metade das praias do planeta poderão desaparecer até ao final deste século. A acontecer, será o resultado de menos areia fornecida pelos rios devido às barragens, mais e maiores temporais e subida do nível do mar mais rápida, agravada pela atual crise climática.
É um fenómeno global que afeta a maioria dos países costeiros. Contudo, o estudo referido gerou uma grande controvérsia na comunidade científica. Surgiram de imediato inúmeras opiniões divergentes sobre o que acontecerá às praias.
Não tardou a que a mesma revista publicasse um novo estudo, no qual um outro conjunto de cientistas contesta a teoria da extinção das praias. Na sua opinião, algumas praias poderão sobreviver à subida acelerada do nível do mar. Esta visão contrastante baseia-se na teoria de que algumas praias tendem a migrar para terra à medida que o nível do mar sobe, e por isso, no lugar de uma extinção, ocorre antes uma relocalização.
Só que nem sempre existe esse terreno livre, ou fonte de sedimentos, que garantem a possibilidade de relocalização das praias. Nuns casos, temos as falésias rochosas, noutros fomos nós mesmos que construímos passeios marítimos, paredões, molhes de portos, edifícios, ou até povoações inteiras. São estes os obstáculos à relocalização natural das praias.
Não podendo migrar para o interior, as praias são comprimidas pelo mar. É o que os cientistas chamam de coastal squeeze. O resultado desta compressão, poderá, de facto, levar à extinção dos areais.
Nos casos em que as alterações climáticas e a conversão dos nossos rios em ‘cascatas de barragens’, resultarem no coastal squeeze das praias, uma das soluções mais adequadas passa pelo uso de intervenções baseadas na natureza. Esta abordagem contraria a visão de proteção costeira pesada, com molhes, quebra-mares ou enrocamentos, e propõe soluções sustentáveis com benefícios ambientais, sociais e económicos.
Um exemplo deste tipo de intervenção é a alimentação artificial, em que utilizamos sedimentos em excesso nos estuários e no fundo do mar para devolver à praia a areia erodida. É o que tem sido adotado com sucesso pela Agência Portuguesa do Ambiente em locais onde a erosão costeira é deveras preocupante, como a sul de Aveiro, na Costa da Caparica ou a leste de Quarteira.
Existem outras medidas sustentáveis que podem ser adotadas para minimizar os impactos negativos da erosão costeira. Em Portugal, os Programas da Orla Costeira (POC), apontam o caminho a seguir, definindo faixas de salvaguarda e proteção à ocupação e utilização do litoral. É uma das ferramentas legais que o País tem para ajudar os municípios a tornar as nossas zonas costeiras mais resilientes, designadamente limpando o caminho dos tais obstáculos à relocalização natural das praias.
Contudo, num país onde a orla costeira serve de residência a cerca de metade da população e alberga a maior fatia da atividade turística, repensar a ocupação do litoral é uma tarefa complexa e que requer uma profunda ponderação social, económica e cultural.
Por vezes não nos apercebemos disso, mas as praias são um recurso natural valioso, não apenas do ponto de vista ambiental, mas também ao nível económico, cultural e emocional. Talvez passe despercebido o facto de que o litoral é um dos ambientes mais dinâmicos do planeta quando a sua evolução, natural ou como consequência de ações humanas, é constante.
Ao preservarmos as nossas praias, desafiamos a nossa relação com um território que a maioria ambiciona, exigindo uma reavaliação fundamental das nossas escolhas como sociedade. Gerir algo tão dinâmico e sem fronteiras administrativas é mais do que uma questão ambiental; é um compromisso com a nossa identidade, estilo de vida e herança para as gerações vindouras.