Nos últimos dias, a corrida ao espaço tem estado nas bocas do mundo. Richard Branson, empresário bilionário britânico e fundador da Virgin Galactic, participou numa ida ao espaço a 11 de julho. Já Jeff Bezos, criador da Amazon e o homem mais rico do mundo, realizou a sua primeira viagem ao espaço nove dias depois, na última terça-feira, com a empresa que fundou em 2000, Blue Origin, pouco depois das 14h em Portugal, e viu a Terra por uma janela, a 100 quilómetros de altitude.
“Estamos aqui para tornar o espaço mais acessível a todos”, afirmou Branson em entrevista à Reuters, logo após o voo. O fundador da Amazon teve um discurso semelhante após a aterragem: “Vamos construir uma estrada para o espaço, para que os nossos filhos e os seus filhos possam construir um futuro. Precisamos de fazer isto para resolver os problemas aqui na Terra”, explicou à Reuters.
O objetivo dos empresários, ao longo dos últimos anos, tem sido criar condições para que o número de pessoas a ir ao espaço aumente, com voos espaciais mais baratos e acessíveis. Empresas como a SpaceX, Virgin Galactic e Space Adventures querem tornar o turismo espacial mais comum. Um novo relatório estima que o mercado global de transporte espacial e turismo espacial ultrapassará os dois mil milhões de euros em 2031, crescendo 17,15% a cada ano na próxima década.
Jeff Bezos, também criador do Fundo Bezos Earth, que promove a transição para uma energia limpa e acesso equitativo de ar, água e terra de qualidade, mencionou o tema da poluição e alterações climáticas assim que aterrou. “Temos, realmente, de tirar a indústria pesada e a indústria poluidora da Terra”, afirmou Bezos à CNN.
O impacto ambiental das viagens ao espaço
Um dos problemas que pode estar associado a este avanço tecnológico da indústria espacial privada é, de facto, o impacto ambiental negativo. Quando os foguetões são lançados, exigem uma grande quantidade de propelentes para saírem da atmosfera terrestre, o que emite uma variedade de substâncias para a atmosfera, incluindo dióxido de carbono, vapor de água, cloro, fuligem e outros produtos químicos.
Os foguetões desenvolvidos pela Blue Origin são mais ecológicos do que os da empresa Virgin Galatic, usam propelentes de hidrogénio líquido e oxigénio líquido, enquanto o VSS Unity utilizou um propelente híbrido, composto a partir de um combustível sólido à base de carbono e óxido nitroso. Os foguetões reutilizáveis da SpaceX Falcon irão funcionar a querosene líquido e oxigénio líquido.
As empresas já foram criticadas pelo contraste entre os fundadores, mas a Virgin Galactic assegurou, em declarações à AFP, que “já tomou medidas para compensar as emissões de carbono dos seus voos de teste e está a examinar oportunidades para compensar as emissões de carbono para voos de futuros clientes e reduzir a pegada de carbono” da cadeia de abastecimento”.
No entanto, os produtos emtidos a partir dos foguetões, uma vez que as emissões ocorrem diretamente para a alta atmosfera (estratosfera e mesosfera ), acabam por permanecer lá entre dois a três anos. Mesmo a água injetada na alta atmosfera pode ter impactos no aquecimento global, explicou Eloise Marais, professora associada de geografia física na Universidade College London, ao The Guardian. O cloro, juntamente com outros compostos, pode causar chuvas ácidas, que são, sobretudo, prejudiciais à vida marinha e às plantas.
As temperaturas elevadas durante o lançamento e a reentrada do foguetão também convertem o nitrogénio estável do ar em óxidos de nitrogénio reativos, o que transforma o ozono em oxigénio, destruindo a camada de ozono tão conhecida, que protege a vida na Terra contra a radiação ultravioleta prejudicial. Mais perto do solo, todos os combustíveis emitem grandes quantidades de calor, que podem adicionar ozono à troposfera, retendo o calor na Terra e aumentando as temperaturas.
Em 2020, foram realizadas 114 tentativas de lançamento orbital no mundo, segundo a Nasa, o que equivale a uma média de mais de 100 mil voos diários no setor da aviação comercial. Mesmo que o número de lançamentos não aumente significativamente, os seus efeitos negativos causarão impacto. As emissões de dióxido de carbono emitidas por cerca de quatro turistas num voo espacial serão entre 50 e 100 vezes mais do que uma a três toneladas por passageiro num voo de longa duração.
“Para um lançamento espacial são emitidas 200-300 toneladas de dióxido de carbono, transportando cerca de 4 passageiros”, indicou Eloise Marais.
Quando a SpaceX enviar quatro cidadãos para o espaço num voo privado, em setembro, os cálculos indicam que produzirá o equivalente às emissões de carbono de 395 voos transatlânticos. Estes valores representam mais do que o dobro do valor anual de carbono recomendado para cumprir os objetivos do acordo climático de Paris. Além disso, o motor de um avião precisa de estar ligado durante horas para fazer a mesma distância que um foguetão faz em sete minutos. No entanto, o avião consome muito menos combustível durante todo esse tempo.
No passado, a maior parte do transporte espacial estava focada em missões de abastecimento de carga para a Estação Espacial Internacional e serviços de lançamento, mas atualmente o foco são as explorações planetárias, missões tripuladas e o turismo espacial. Eloise Marais diz que as emissões de carbono dos foguetões são pequenas em comparação com a indústria aeronáutica, mas estão a aumentar cerca de 5,6% por ano.
A professora recomenda cautela à medida que a indústria do turismo espacial cresce, também porque ainda não há regras internacionais sobre os tipos de combustíveis usados e o impacto no meio ambiente. “A hora de agir é agora – enquanto os bilionários ainda estão a comprar os bilhetes”, alerta.