Na costa sul da ilha de Cornwallis, no arquipélago canadiano do Alto Árctico, fica a aldeia esquimó de Resolute. A cinco quilómetros da aldeia fica o aeroporto, onde, num dia no início de Agosto, desembarco de um jacto comercial. São 4 da manhã e, ao contrário do que eu esperava, o Sol não brilha no céu. Pelo contrário, está escuro.
Escuro e frio.
Desconcertado, acabo por aceitar o convite que me foi feito para me recolher no salão do Narwhal Inn, enquanto não aparece uma boleia. Partilho o espaço com alguns soldados que esperam que um quadrimotor Hércules C130 os leve até Alert, uma base canadiana na ponta norte da ilha de Ellesmere e a instalação permanente mais setentrional do mundo. Não me faço rogado ao chá que me oferece o cozinheiro alemão, roliço e careca, que, como uma caricatura de si próprio, não consegue parar de se lastimar da alergia que lhe fez inchar os lábios de maneira grotesca.
Os olhos passeiam-se pelas placas e autocolantes que várias expedições de aventureiros deixaram ficar nas paredes: Tundra Northwest Swedarctic 1999; ItaliAntartide… Resolute é a principal porta de entrada para o Alto Árctico e, ao mesmo tempo, uma plataforma logística vital, a partir da qual irradiam projectos de investigação científica, campanhas de prospecção geológica, operações militares, expedições de aventureiros e, cada vez mais, turistas.
Não aguento mais permanecer dentro de portas, pelo que me aventuro no exterior. O tempo piorou e não se vê vivalma, mas as águas cinzento-chumbo do oceano Árctico insinuam-se para lá de uma extensão de tundra salpicada por pequenas lagoas e é nessa direcção que decido caminhar. Levantou-se um vento glacial fortíssimo, que arranca a água nas charcas à minha frente e a transporta até desaparecer, pulverizada. Se houvesse árvores, seguramente seriam arrancadas pela raiz, mas estamos a uma latitude demasiado elevada para que qualquer árvore aqui possa crescer. Encafuado no anoraque, caminho aos tropeços. O capuz drapeja de modo ensurdecedor. Sou assaltado por uma angústia e incerteza sobre o sucesso dos planos que aqui me trouxeram. “Mas o que raio faço aqui?”
Leia a reportagem na íntegra na VISÃO Vida & Viagens de Novembro.
Já nas bancas.