Henrique Cymerman, correspondente da SIC em Israel, é a figura fundamental por trás da visita do Papa àquele País e aos territórios palestinianos, este fim de semana, entre os dias 24 e 26. E tudo começou com uma pergunta de Francisco, ao português, em junho do ano passado. Agora, como diz o chefe da Igreja Católica, «o Henrique resolve»…

O que posso eu fazer pela paz na Terra Santa?»
A pergunta é do Papa Francisco e o seu interlocutor é um jornalista português, de origem judaica, correspondente da SIC em Israel. O cenário, uma salinha impessoal, mobilada com modéstia. Uns sofás, uma mesinha de trabalho, uma alcatifa. O local, a Residência de Santa Marta, onde vive o Papa, depois de ter dispensado o fausto do Palácio do Vaticano e de optar por uma suite, forrada de livros, com papéis pelo chão, nos quais ninguém nem quem lhe faz a cama e limpa o modesto aposento se atreve a mexer.

A data, junho de 2013. O jornalista acabara de ser conduzido ao Vaticano pelo melhor amigo do Papa, o rabino judeu de Jerusalém, Abraham Skorka. A história remete para o imaginário da banda desenhada: Henrique Cymerman, 55 anos , o repórter de que falamos, bem podia ser a mais conhecida personagem de Hergé, num álbum intitulado «Tintim, aventura no Vaticano». Cymerman gosta da analogia: «Nos meus tempos de estudante, nos maristas do Porto, já me chamavam Tintim. Até tinha um cão parecido com o Milu…» Acabavam de se conhecer. Cymerman foi mesmo pessoalmente guiado pelo Papa ao refeitório de Santa Marta, onde o Sumo Pontífice deu ordens para que lhe servissem almoço, e à equipa de reportagem que o acompanhava.

Mas Henrique Cymerman não teve tempo para a sobremesa: pouco depois, era chamado à salinha de visitas, onde fora recebido.

O Papa queria conversar. E a abordagem foi a matar: «Ouvi dizer que dominas o Médio Oriente…»

‘Henrique resolve’

E a pergunta, senhores? O que pode o Papa fazer pela paz entre israelitas e palestinianos, perguntou ele e perguntamos nós? Tal como nós esperamos uma resposta, também o Papa, olhando nos olhos o jornalista português, a esperou, num pesado silêncio de alguns segundos. Cymerman teve uma inspiração: «Para começar, é ir lá.» Ir lá! Sim, poucos dias depois, Francisco haveria de receber o Presidente de Israel e prémio Nobel da Paz, Shimon Perez. «Sei que ele vai convidar-me a visitar Israel, mas eu precisava de ter, também, um convite do ‘outro lado’.» Leia-se, da Autoridade Palestiniana.

Henrique Cymerman não pestanejou: «Isso arranja-se já. Sua santidade dá-me licença?» E agarrou no telemóvel. Do outro lado, atendia um assessor do Presidente palestiniano, Mahmud Abbas. «Boa tarde, fala o Cymerman! Estou aqui no Vaticano, com o Papa Francisco, e passa-se isto assim, assim…» Foi na hora: «Encantados! O convite vai seguir oportunamente!» Nesse momento, o Papa desabafou com Cymerman: «Vou pensar muito a sério na tua ajuda!» E, se Cymerman fosse o Liedson e o Papa um adepto do Sporting, decerto que Francisco seguraria, a esta hora, um cartaz com uma frase que não se cansa de repetir, nas reuniões preparatórias da viagem, que têm decorrido no Vaticano: «O Henrique resolve!» Poucos dias depois, com efeito, vinha o convite e depois de Perez, a visita do próprio Presidente Abbas ao Vaticano. Henrique Cymerman ficava informalmente nomeado para «organizar» a visita do Papa. Estabelecendo contactos, desbloqueando dificuldades, falando com todos os lados envolvidos o que inclui telefonemas regulares semanais para o Vaticano. «Sou jornalista, mas estou nisto por convicção ideológica. Foi o destino que me colocou aqui. O que eu puder fazer pela paz, faço», justifica-nos Cymerman, durante uma longa conversa telefónica de 1 hora e dez minutos, desde Israel.

Ele tem muito para contar. Afinal, o português é já considerado o melhor amigo dos melhores amigos do Papa: são eles Abraham Skorka e a argentina Alicia Barrios, uma espécie de biógrafa, porta-voz informal e confidente de Jorge Bergoglio. Ou do «padre Jorge», como lhe chama, e como o tratam os argentinos que o visitam. «Falo umas quatro vezes por semana com Alicia, a quem o Papa chama ‘a minha rainha’», conta o jornalista.

No Vaticano, no próprio dia em que conheceu o Papa, e em que a viagem a Israel foi decidida, Cymerman tornou-se logo um improvável conselheiro de Francisco: «Esta visita devia ser a primeira do seu pontificado, decidida por si [a viagem ao Brasil, em julho de 2013, estava agendada desde o consulado de Bento XVI]. Seria simbólico e importante para os dois lados em conflito.»

Papa quer fazer barulho
Nesse mesmo já longínquo dia de junho de 2013, Francisco confessaria ao jornalista português: «O meu maior sonho é abraçar aqui o amigo Skorka junto ao Muro das Lamentações, em Jerusalém!» Ou: «Admiro muito o Shimon Perez e gostaria de lá ir enquanto ele é presidente [o mandato acaba em julho deste ano]. É, dos políticos veteranos em exercício, o mais destacado.» Ora, toda esta proximidade ao lado judaico, a admiração por Perez, as declarações a favor do diálogo entre católicos e judeus, a intimidade com Skorka que se tornou visita assídua do Vaticano e, com Alicia Barrios, faz parte do inner circle do Papa provocou desconfianças e bloqueios, quer junto da linha dura da Santa Sé, quer junto dos palestinianos, a começar pela presidente da Câmara de Belém, Vera Baloum, junto da qual Henrique Cymerman teve de gastar o seu «latim» para que se convencesse a receber o Papa. Aliás, Francisco fará a sua grande missa, precisamente, em Belém, dando assim a mão aos cristãos locais e importância à cidade controlada pela Autoridade Palestiniana.

Isto, apesar da pressão israelita para que a principal cerimónia religiosa decorresse em Jerusalém…
Preocupado com a situação na Palestina e com a emigração forçada de cristãos acossados, Francisco pediu para ver os vídeos de várias reportagens assinadas por Henrique Cymerman. Pediu, também, para visionar a que o correspondente da SIC elaborou, no Vaticano, em 2013, para a estação portuguesa.

Apertado pela Cúria Romana e pelos setores conservadores que continuam a ver os judeus como o «inimigo» principal da Igreja de Roma, Francisco cedeu na duração da viagem apenas três dias, o que já inclui seis horas em Amã, na Jordânia e apenas 28 horas na cidade santa de Jerusalém. Mas o «padre Jorge» já piscou o olho aos amigos, com ar de miúdo prestes a fazer uma traquinice: «Vinte e oito horas em Jerusalém dá para fazer muito barulho», disse ele aos mais íntimos.

Minas & armadilhas
Ainda em 2013, Henrique Cymerman voltou ao Vaticano, acompanhando a visita do primeiro-ministro israelita, Benjamim Netanyahu. No avião, o estadista seguia sob grande tensão, tendo interrogado, toda a viagem, o jornalista português: como era o Papa, quais as suas reais intenções… O embaixador (não residente) da Autoridade Palestiniana para o Vaticano, Issa Kaffiffieh, um cristão, que é conselheiro de Abbas e mora em Ramalah, esteve sempre em contacto com Cymerman e foi, também, decisivo para desbloquear as resistências de alguns setores radicais palestinianos, à visita do Papa. Francisco desloca-se a Israel num momento em que há uma crise profunda no diálogo entre as duas partes, que se encontra num impasse.
Em Roma, as coisas não têm sido mais fáceis. Alicia Barrios, a «rainha» do Papa, anunciou, na Argentina, há meses, que Francisco iria a Israel em maio deste ano, o que motivou um desmentido formal dos serviços da Santa Sé que, assim, se sobrepunham ao Papa. E decorreu outro mês até que os mesmos serviços reconhecessem a vontade e a intenção de Francisco de deslocar-se à Terra Santa. Há poucas semanas, um dos mais influentes jornais de Israel preparava um editorial hostil com o título Papa diz não ao Museu do Holocausto e ao Muro das Lamentações.

Um rumor posto a correr, desconfia-se, por setores críticos do Vaticano, que, assim, procuravam comprometer Francisco. É que o protocolo exige que todos os chefes de Estado que visitam Jerusalém se desloquem a um e a outro local e o Papa é o Chefe de Estado do Vaticano. Sabendo o que o jornal Yediot Ahronot se preparava para escrever, Henrique Cymerman telefonou ao seu amigo Skorka que, do outro lado da linha, pegava num segundo telemóvel e ligava diretamente para o Papa. Francisco caiu das nuvens: «O quê? Estás maluco?!» O desmentido, por antecipação, chegou a tempo de evitar a publicação da notícia e do respetivo editorial.

Por essas e outras é que o Papa deixou de confiar a terceiros o envio de emails e aprendeu a mexer em computadores…

E esta não foi a única armadilha que o jornalista português desativou: quando se colocou o problema da curta viagem entre Israel e o território controlado pela Autoridade Palestiniana, com dificuldades de toda a ordem para atravessar a fronteira, Cymerman fez os seus contactos e desbloqueou a situação. Em Roma, o «padre Jorge» comentava, mais uma vez: «O Henrique resolve»…

O judeu ‘infiltrado’
O ecumenismo religioso praticado no Vaticano já deu origem a episódios curiosos, momentos históricos e falatórios subterrâneos.

Em setembro do ano passado, mais uma vez, o rabino argentino Abraham Skorka visitou o Papa. Quando está em Roma, ele faz parte das sete ou oito pessoas que almoçam ou jantam com o «padre Jorge», em refeições que não ultrapassam a meia hora Francisco ufana-se de ser um homem ocupado e não tem muito tempo para almoçaradas… Por essa altura, decorria a festa religiosa judaica do Fukot, que inclui a bênção do vinho (o Kidush) e do pão (o Hamotsi).

Quando chegou a altura, o rabino levantou-se (de uma mesa onde só havia cardeais) e retirou-se para um canto, onde iniciou as suas orações. Mas o facto não escapou ao «padre Jorge», que o chamou: «Vem cá! Faz aqui as tuas bênçãos, que nós queremos participar…» E foi assim que, pela primeira vez na História, um ritual judaico foi realizado, em hebraico, no coração do Vaticano. E no final, um Papa disse «Ámen». É verdade que nem todos os comensais gostaram e que o episódio contribuiu para acumular mais um ponto na lista de «descréditos» de Francisco junto da Cúria. Se tudo fosse um vídeo jogo, o Papa havia perdido uma vida…
Mas Henrique Cymerman é testemunha direta do novo ar que se respira em Roma: «Contei ao Papa que, quando andava nos maristas, fui impedido, uma vez, por um padre, de jogar futebol com os meus colegas, todos católicos, porque eu era judeu. O Papa ficou de lágrimas nos olhos. E disse-me: ‘É para evitar que histórias como essa se repitam que eu aqui estou. O antissemitismo é um pecado’.»

Uma cunha para o Papa
A viagem do Papa será, assim, também, um momento ecuménico inédito. Com Abraham Skorka, que faz parte da comitiva papal, segue, também, o Mufti Omar, representante dos muçulmanos da argentina. De Istambul, viaja o patriarca ortodoxo de Constantinopla, Bartolomeu, chefe dos cristãos ortodoxos. Francisco e Bartolomeu têm agendada uma reunião junto ao Santo Sepulcro, onde católicos e ortodoxos se envolvem, diariamente, em confrontos que atingem as vias de facto.

viagem passa pelo aconselhamento permanente de Henrique Cymerman, que tem contactos quase diários com Alicia Barrios, e com funcionários do Vaticano, mas também conversas regulares com o embaixador Issa Kaffiffieh, com os gabinetes de Netanyahu, Perez e Abas, ou com o assessor diplomático do Presidente israelita, Nadad Tamir: «Todos me usam como consultor. E eu faço isto porque sinto que posso dar uma ajuda para mudar a História!». E até há quem ache que ele tem mesmo uma espécie de «telefone vermelho » para Francisco. Que o diga o judeu de origem argentina Daniel Zaidenberg, que emigrou na juventude para Israel e vive, agora, num kibutz. Na infância e adolescência, ele conheceu o «padre Jorge». Jogava futebol na paróquia de Bergoglio. Através da internet, arranjou forma de descobrir um endereço no Vaticano, para onde enviou um email, identificando-se e pedindo para se encontrar com o Papa, durante a visita. Pouco tempo depois, recebia resposta escrita pelo próprio punho papal: «Dani, lembro-me muito bem de ti! Quero ver-te, e à tua família, mas, devido ao aperto da agenda da viagem, será difícil desta vez. Mas vais receber um convite para vires a Roma e para estarmos juntos!» Ainda assim, o antigo menino de Buenos Aires não desarma.
E telefonou para Henrique Cymerman: «Por favor, arranje-me lá um encontro com o Papa! Quaisquer 30 segundos chegam…» Talvez Henrique Cymerman possa, como Francisco, fazer alguma coisa pela paz. Mas poderá ele fazer alguma coisa pelo Daniel?…


Papas na Terra Santa

Francisco é o 4.° Papa a visitar Israel e a Terra Santa. A primeira visita de um Papa aconteceu de 4 a 6 de janeiro de 1964, há 50 anos, tendo Paulo VI entrado em Jerusalém pela Porta de Damasco. De 20 a 26 de março de 2000, João Paulo II incluiu a sua viagem na celebração do Jubileu do ano 2000. E entre 6 e 15 de maio de 2009, Bento XVI marcou a sua presença num local que se tornou ponto de visita obrigatória para o bispo de Roma.
Só João Paulo I, desaparecido prematuramente, não teve tempo para tal…

Uma bomba de Francisco?

Num livro escrito a meias com o rabino de Jerusalém, Abraham Skorka, o então cardeal de Buenos Aires, Jorge Bergoglio, defendia a abertura de alguns arquivos ainda não conhecidos do Holocausto, em Roma, para que se soubesse toda a verdade sobre o papel da Igreja no período da II Guerra Mundial. Correm rumores de que Francisco possa fazer, durante esta viagem, ou logo a seguir ao regresso a Roma, algumas revelações e um ato de contrição relativamente à alegadas omissões do Vaticano (era Papa Pio XII), sobre o que se conhecia do Holocausto, durante a II Guerra Mundial, e a Igreja terá calado. A haver matéria para um pedido de perdão, isso teria, junto dos setores mais conservadores da Santa Sé, o efeito de uma verdadeira bomba.

Viagem dá livro

Henrique Cymerman e Jorge Reis Sá estão a escrever um livro sobre a viagem do Papa Francisco à Terra Santa. Obra da autoria de um católico e de um judeu, com depoimentos de vários amigos do Papa, sobre as três temáticas que lá o levam: o ecumenismo, o conflito israelo-árabe e a perseguição aos cristãos naquela área.
Terá também a colaboração expressa do próprio Papa Francisco em moldes que serão revelados quando do lançamento, no inicio de outubro, com a chancela da editora Guerra & Paz.

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Este é o mais recente livro da coleção A Escolha é Minha, onde a autora aborda temas de uma enorme carga emocional e que, muitas vezes, condicionam a vida dos mais jovens. Neste livro, a história desenvolve-se à volta da violência no namoro, uma temática muitas vezes silenciosa e silenciada. Com uma prosa sensível e poética, a autora leva-nos a refletir sobre o poder das relações e sobre aquilo que o amor significa verdadeiramente, numa fase de autoconhecimento tão importante como é a adolescência.

Margarida Fonseca Santos (texto)
Editoria Fábula

As sugestões da VISÃO Júnior estão organizadas em três faixas etárias que se adequam aos três ciclos do ensino básico. Contudo, estas dicas dependem sempre da fluência e da maturidade de quem vai ler.

Palavras-chave:

Amplamente publicada em Portugal, esta autora tem vindo a marcar o panorama da literatura infantojuvenil mundial, tendo recebido inúmeros prémios pelas suas obras. Este novo livro traz uma coletânea de contos. São sete histórias que navegam entre a realidade e a fantasia: perfeitas para alimentar o espírito e a imaginação. Os contos são surpreendentes, e todos eles escritos de uma forma simples e cativante, perfeitos para serem lidos e contados. Destaca-se a história do rapaz que tinha uma rã na garganta e a de um machado que resolveu casar com uma árvore.

Onjali Q. Raúf (texto) e Katarzyna Doszla (ilustração)
Editora Booksmile

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Palavras-chave:

A Polícia Judiciária (PJ) deteve esta terça-feira, 30, cinco indivíduos na posse de duas malas carregadas de cocaína, no aeroporto de Lisboa, no âmbito da operação “Passageiros fantasma”. Em comunicado divulgado esta quarta-feira, a PJ indica que os cinco homens se deslocaram ao aeroporto, “munidos de bilhetes de avião que não utilizaram”, para recolher as duas bagagens “provenientes de um voo da América do Sul” e que circulavam no respetivo tapate rolante para o efeito. No interior, o equivalente a “cerca de 780 mil doses individuais de cocaína”.

O quinteto é suspeito de integrar uma organização criminosa decidada “ao tráfico de estupefacientes por via aérea” e foi interceptado pelas autoridades em flagrante delito, à saída do aeroporto, numa operação conduzida pela Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes da PJ que contou com a colaboração da Divisão de Segurança Aeroportuária da PSP. Segundo detalha a PJ, dois dos detidos encarregaram-se de recolher as malas, sob a supervisão dos restantes três, “que efetuavam, também, manobras de contra vigilância”.

Na sequência das detenções, foram ainda realizadas buscas domiciliárias que redundaram na apreensão de “30 mil euros em notas, três viaturas automóveis, uma arma de fogo proibida, munições e documentação diversa”.

A operação decorre de um inquérito do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, que prossegue a investigação. Os cinco detidos no aeroporto de Lisboa têm entre 28 e 42 anos e já foram presentes a juiz para determinação das medidas de coação.

Este é já o décimo nono livro da coleção e, se ainda não a começaram a ler, está na altura de pegar nela. Ler Álvaro Magalhães merece toda a nossa atenção. Esta é a história de Fred, um rapaz que se vê em situações comprometedoras com muita frequência. A verdade é que ele vive rodeado de gente bizarra, mas também de bons amigos, o que transforma estas aventuras num verdadeiro tesouro literário contemporâneo. Em cada livro podemos encontrar diversas histórias, e neste podemos ler sobre um programa de televisão, cuecas aerodinâmicas e noites felizes.

Álvaro Magalhães (texto) e Carlos J. Campos (ilustração)
Porto Editora

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As considerações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a orientalidade de António Costa ou a ruralidade de Luís Montenegro seriam próprias de um comentador ansioso por dar nas vistas, mas, digamos, não contribuem para a dignidade da instituição Presidência da República. Esta infeliz intervenção faria levantar um coro de merecidas críticas ao Presidente da República, no entanto, não beliscaria o cerne das funções de quem exerce o cargo. Já a piada sobre o completo esvaziamento das pretensões do Ministério Público no caso Influencer pelo Tribunal da Relação e a suposta consequência europeia, o que disse sobre o suposto maquiavelismo da conjugação de timings sobre os inquéritos ao ex-primeiro-ministro e o caso das gémeas e o lançar no Brasil do tema das reparações às antigas colónias são de uma enorme gravidade. Bastava só uma para que questionássemos de uma forma muito séria a compreensão que Marcelo Rebelo de Sousa tem das funções que desempenha; as três juntas e ditas num curto período assustam. 

Começo pela menos grave. No jantar com os correspondentes estrangeiros acreditados em Lisboa, o Presidente da República resolve levantar uma questão sensível, que não foi minimamente debatida na nossa comunidade, que precisa de um consenso com os representantes do povo no Parlamento e no Governo e que alimenta uma guerra cultural que o Presidente tem obrigação de não fomentar. Assim, como se estivesse a falar de um assunto de lana-caprina, decide que os portugueses têm de pagar indemnizações e pôr a cabeça no cadafalso. A história de uma comunidade é feita de sucessos e reveses, de glórias e vergonhas, de heróis e de vilões. Tirá-la do contexto histórico, analisá-la à luz de princípios e valores de agora, enquadrá-la segundo ideologias de hoje é apenas dinamitar qualquer discussão saudável e produtiva. Um Presidente da República não pode ser tão leviano.

As duas primeiras dizem respeito a uma das responsabilidades centrais da Presidência da República: ser o garante do regular funcionamento das instituições. Quando é o próprio Presidente da República a sugerir que um comportamento da procuradora-geral da República não prossegue, num dado caso, o cumprimento estrito da lei, mas uma espécie de esquema de compensações, sendo movida pelo maquiavelismo, está também a admitir que uma instituição fundamental para a democracia não está a funcionar de forma regular e isso tem de ter consequências. É muito difícil dizer-se algo de mais grave de um servidor público, sobretudo ligado à Justiça, do que aquilo que o Presidente disse.

Tão ou mais grave é a antiga, mas que não pode ser esquecida, piadola sobre António Costa e o seu futuro. Não é possível dizer de maneira diferente: quando um Presidente da República trata com uma leveza tal um conjunto de atuações do Ministério Público (MP) que se revelaram incompetentes, negligentes e atentatórias ao equilíbrio de poderes e que levaram à demissão de um primeiro-ministro e a acusações graves a ministros, das duas uma: ou se esqueceu das suas funções ou não percebe o que é o regular funcionamento das instituições. Como tenho repetido que o que aconteceu no dia 7 de novembro foi um autêntico golpe de Estado institucional e tenho lido e ouvido muitas pessoas a dizer que o que defendo é um exagero e mesmo uma fantasia, permitam-me este parêntese à boleia do que aparentemente Marcelo Rebelo de Sousa não percebeu.

Diz-se que, pronto, as coisas não correram bem. Foi muito grave, mas é um exagero falar-se de um golpe de Estado. Alguns chegam a invocar as várias incompetências do antigo governo como se tal viesse a propósito. Não o dizem de forma clara, mas chega a parecer que isto é uma espécie de atenuante para a atuação do MP. Digam-me então o que se chama a uma situação em que as instituições funcionaram segundo os seus poderes, mas que uma se sobrepõe às outras sem qualquer justificação minimamente plausível, atropelando a vontade popular e de facto demitindo um governo legitimamente em funções? Um lapso? Uma coisa que se pode resolver com um “oops, desculpem qualquer coisinha”? E, agora, resume-se o assunto a “assim António Costa tem mais hipóteses de ir para o Conselho Europeu”?

Importa repetir o que já cansa voltar a dizer: não me parece que tenha havido qualquer cabala ou conspiração com fins políticos. Há, sim, um cocktail letal de justicialismo, deslumbramento, profunda ignorância do que são as relações normais entre Estado e privados, confusão entre o que é a prossecução da ação penal e a avaliação de uma decisão política. Apesar do que o que disse não poder ser apagado, e será sempre uma mancha grave no seu mandato, espero que tenha sido apenas uma má fase. É que o País precisa como nunca dum Presidente da República sereno e consciente das suas responsabilidades.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

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A Kith tem-se afirmado, desde a sua fundação, como uma acérrima defensora da moda e um reflexo da abordagem disruptiva que Ronnie Fieg faz das suas criações. Agora, a TAG Heuer junta-se à marca do designer americano para reeditar o TAG Heuer Fórmula 1 Série 1, modelo lançado originalmente em 1986, com novas cores e materiais e também num novo tamanho de 35 mm. O que se mantém? A imagem divertida e os mecanismos infalíveis.

“A reedição do TAG Heuer Fórmula 1 original é algo que a comunidade de colecionadores vem pedindo há vários anos”, justifica o CEO da TAG em comunicado enviado às redações. “Um desses colecionadores é o fundador do Kith, Ronnie Fieg, que partilhou connosco que, à semelhança de outros colecionadores, teve neste modelo o seu primeiro relógio, quando era mais jovem”.

“Esta é uma das mais significativas peças na história da TAG Heuer. A primeira a ostentar o nome TAG Heuer, e que acabou por apresentar a uma geração de colecionadores o nosso compromisso de fabricar relógios premium no cruzamento da cultura com o automobilismo”, continua Julien Tornare.

A marca conseguiu resgatar o fornecedor da caixa dos primeiros modelos produzidos para esta referência e, portanto, a edição que agora chega ao mercado replica com exatidão a versão dos anos 1980. No entanto, o modelo atual conta com um mostrador de safira, e uma bracelete que passa de plástico a borracha. E, em 2024, a TAG trabalhou de perto com a Kith para apresentar várias combinações de cores a roçar o exotismo – e garantindo uma panóplia muito mais curiosa de opções.

No mesmo sentido, e pela primeira vez na história da marca suíça, a TAG Heuer mexeu no seu logo, e na parte de trás da caixa é agora possível ver uma combinação das marcas parceiras, num logotipo estilizado.

Já o mostrador tem a mesma interpretação do logo, e ainda a inscrição ‘Just us’, uma homenagem ao círculo íntimo de Fieg.

D.R.

“Foi uma honra para mim tomar parte neste renascimento do TAG Heuer Fórmula 1 Série 1”, refere o fundador da Kith no mesmo comunicado. O modelo “em vermelho e negro foi o meu primeiro relógio, uma peça que me ajudou a expressar um estilo único que hoje se manifesta através da Kith”.

Há dez novos relógios deste modelo, disponíveis no mercado, com braceletes de aço ou de borracha, e várias combinações de cores. Sete dos relógios são exclusivos da Kith e cada um homenageia uma loja da sua rede global. São os mais coloridos: vermelho, preto e amarelo, verde, amarelo, vermelho carro-desportivo, creme e preto mate. Cada um deles é limitado a 250 peças.  Há ainda outros dois modelos exclusivos – 350 peças – com bracelete de metal e mostradores em azul ou verde.

Já a TAG apresenta dois modelos exclusivos, limitados a 825 peças, em verde ou azul vibrante, e com bracelete de borracha. O primeiro lançamento de ambos será feito apenas nas lojas da marca, em Miami, no dia 3 de maio, e ficarão disponíveis globalmente no dia 6 de maio.

O modelo conjunto entre a TAG e a Kith é limitado a 1350 peças, e é apresentado em preto e vermelho, e com bracelete de metal.

Com movimento de quartzo e a data às 3 horas, qualquer um dos modelos da coleção evoca a velocidade, a dinâmica e o entusiasmo de uma pista de Fórmula 1. São à prova de água até 200m de profundidade e têm um preço a rondar os €1500.

A cidade de Bedlam é uma confusão. Para além de ser um sítio desolador e sujo, é também o lugar mais perigoso do Planeta. Para lidar com uma cidade deste calibre, só mesmo um herói forte e corajoso pode trazer soluções. Mais uma vez, David Walliams cria uma história num local totalmente inesperado com personagens surpreendentes. Nos últimos anos, o autor deu-nos algumas obras emblemáticas que o transformaram num dos principais nomes da literatura infantojuvenil atual. Esta nova aventura, que nos apresenta um cão robô cheio de qualidades, é mais um belo exemplo daquilo que Walliams consegue fazer com a sua imaginação.

David Walliams (texto) e Adam Stower (ilustração)
Porto Editora

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A fúria é algo que pode ter muitas formas e, às vezes, está lá, não tem forma nenhuma, mas existe. Este livro dá-nos a mão e leva-nos até a um sítio seguro, onde podemos encontrar respostas para os momentos furiosos que, de vez em quando, todos temos. Ao mesmo tempo, passa-nos umas quantas receitas para conseguirmos ultrapassar fúrias, birras e gritarias. Um manual para o autoconhecimento e para a compreensaão de que não somos exemplos de perfeição, mas podemos crescer e transformar a fúria em sentimentos diferentes. Daqueles que nos fazem sorrir e respirar fundo porque, afinal, ficou tudo acabou bem.

Patrícia Portela (texto) e Amanda Baeza (ilustração)
Editora APCC

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“O que é que eu estou aqui a fazer?” A dúvida não sai da cabeça de Pedro Lamy. E, à medida que as horas avançam naquele fim de semana de 1994, em São Marino, torna-se cada vez mais presente. Aos 21 anos, o piloto português da Lotus está nas nuvens com o ingresso na Fórmula 1, cumpre o seu sétimo Grande Prémio na categoria máxima do desporto automóvel e, no entanto, a sequência de acontecimentos no circuito de Imola atormenta-lhe o espírito como nunca.

Na sexta-feira, Rubens Barrichello sofrera um acidente brutal na primeira sessão de qualificação, ao sair em frente numa curva, a mais de 220 km/h. O carro do brasileiro deu voltas no ar e aterrou “de cabeça para baixo”, o lado direito desfeito em mil pedaços. Inconsciente, Rubinho recuperou os sentidos no centro médico do circuito, com um diagnóstico quase divino: nariz partido, braço e costelas doridas.

O destino de Roland Ratzenberger, no dia seguinte, é bem diferente. O piloto austríaco, de 33 anos, não resiste ao impacto a mais de 300 km/h com a barreira de proteção, durante a última sessão de qualificação para a corrida de domingo, dia 1 de maio. Transportado de helicóptero para o hospital, a sua morte é anunciada no circuito 40 minutos após o acidente.

Com o “grande ponto de interrogação” a ganhar força na sua cabeça, Lamy decide visitar Barrichello, que já anda de novo por Imola após ter passado a noite no hospital. Quando chega à autocaravana do brasileiro, Ayrton Senna está a sair. “Muito transtornado”, desabafa o português: “Dá graças a Deus por estarmos vivos.” O tricampeão do mundo bate-se por mais segurança na F1 desde o arranque da temporada e, na manhã de domingo, Pedro Lamy ouve-o abordar o tema na habitual reunião de pilotos que antecede a corrida.

Assim que acende o sinal verde de partida, mais problemas. O Benetton de J.J. Letho permanece estático, e Lamy, “encoberto pelo carro da frente”, não evita o choque quando tenta escapar pela esquerda. “Não tive ângulo de visão para ver que ele estava ali parado”, recorda, 23 anos depois. “Foi tão rápido que nem deu para me assustar. Tive sorte por não me ter acontecido nada, mas houve espectadores feridos pelos pneus que saltaram para as bancadas.”

Por causa dos destroços, entra em ação o safety car. Na zona da comunicação social, Lamy dá entrevistas às televisões quando a corrida é retomada, à sexta volta. Senna dispara na frente e, logo na volta seguinte, perde o controlo do seu Williams. Esbarra com violência no muro e uma peça solta do carro perfura-lhe o capacete. “Estava a comentar o meu acidente e, de repente, há outro. Era o do Ayrton. Ficámos em choque, sem saber bem o que se passava”, conta o português, referindo-se às horas de incerteza que se seguiram. Quando foi declarado o óbito, Lamy já estava no hospital em Bolonha, mas ainda hoje lhe é difícil acreditar nas “24 horas mais difíceis da Fórmula 1” – assim se refere aos acontecimentos trágicos desse dia.

O acidente fatal de Ayrton Senna, no circuito de Imola, a 1 de maio de 1994 Foto: Alberto Pizzoli/Sygma/Sygma via Getty Images