O rover Curiosity chegou a Marte em 2012 e continua a fazer descobertas surpreendentes. Recentemente, o veículo deparou-se com cristais de enxofre puro depois de ter passado por cima de uma rocha. Apesar de já terem sido detetados outros minerais contendo enxofre no planeta, a presença de cristais puros é inédita, afirma a NASA.

Imagem: NASA/JPL-Caltech/MSSS

Em comunicado, a agência espacial norte-americana explica que desde outubro de 2023 que o rover está a explorar uma região rica em sulfatos. O enxofre puro “só se forma em condições muito específicas que os cientistas não associam à história deste local”, realça.

A descoberta acidental foi feita a 30 de maio no canal Gediz Vallis e confirmada pela MastCam a 7 de junho. Citado pelo Engadget, Ashwin Vasavada, cientista do projeto, explica que “encontrar uma rocha feita de enxofre puro é como encontrar um oásis no deserto”. “Não devia estar ali e agora temos de a explicar. Descobrir coisas estranhas e inesperadas é o que torna a exploração espacial entusiasmante”, afirma.

Depois de encontrado os cristais de enxofre, a equipa usou a câmara do braço robótico do rover para o inspecionar melhor e recolheu uma amostra de outra rocha nas proximidades. O Curiosity está equipado com vários instrumentos que permitem extrair conclusões rapidamente e, neste caso, foi usado o Alpha Particle X-ray Spectrometer para determinar a composição química da descoberta.

Aos 59 anos, Kamala Harris tem intenções de entrar na corrida à presidência dos Estados Unidos da América, depois da desistência de Joe Biden. O ainda atual líder da Casa Branca declarou o seu “apoio total e recomendação” à candidata, que se assume “honrada” por receber esta aprovação.

A filha de um casal de imigrantes (o pai economista jamaicano e a mãe oncologista indiana), apesar do seu nome pouco vulgar, tornou-se a primeira mulher, a primeira afro-americana e a primeira asiático-americana a tornar-se vice-presidente dos EUA. E, em novembro deste ano, se os eleitores permitirem, tem igualmente ao seu alcance a chefia do Partido Democrata e do Estado.

As origens, os heróis e o orgulho

Kamala é um dos grandes exemplos do melting pot norte-americano. A mãe, Shyamala Gopalan, oriunda de uma família de brâmanes (no topo do sistema de castas) do Sul da Índia, emigrou para os EUA com o intuito de fazer um doutoramento em Oncologia. O pai, Donald Harris, natural da Jamaica, tinha o mesmo objetivo mas em Economia. O casal conheceu-se na Universidade de Berkeley e ambos acabariam por se casarem contra a vontade das respetivas famílias. Os protestos pelos direitos civis e contra a Guerra do Vietname não os impediram de concluir os estudos, nem de levarem a filha mais velha num carrinho de bebé para estas manifestações – nas suas memórias, Kamala diz que ainda se recorda desses tempos, dos cânticos, dos gritos e, sobretudo, do mar de pernas à sua volta.

A benjamim da família, Maya, iria nascer em 1967, quando as carreiras profissionais dos progenitores já estavam lançadas. Só que o casal acabaria por se divorciar cinco anos mais tarde e as duas irmãs ficaram ao cuidado da investigadora especializada em cancro da mama que adorava o jazz de Thelonious Monk, John Coltrane e Miles Davis.

O tempo demonstrou que a cientista terá feito um bom trabalho. Kamala foi a primeira afro-americana a desempenhar os cargos de procuradora de São Francisco (2004-2011) e de procuradora-geral da Califórnia (2011-2017), a primeira indo-americana a ser eleita para o Senado dos EUA e a primeira não branca candidata à vice-presidência por um dos grandes partidos norte-americanos. Pelo meio, e após concluir o Ensino Secundário em Montreal, no Canadá – a mãe foi contratada pela Faculdade de Medicina da Universidade McGill –, Kamala quis ir estudar para um estabelecimento de ensino especial: a Howard University, em Washington D.C., fundada logo a seguir à Guerra da Secessão e em que a maioria dos alunos eram afro-americanos. Em 1986, com um canudo em Ciências Políticas e Economia, decidiu regressar à Califórnia e formar-se também em Direito, na Hastings College of the Law. Quatro anos mais tarde, era uma jurista profissional.

Na sua autobiografia lançada em 2019 – “As Verdades que Nos Sustentam: Uma Viagem Americana” (não traduzido para português) – Kamala Harris revela no prefácio como deve ser dito o seu nome: “Comma-la. Significa flor de lótus, um símbolo importante na cultura indiana. Nasce debaixo de água e a flor cresce à superfície, enquanto as raízes ficam agarradas ao fundo dos rios”.

Embora a autora não o refira, lótus é também uma das designações alternativas da deusa Lakshmi, cujos poderes podem transformar os sonhos em realidade. E, neste capítulo, as ambições de Kamala são bem claras, seguindo à risca as palavras de um dos seus heróis, Thurgood Marshall, o primeiro afro-americano a sentar-se no Supremo Tribunal dos EUA (falecido em 1993): “Não podemos fazer de avestruzes. A democracia jamais floresce num ambiente de medo. A liberdade não floresce num ambiente de ódio. A justiça não ganha raízes num ambiente de fúria. A América precisa de meter mãos à obra. Temos de lutar contra a indiferença, contra a apatia, contra a desconfiança”, disse em 2020.

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“Estimamos que a atualização da CrowdStrike tenha afetado 8,5 milhões de dispositivos Windows, ou seja, menos de 1% de todas as máquinas com Windows”, afirmou a Microsoft numa publicação no seu blogue. Recorde-se que, na passada sexta-feira, uma atualização feita pela CrowdStrike conduziu a um apagão global, com várias indústrias a terem ficado paradas durante horas.

Apesar de a percentagem de máquinas afetadas ser relativamente pequena, “os impactos económicos e sociais refletem o uso da CrowdStrike em empresas que executam muitos serviços críticos”. A empresa ajudou a desenvolver uma solução que permita à infraestrutura Azure da Microsoft acelerar a correção do problema e está a trabalhar com a Amazon Web Services e com a Google Cloud Platform para partilhar dados sobre o que a Microsoft está a ver na indústria, noticia a Reuters.

Companhias aéreas, empresas de telecomunicações, supermercados e o setor da finança estão entre as principais indústrias afetadas por este apagão

Se os influencers fossem produtos hortícolas, a sua época seria o verão. Plantam-se no inverno, crescem na primavera e exibem-se em julho no máximo esplendor. Como as melancias. Quiçá tentando apanhá-los distraídos, dançando à beira da piscina, o estado do Illinois acaba de implementar uma lei pioneira: crianças e adolescentes passam a ser compensados por aparecerem nas redes sociais dos seus pais. Um pequeno passo no faroeste digital, um grande passo na proteção de menores.

Segundo a nova adenda à Lei do Trabalho Infantil daquele estado, todas as crianças e adolescentes menores de dezasseis anos têm direito a uma percentagem do lucro obtido nas redes sociais pelos encarregados de educação, sempre que apareçam em 30% do conteúdo publicado num mês. O valor deve ser depositado num fundo, acessível aos filhos assim atinjam a maioridade. A lei responde à indústria milionária dos family influencers, em que os pais usam a imagem dos filhos para fazer publicidade a marcas, e permite aos jovens exigir compensação justa, no caso de esta lhes ser negada. Sendo ainda circunscrito ao Illinois, é um avanço fundamental num debate urgente sobre as crianças na Internet, privacidade e direitos de imagem.

Como aqui defendi no caso do casal de Famalicão que proibia os filhos de ir às aulas de Cidadania, acredito que o Estado tem o dever de proteger os direitos dos menores – por vezes contra os seus pais, por muito delicado que seja o caso-a-caso. Os encarregados de educação não são donos das crianças. Quando a escolaridade obrigatória surgiu, por exemplo, muitos pais se opuseram, exigindo o direito a tirar os miúdos da escola, que isto a gente não samos dótores, e ala mas é trabalhar. Felizmente, o Estado garante aos seus cidadãos o direito à infância e à educação formal. Também aos cidadãos de fralda.

A indústria do entretenimento está repleta de casos em que o talento dos filhos é capturado por pais criminosos em proveito próprio. É impossível não pensarmos em Britney Spears, vítima de uma rede escabrosa liderada pelo próprio pai que a expropriou dos frutos do seu génio, da sanidade mental e do livre arbítrio, num golpe em tudo desumano, sustentado pela justiça americana. Conhecemos as histórias. Todos conhecemos casos de jovens atores, artistas, atletas, modelos, que nunca chegam a ter uma palavra sobre o dinheiro que ganham em crianças. Conhecemos os estudos sobre o impacto da exposição no desenvolvimento psicológico dos mais jovens. Acredito sem ironia que os pais sejam na maioria justos, decentes e cuidadosos, mas cabe ao Estado proteger os jovens que não têm essa sorte. Na Internet, não pode ser diferente.

Se o cidadão comum partilha tudo nas redes sociais, é natural que inclua a vida familiar na miscelânea de stories que vão das eleições francesas ao batido de quinoa da Bimby. Seria estranho não vermos nada sobre uma das dimensões mais importantes na vida de quem tem filhos: os próprios filhos. Pessoalmente defendo que, por uma questão de privacidade, segurança e direito à imagem, as crianças não devem ser expostas em quadros de intimidade, mas cabe a cada um avaliar. Diferente é quando publicar fotografias do bebé, ainda mal abre os olhos, ou da criança, que não faz ideia do que se passa, gera dinheiro para os pais. Nesses casos, olho para a nova lei do Illinois como um excelente começo. Leave them kids alone!

Nota: tive o privilégio de ser deixado em paz na minha infância e juventude, com a minha privacidade e intimidade protegida pelos meus pais, avós, tios e adultos da minha família. As minhas primeiras imagens online já foram publicadas por mim, em plataformas que já não existem. Felizmente. Ninguém fez de mim influencer à força.

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A Huawei Band 9 é a nova pulseira inteligente da marca chinesa e destaca-se sobretudo pelas capacidades de monitorização da saúde. Este modelo é constituído por uma caixa de plástico resistente e por uma bracelete em silicone, distinguindo-se logo à partida pela boa qualidade de construção. A pulseira pesa apenas 14 gramas, o que por diversas vezes nos fez esquecer que a tínhamos no pulso.

O ecrã apresenta cores nítidas e, tendo em conta a nossa experiência, a navegação é fluida, com uma boa sensibilidade e resposta imediata aos toques. O brilho automático permite uma visualização do ecrã mesmo em dias mais soalheiros. A pulseira tem ainda um botão físico do lado direito que, além de ligar o ecrã, permite aceder às diversas modalidades desportivas suportadas.

Monitorizar com qualidade

O controlo dos diferentes parâmetros de saúde continua a ser uma das grandes apostas da marca, existindo um salto qualitativo em relação à geração anterior. Ao compararmos a medição dos batimentos cardíacos por minuto (bpm) com os valores obtidos por aparelhos destinados ao registo deste parâmetro verificámos que os resultados foram semelhantes.

Pusemos a Huawei Band 9 à prova com uma corrida e, quando aumentámos a intensidade, a pulseira registou corretamente a subida dos bpm, um bom indicador da eficácia e da resposta rápida do sensor de medição. A monitorização de oxigénio no sangue também é fiável. Quando comparámos os resultados obtidos com os de um oxímetro os valores foram idênticos. A aplicação Huawei Health dá-nos a possibilidade de aceder a todos os dados registados pela pulseira. De salientar que na primeira utilização é necessário concedermos permissões, de forma constante (e quase excessiva) na app para que esta monitorize os diferentes parâmetros de saúde.

A par da medição dos batimentos cardíacos e do oxigénio no sangue, a monitorização do sono demonstra um bom nível de precisão. De acordo com a nossa experiência ao longo de várias noites, tanto a hora de adormecer, como a de acordar, foram sempre registadas de maneira exata. A pulseira monitoriza o sono profundo, REM e leve, assim como a quantidade de vezes que acordamos. Os registos de sono ficam guardados na app em forma de gráfico e percentagem, descrevendo os tipos de sono durante a noite. O ritmo respiratório é outro dos parâmetros monitorizados, registando o intervalo médio das vezes que respiramos enquanto dormimos. Quando acordamos a pulseira atribui uma pontuação ao sono, numa escala de 0 a 100.

Na monitorização do stress, podemos afirmar que os valores que a pulseira conseguiu registar foram muito próximos da realidade. Durante um dia tranquilo de férias, os níveis de stress estiveram sempre baixos, como esperado. Mas no mesmo dia, durante o jogo da Seleção Nacional contra a Chéquia, os valores dispararam até ao momento do golo da vitória apontado por Francisco Conceição.

No entanto, ao testarmos a Huawei Band 9 em corridas e caminhadas, notámos que existem aspetos a melhorar. Reparámos, por exemplo, que a pulseira contabiliza passos em excesso, demorando ainda algum tempo a atualizar os valores registados. É também de realçar que este modelo não permite realizar chamadas telefónicas, vibrando apenas quando estamos a receber um telefonema.

Autonomia para dar e vender

A autonomia é um fator muito relevante nesta pulseira. Com um nível de utilização típico e apenas um carregamento total, conseguimos cerca de 12 dias de utilização. O que, no mundo das pulseiras e relógios inteligentes, é uma autonomia excelente. A Huawei afirma que o carregamento total é de 45 minutos, um valor que comprovámos durante a nossa utilização.

Tome Nota
Huawei Band 9– €59,99

Autonomia Excelente
Monitorização Muito Bom
Conforto Muito bom
Software Bom

Características Caixa em plástico ○ Ecrã: AMOLED de 1,47”, 466x 466 pixels ○ Dimensões: 43,45mm x 24.86mm x 8.99mm ○ Modos de desporto: +100  ○ Resistência à água: 5 ATM ○ Autonomia anunciada: 14 dias ○ Funções: frequência cardíaca, SpO2, sono (leve, profundo, total de horas dormidas, REM), stress ○ Conectividade: BT 5.0

Desempenho: 4
Características: 4
Qualidade/preço: 4,5

Global: 4,2

*Texto: Tiago Jorge Pereira, editado por Francisca Andrade

Já Platão falava na demagogia como uma versão corrompida do ideal de governo democrático, manifestando-se por via de uma liderança carismática que, pretendendo garantir interesses próprios, explora os desejos e os medos da população para ganhar poder. A demagogia e o populismo fizeram, desde cedo, o seu caminho por meio de períodos históricos e formas de governo, razão pela qual Mudde e outros politólogos defendem que o populismo é uma ideologia de baixa densidade que se acopla a diversas grandes ideologias. Embora se trate de um fenómeno de longo prazo, a verdade é que o populismo tem assumido um papel determinante no “fazer político”, revelando-se, sobretudo, um mecanismo de construção e consolidação de “personagens políticas”, cuja performance representa uma clara degradação do regime democrático, ao explorar o ressentimento para efeitos de polarização política e social, segundo a velha máxima “dividir para reinar”.

Como defendem Daniel Ziblatt e Steven Levitsky (Como Morrem as Democracias), esse modo de atuar é responsável pela “morte da democracia”, ao colocar em causa os princípios elementares, razão pela qual Yascha Mounk (Povo vs Democracia) defende que vivemos um período em que os princípios liberais (Estado de Direito, separação de poderes, liberdades individuais) se apartam da democracia como regime, fazendo desta um regime formalista, baseado exclusivamente na vontade da maioria – “as pessoas de bem”/”the people”. No seio deste fenómeno encontram-se as chamadas “guerras culturais”, disputas sobre questões de ordem moral – como aborto, eutanásia, direitos das minorias sexuais e raciais, identidade de género, família, religião e laicidade, imigração e refugiados, entre outras – que polarizam a sociedade de forma insuperável. À medida que se dissolve a ideia de “chão comum”, a sociedade é observada através de lados opostos, já que, como refere Ezra Klein (Why We’re Polarized), a identificação política passou a constituir parte determinante da nossa identidade abrangente.

Ora, este prelúdio tem tudo a ver com a realidade americana, verdadeiro referencial teórico nesta matéria. De modo muito fático, é com a eleição de Donald Trump, em 2017, que o populismo e a demagogia mais desbragada se consolidam, dando origem a réplicas como Jair Bolsonaro ou Boris Johnson. A emergência de tais figuras representou uma transformação profunda no campo conservador, com uma radicalização dos partidos da direita em direção a agendas identitárias nativistas (ver v.g. Os Identitários de Zúquete) que se afastam do quadro consensualista do centro democrático. O espetáculo político associado a estas figuras e a mediatização política, potenciada pelas redes sociais, produzem efeitos eleitorais que tornam esta tipologia de atores políticos “apetecível” para os partidos de poder.

Se Donald Trump é uma figura que condensa a tipologia populista e demagógica com as “guerras culturais”, através da sua afirmação messiânica (a que a tentativa de assassinato veio dar bálsamo de mártir), a escolha de JD Vance para seu potencial Vice-Presidente encapsula tudo o que anteriormente foi dito, com o acréscimo de determinar os rumos do Partido Republicano.

Senador pelo Ohio, e autor do best-seller “Hillbilly Elegy”, obra que retrata a realidade das populações brancas pobres da América não-urbana, JD Vance, de 39 anos, é o rosto de uma nova geração de políticos que entendeu o populismo conservador como um modo de sucesso de fazer política, passando de crítico a apologista do trumpismo. A ascensão de Vance e a sua participação nas chamadas “guerras culturais” – defende políticas de imigração mais restritivas, é um crítico feroz da educação progressista nas escolas e universidades (teoria crítica da raça e estudos de género), defende a família tradicional americana, opondo-se ao aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, e enfatiza que Hollywood é uma indústria que destrói os “bons velhos costumes” americanos – refletem uma mudança profunda na identidade e nas prioridades do Partido Republicano, levantando questões sobre o futuro do partido e da política americana como um todo.

Tradicionalmente marcado pela defesa do livre mercado, da intervenção militar no exterior e políticas fiscais conservadoras, o Partido Republicano, através da trumpização do partido, tem direcionado a sua agenda para dimensões nacionalistas que pretendem recuperar (o imaginário) dos “happy golden days of yore” de uma classe média branca trabalhadora, com os seus hot-dogs e jogos de basebol aos domingos. Aliás, os politólogos Aurelien Mondon e Aaron Winter mostraram, em diversos trabalhos, como a concentração nesse eleitorado foi essencial para a vitória de Trump e para a confirmação do Brexit.

No entanto, se esse plano tem uma dimensão sobretudo moral, assente numa nostalgia ideológica, a forma como este tipo de políticos interpreta a democracia, por via da diluição do primado liberal, poderá colocar em causa, de forma definitiva, a vigência do republicanismo americano como o conhecemos. Isso pode acontecer através do fim da separação de poderes (nomeadamente por via do controlo do Supremo), da liberdade de opinião e de imprensa (através do financiamento e outros mecanismos de favorecimento de órgãos de comunicação alinhados com o partido) e da supressão de mecanismos de garante de direitos fundamentais (como a reversão do aborto, do casamento homossexual, ou de políticas de correção de assimetrias raciais e étnicas). Considerando as decisões tomadas nos últimos anos nos Estados Unidos, e olhando comparativamente para a realidade de países como a Hungria sob o comando de Viktor Orbán, a democracia americana atravessa a sua crise mais profunda, evidenciando sinais de transição para uma democracia iliberal, que poderá acabar com o republicanismo vigente americano e abrir a porta à era dos autoritarismos reciclados.

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Os livros de História terão muito a agradecer a Joe Biden, não sei se um dos melhores, mas, certamente, um dos mais importante presidentes da história dos Estados Unidos da América, homem que derrotou Donald Trump em 2020 – o primeiro presidente norte-americano a falhar uma reeleição desde George Bush, em 1992 –, que combateu as forças anti-democráticas que mataram no Capitólio no 6 de janeiro de 2021 e que, nos últimos quatro anos, recuperou para a Casa Branca a credibilidade e dignidade internacionais que a administração anterior tinha desbaratado totalmente.

A declaração de Joe Biden, a anunciar (e justificar) a desistência da candidatura a um segundo mandato na presidência dos Estados Unidos, representa o seu derradeiro ato de coragem e competência no cargo. “Acredito que é do melhor interesse do meu partido e do país que eu me afaste e me concentre apenas em servir como presidente durante o resto do meu mandato”, lê-se na declaração. 

A última vez que escrevi neste espaço referia como tudo mudara após o primeiro debate pela CBS News-YouGov com Donald Trump. A prestação de Biden naquele frente a frente revelou um homem de 81 anos, frágil, lento, confuso, muitas vezes perdido num discurso balbuciado, incoerente ou impercetível. As suas hipóteses passaram a ser reduzidas. Depois do tiro que arrancou a ponta da orelha direita de Donald Trump, daquele “fight, fight, fight”, de punho erguido, do candidato republicano, essa perceção multiplicou-se por mil. E, para Biden, as suas hipóteses passaram a ser nulas.

Segue-se Kamala Harris. E se é verdade que faltam pouco mais de 100 dias para as eleições de novembro, também é correto afirmar-se que uma boa decisão não tem prazo de validade. E esta, sim, é uma boa decisão.

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