Ninguém pode acusar a Xiaomi de imprevisibilidade nos lançamentos. Uma vez mais, a série topo de gama foi lançada na Europa no Mobile World Congress. E, como no ano passado, foi o lançamento mais importante da feira de Barcelona no que diz respeito a smartphones. A versão Ultra, aqui testada, é, claro, a mais desejada. Até porque a capacidade das câmaras tem sido a característica mais valorizada pelos utilizadores que procuram smartphones de topo e o Xiaomi 15 Ultra, como o antecessor, pretende conquistar o trono na fotografia. Contudo, ao debruçarmos sobre as especificações e inovações, surge a questão: terá a Xiaomi conseguido dar o salto qualitativo que os entusiastas da tecnologia e, sobretudo, da fotografia aguardavam?

Câmaras Leica, um olhar crítico

A colaboração com a Leica continua a ser o pilar central da proposta fotográfica do Xiaomi 15 Ultra. O conjunto de câmaras traseiras, proeminentemente destacado no design do dispositivo, mantém o sensor principal Sony tipo 1 polegada e 50 MP, um componente de qualidade inegável que já impressionou no modelo anterior. A grande novidade reside no novo sensor telefoto de 1/1.4 polegadas e 200 MP na câmara telefoto periscópica (zoom de 4,3x). Este aumento de resolução garante capturas com maior detalhe em distâncias focais mais longas, representando a atualização mais significativa no hardware fotográfico. Naturalmente, a resolução extra permite maiores ampliações. O que significa que, na prática, o zoom digital mantém mais qualidade em valores elevados. As outras duas câmaras, zoom de 3x e ultra grande angular) mantém as características (sensores de 50 MP). É importante destacar que só uma das quatro câmaras, a ultra grande angular, não tem estabilizador ótico.

No entanto, nem todas as mudanças foram positivas. A remoção da abertura variável da câmara principal (presente no Xiaomi 14 Ultra com opções entre f/1.6 e f/4.0) ‘cai mal’ entre os mais entusiastas da fotografia. A Xiaomi justifica esta alteração com a promessa de efeitos semelhantes através de algoritmos e processamento de imagem assistidos por inteligência artificial. Contudo, a perda da flexibilidade criativa e do efeito ‘starburst’ em fontes de luz noturnas é uma perda para os mais atentos ao detalhe. Adicionalmente, a câmara ultra grande-angular sofreu um ligeiro revés, com a abertura a passar de f/1.8 para f/2.2, o que impacta o desempenho em condições de baixa luminosidade. Aliás, é notória a diferença qualitativa entre esta câmara e as restantes.

Foto com a câmara principal num ambiente com pouca luz, usando o perfil Leica Authentic. A forma como a câmara capta as nuances de luz e mantém detalhe nas zonas mais escuras e mais expostas da imagem é verdadeiramente impressionante. O realismo e recorte são do melhor que já vimos num smartphone

Apesar destas ressalvas, a qualidade das fotografias capturadas pelo Xiaomi 15 Ultra continua a ser um dos seus pontos fortes. As imagens mantêm uma estética autêntica, menos processada que as dos seus rivais diretos como os Google Pixel. A reprodução de contraste e sombras, aliada ao efeito de profundidade natural do sensor de grande área, permite a captura de imagens impactantes sem recurso excessivo a edição pós-captura. Os perfis de cor Leica Vibrant e Leica Authentic, juntamente com os filtros de alta qualidade integrados na aplicação da câmara, enriquecem ainda mais a experiência fotográfica.

Fotos feitas durante a apresentação da série Xiaomi 15, onde é possível verificar que a objetiva equivalente a 70 mm resulta muito bem com retratos. O efeito de desfoque do fundo é realista

De outro modo, a câmara ultra grande angular fica atrás dos concorrentes diretas, mas a câmara principal e, sobretudo, a câmara de zoom são das melhores que já vimos.

O detalhe conseguido pela câmara de zoom é impressionante. Nesta foto foi usado zoom de 10x, o que significa que mais de metade da ampliação é digital

Para os entusiastas do controlo manual, o modo Pro e a possibilidade de utilizar o Photography Kit com filtros de 67 mm (vendido separadamente) continuam a ser ferramentas valiosas.

No domínio do vídeo, o Xiaomi 15 Ultra eleva a fasquia ao suportar captura de vídeo LOG ACES (Academy of Motion Picture Arts and Sciences), a par dos mais recentes iPhones Pro, tornando-o uma opção poderosa para videógrafos profissionais que preferem o sistema operativo Android. A capacidade de alternar entre todas as câmaras traseiras durante a gravação até 4 K/30 fps, com opções para 4 K/120 fps e 8 K/30 fps, demonstra a versatilidade do sistema. Sobre isto, continuamos a criticar a falta de opções para 25/50/100 fps, preferidas por muitos editores de vídeo. E também verificámos alguns problemas a usar um microfone externo através de porta USB C – falhas de som ocasionais.

No global, o sistema de câmaras do Xiaomi 15 Ultra traz ganhos significativos na qualidade e capacidade da câmara de zoom, mas com algumas decisões que penalizam os utilizadores mais avançados.

A câmara ultra grande angular é a menos conseguida do conjunto e aquela onde o 15 Ultra perde para os concorrentes mais diretos. Ainda assim, cumpre perfeitamente.

Neste vídeo é visível a capacidade de a câmara lidar com situações particularmente difíceis de luz. Note-se o realismo das cores, das sombras e dos reflexos. Bem como a amplitude dinâmica.

Chip de topo

No que concerne à velocidade de operação, o Xiaomi 15 Ultra não desilude, integrando o mais recente processador Snapdragon 8 Elite da Qualcomm. Este chip garante uma experiência de utilização fluida e sem sobressaltos, mesmo em tarefas exigentes, como jogos com gráficos no máximo. Curiosamente, os benchmarks revelaram pontuação um pouco abaixo do concorrente mais direto da Samsung, o S25 Ultra, que usa uma versão otimizada do mesmo processador.

O elevado poder de processamento é complementado por 16 GB de RAM e 512 GB de armazenamento UFS 4.1, o tipo de memória mais rápida e eficiente disponível no mercado. Não está previso que o 15 Ultra tenha outras conjugações de memória e armazenamento em Portugal.

Para garantir que este desempenho não é comprometido pelo aquecimento, o Xiaomi 15 Ultra incorpora um novo sistema de arrefecimento “IceLoop” de duplo canal. Os testes realizados demonstram a eficácia deste sistema, mantendo o dispositivo a temperaturas confortáveis mesmo após longas sessões de jogos exigentes. A tecnologia HyperCore de gestão de recursos da Xiaomi otimiza ainda mais a experiência de utilização, garantindo uma abertura e reabertura de aplicações mais rápida. A inclusão do Game Turbo permite priorizar o desempenho em jogos, silenciar notificações e outras distrações.

Qualcomm XPAN
A Xiaomi foi a primeira marca a anunciar suporte integral para a tecnologia XPAN da Qualcomm através dos novos auriculares Buds 5 Pro quando associados a um smartphone Xiaomi 15. Esta tecnologia recorre ao Wi-Fi para garantir uma ligação de maior largura de banda entre os auscultadores e o smartphone, permitindo melhorar a qualidade de som relativamente ao tradicional Bluetooth. Através do Qualcomm XPAN, é possível atingir uma definição de 24 bits e 96 KHz sem perdas. Uma das vantagens desta tecnologia é apresentar um consumo energético muito baixo e um processo de emparelhamento simplificado. Em tudo semelhantes ao Bluetooth. O XPAN também é capaz de comutar entre Bluetooth e Wi-Fi automaticamente, sem intervenção do utilizador.

Mais e melhor IA

A otimização do Snapdragon 8 Elite estende-se também às tarefas de inteligência artificial. O Xiaomi 15 Ultra integra nativamente o Google Gemini, oferecendo funcionalidades como transcrição automática de voz e criação de texto assistida por IA. No entanto, é importante notar que estas funcionalidades requerem uma ligação constante à internet para operarem corretamente. Sobre isto, a Xiaomi oferece a versão mais avançadas do Gemini, o Advanced, durante três meses.

A integração da IA está muito associada à nova versão do sistema operativo HyperOS, o 2.0, que estreia na série 15. Atenção que este SO é baseado no Android 15 (o mais recente), pelo que a compatibilidade com os serviços Google e apps para Android está asseguradíssima. Esta nova iteração do HyperOS refina a interface, introduzindo animações subtis, ecrãs de bloqueio artísticos com suporte para vídeo e melhorias visuais em aplicações como as Definições, Relógio e Calendário. A usabilidade é também aprimorada com um novo layout do controlo de volume e a possibilidade de aceder a funcionalidades adicionais através de um toque longo em elementos do painel de controlo.

Apesar destas melhorias, a interface da Xiaomi continua a apresentar algumas inconsistências e escolhas inexplicáveis, como a dificuldade em encontrar ou a ocultação de controlos fundamentais do Android (como o Extra Dim). A personalização profunda continua a ser uma característica do HyperOS, mas exige um período de adaptação para tirar o máximo partido das suas nuances.

Voltando à IA, o HyperOS 2.0 expande o conjunto de ferramentas introduzido no Xiaomi 14 Ultra, abrangendo escrita, edição de imagem e tradução. As ferramentas de escrita assistida por IA permitem resumir, rever ou alterar o estilo do texto. A aplicação de tradução AI Subtitle facilita conversas entre pessoas que falam idiomas diferentes. As ferramentas de edição de imagem (Expandir, Apagar, Céu) foram aprimoradas e ganharam novas funcionalidades como Melhorar e Remover Reflexos (embora esta última não tenha funcionado corretamente nos testes). A funcionalidade Apagar Pro utiliza um modelo maior para melhores resultados, mas requer uma ligação à internet. De facto, a maioria das funcionalidades de IA do Xiaomi 15 Ultra depende de processamento fora do dispositivo.

Apesar de um aumento para seis anos de atualizações de segurança, a empresa ‘apenas’ garante quatro anos de atualizações do sistema operativo. Este compromisso fica aquém dos sete anos oferecidos por rivais como a Samsung e a Google para os seus dispositivos de topo, prejudicando a proposta de valor a longo prazo de um equipamento com um preço elevado.

Atraente e diferenciador

O Xiaomi 15 Ultra mantém a estética que a marca tem cultivado nas últimas gerações da sua linha Ultra, com uma frente em vidro curvo, estrutura de metal boleada e um grande módulo de câmaras circular. No entanto, para acomodar o novo sensor telefoto de maiores dimensões, o design do módulo de câmaras sofreu alterações, resultando numa disposição assimétrica das lentes. Embora visualmente menos simétrico que o seu antecessor, este novo design confere ao dispositivo uma aparência mais utilitária que alguns utilizadores poderão apreciar.

Além das cores preto e branco, o Xiaomi 15 Ultra apresenta uma nova opção em prateado, que evoca a identidade visual da icónica Leica M3. A parte traseira do telefone é revestida em fibra de vidro de “qualidade aeroespacial”, com uma secção em pele sintética preta que contrasta com o acabamento prateado. A pele sintética oferece uma aderência adicional e demonstrou boa resistência ao desgaste nos testes.

O Xiaomi 15 Ultra mantém a certificação IP68 para resistência à água e poeira. No entanto, tecnicamente, fica atrás de alguns rivais que já adotaram a certificação IP69. A proteção do ecrã é assegurada pelo Xiaomi Shield Glass 2.0, que a marca afirma ser 16 vezes mais resistente a quedas do que o Gorilla Glass Victus presente no Xiaomi 13 Ultra. O módulo de câmaras traseiro é protegido por Gorilla Glass 7i, oferecendo boa resistência a riscos.

O ecrã do Xiaomi 15 Ultra é um dos seus pontos fortes, com um brilho máximo impressionante de 3200 nits, superando a maioria dos seus rivais diretos. A experiência de visualização é excelente, com resolução elevada, taxa de atualização dinâmica entre 1 e 120Hz e uma densidade de píxeis de 522 ppi. O sensor de impressões digitais ultrassónico integrado no ecrã é mais rápido e fiável que a solução ótica anterior. O sistema de som, apesar de apresentar uma configuração assimétrica dos altifalantes estéreo, oferece uma separação e clareza de som notáveis na maior parte da sua gama de volume. O suporte a Dolby Atmos com equalizadores e áudio espacial também contribui para uma experiência multimédia imersiva.

Bateria cresceu

A bateria do Xiaomi 15 Ultra apresenta uma capacidade de 5410mAh na versão internacional (inferior aos 6000mAh da versão chinesa, presumivelmente devido a regulamentações da UE). Apesar desta redução, a tecnologia de bateria Si-C Surge da Xiaomi permite uma maior capacidade sem aumentar o volume do dispositivos.

A autonomia real pode chegar aos dois dias de utilização numa utilização contida. Mas o mais habitual será um dia completo. Não é o melhor que já vimos, mas fica lá perto e vence, por exemplo, o S25 Ultra. A potência de carregamento é ainda mais impressionante, atingindo os 90 watts com cabo e os 80 watts sem fios – isto se encontrar um carregador wireless capaz desta potência. Os testes de carregamento revelaram podemos carregar a 100% em menos de uma hora, mas com um aumento notório da temperatura durante o processo. Para a maioria dos utilizadores, o modo de carregamento padrão deverá ser suficientemente rápido e provavelmente contribuirá para uma maior longevidade da bateria.

Veredicto

O Xiaomi 15 Ultra melhora, em muitos aspetos, o seu já excelente antecessor. O foco na fotografia continua a ser grande trunfo, com um sistema de câmaras versátil e capaz de capturar imagens de qualidade excecional. Contudo, aqueles que esperavam uma revolução fotográfica poderão sentir que a Xiaomi deu um passo firme, mas talvez não tão surpreendente como seria desejável no competitivo universo dos ultra-premium.

O desempenho proporcionado pelo Snapdragon 8 Elite é inegável, garantindo uma experiência de utilização fluida e potente. O HyperOS 2.0 traz melhorias na interface e novas funcionalidades de inteligência artificial, mas mantém algumas particularidades.

O design e a qualidade de construção continuam a ser pontos fortes, com materiais premium e atenção aos detalhes. O ecrã impressiona pelo brilho e qualidade de imagem.

Em suma, para quem procura um smartphone com um desempenho de topo e uma experiência fotográfica de alto nível, o Xiaomi 15 Ultra é, sem dúvida, uma opção a considerar.

Tome Nota
Xiaomi 15 Ultra – €1499
xiaomistore.pt

BENCHMARKS PCMark 10 Extended: 9830,Essenciais 10455 • Produtividade: 11239 • Criação Conteúdo Digital 11794 •Jogos 18207 • Wild Life: 50349 • Solar Bay: 39261 • Night Raid: 46500 l Final Fantasy XV (4K, High): 3912 • Cinebench R23: CPU Single 399/ Multi14662 • Autonomia: (PcMark 10 Modern Office, Modo desempenho) 7h31m

Construção Excelente
Câmaras Muito bom
Autonomia Muito bom
Ecrã Excelente

Características Ecrã AMOLED 6,73” (1440×3200, 120 Hz, HDR10+) ○ CPU Snapdragon 8 Elite (8 núcleos), GPU Adreno 830 ○ 16 GB de RAM e 512 GB de armaz. ○ Câmaras 50 MP (23mm, f/1.6), 50 MP zoom 3x, 200 MP zoom 4,3x, 50 MP ultrawide, 32 MP selfie ○ Bateria 5410 mAh ○ USB C, WiFi 7, 5G ○ Android 15, HyperOS 2.0 ○ 161,3×75,3×9,4 mm ○ 229 gramas

Desempenho: 5
Características: 5
Qualidade/preço: 3

Global: 4,3

Na passada segunda-feira, a rede social X – anteriormente conhecida por Twitter – registou algumas dificuldades de funcionamento, provocadas por um “ciberataque massivo”. “Houve (ainda há) um ciberataque maciço contra o X”, escreveu Elon Musk, dono da plataforma. O também dono da Tesla e da Space X e responsável nomeado por Donald Trump pelo Departamento para Eficiência Governamental (DOGE) dos EUA, apontou a culpa do ataque à Ucrânia, dizendo que a origem IP do ataque estava ligada ao país. “Somos atacados todos os dias, mas isto foi feito com muitos recursos. Ou foi um grupo grande e coordenado ou há um país envolvido”, acrescentou.

Numa entrevista à Fox News, horas mais tarde, Musk voltou a afirmar que a Ucrânia esteve na origem do ciberataque, sem, no entanto, dar qualquer prova da sua acusação. “Não temos a certeza do que aconteceu exatamente, mas houve um ataque cibernético para tentar derrubar o sistema X com endereços IP na área da Ucrânia”, disse.

O verdadeiro culpado pelo ciberataque terá sido, no entanto, o grupo hacker pró-palestiniano Dark Storm Team, que reclamou autoria do mesmo nas redes sociais. “O Twitter foi retirado do ar pela Dark Storm Team”, pode ler-se numa publicação no grupo na mesma plataforma social, acompanhada de uma captura de ecrã que mostra problemas de ligação numa longa lista de países.

De acordo com a empresa de segurança cibernética Check Point, o grupo de hackers, fundado em 2023, é conhecido por orquestrar ciberataques contra governos e organizações conhecidas por apoiarem Israel e já tinha estado envolvido em trabalhos semelhantes em hospitais israelitas e aeroportos norte-americanos. “Eles tendem a procurar ataques de alto perfil”, explica Muhammad Yahya Patel, engenheiro de segurança da Check Point, à Sky News. “O seu principal objetivo é causar a interrupção de serviços, em grande parte relacionados com ligações ao governo e à NATO”, acrescentou.

Embora deixe muito claras as suas posições políticas, o grupo não é totalmente motivado por essas convicções – tendo sido contratados para realizar outros serviços no passado a troca de lucro – e não está ligado à Ucrânia, como Musk quis fazer entender. “De acordo com o que Elon Musk disse sobre o ataque informático à plataforma X, a sua origem é a Ucrânia. É uma acusação sem qualquer prova e não temos qualquer relação com a Ucrânia”, explicou o grupo.

Analistas da Check Point acreditam que este tenha sido um ataque DoS, ou seja, quando existe a sobrecarrega de um determinado site através de várias tentativas de acesso. “Parece um ataque DDoS geral proveniente de diferentes locais, diferentes endereços IP”, acrescentam.

A iServices, líder em reparações, vai ter uma campanha nos meses de março e abril pensada para aos clientes que preferem reparar os seus equipamentos em vez de comprarem novos. Por cada reparação realizada numa loja iServices, os clientes com Cartão Cliente recebem cinco euros 5€ que equivalem a 500 pontos) para utilizarem numa compra futura.

O objetivo da marca é incentivar os clientes a optarem por reparações, estando comprometida com a sustentabilidade, a iServices trabalha também para motivar quem os visita a escolher opções mais ecologicamente responsáveis. As reparações prolongam a vida útil dos equipamentos, o que se traduz numa redução do desperdício eletrónico e até mesmo numa poupança de recursos naturais. Além disso, a reparação é uma alternativa mais económica para o consumidor e, na iServices, é feita por técnicos especializados, com garantia e na hora.

A campanha abrange todas as reparações e quem ainda não se registou no Cartão Cliente iServices tem agora mais uma razão para o fazer, é um processo simples e rápido, tudo é tratado online e o próprio cartão também é 100% digital – portanto, não vai ocupar espaço na carteira. Todas as lojas iServices, incluindo as de Espanha, França e Bélgica, vão ter a promoção em vigor durante os meses de março e abril.

Como funciona o Cartão Cliente iServices?
O Cartão Cliente iServices é 100% digital e permite aos clientes da marca acumularem pontos para trocarem por descontos em compras e serviços futuros. Cada 1€ que gastem, vale 1 ponto em Cartão Cliente e 100 pontos equivalem a 1€ que podem descontar. A marca oferece 100 pontos aquando da inscrição e 1000 pontos no aniversário do cliente. Além disso, é bastante comum realizar estas campanhas que permitem acumular pontos extra para descontar em futuras compras de produtos ou serviços.

Por imperativos legais, só daqui a 30 anos se poderá saber ao pormenor o que se passou no Conselho de Estado que vai acontecer esta quinta-feira, às 15h, no Palácio de Belém, com  atual crise política em discussão. Mas se havia algum suspense no Conselho que se reuniu, em novembro de 2023, depois da demissão de António Costa – não era certo se se optaria por novas eleições ou pela continuação do governo de maioria absoluta com outro primeiro-ministro -, hoje tudo parece estar decidido à partida, e a reunião acontece já em clima de pré-campanha eleitoral. O contraste entre um Presidente da República ultra-intreventivo em 2023 e praticamente invisível nesta crise governamental 2025 é óbvio ( leia aqui sobre a relação fria entre Marcelo e Montenegro).

Era preciso tudo isto? Acredito que a maioria dos portugueses, mais ou menos próximos do atual Governo da AD, terá tendência para responder “não”, sem ter que pensar muito. Mas aqui estamos nós a caminho de umas eleições legislativas que ninguém previu ou pediu.

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Quando esta revista chegar às mãos do leitor, o Presidente da República já terá ouvido os partidos políticos, seguindo-se, esta quinta-feira, a reunião com o Conselho de Estado. A última vez que tinha ouvido os conselheiros, numa situação análoga – mas, como veremos, não idêntica –, depois da demissão de António Costa, estes pronunciaram-se, maioritariamente, pela não convocação de eleições e pela indicação, por parte do PS, de uma segunda personalidade, que assumisse a chefia do governo. Marcelo contrariou o Conselho, dissolveu a Assembleia da República e marcou o ato eleitoral de 10 de março de 2024. Esse precedente pesa. E Marcelo deverá, agora, seguir o mesmo critério. Todavia, ouvido o Conselho de Estado, poderia, ainda, fazer uma tentativa para evitar eleições, pedindo ao PSD que apresentasse um novo governo. A diferença é que, em 2023, António Costa tinha-se demitido – algo que Montenegro não fez. Esta solução permitiria ao País poupar essa chamada às urnas e, em teoria, talvez funcionasse: o PS tem reiterado que não apresentaria uma moção de censura, o que, a manter o critério, permitiria que um tal governo fosse viabilizado – avançando, ao mesmo tempo, bastante mais cedo, a famosa comissão parlamentar de inquérito sobre a conduta do primeiro-ministro, no caso da empresa Spinumviva. Ao mesmo tempo, com um novo governo, Montenegro aproveitaria para fazer a desejada “remodelação”. E Marcelo teria tido um papel realmente relevante. Toda a gente salvaria a face.

Infelizmente, a animosidade entre os partidos e a rutura dos canais de comunicação entre PS e PSD, bem como a fragilidade da figura do primeiro-ministro, impedem esta saída. Montenegro, agora, já só quer ser reabilitado pelo voto popular. E Pedro Nuno Santos vê uma oportunidade de afirmar a sua liderança, se ganhar (venha ou não a conseguir formar governo). Mas estes são males menores, para ambos os líderes. Na verdade, querer, querer… ninguém quer eleições. Mesmo o Chega tem um problema: se André Ventura fez toda a campanha, em 2024, afirmando que iria haver um governo de direita em Portugal, e que esse governo só seria possível com o Chega, desta vez ficará a bramar (ainda) mais sozinho. Essa narrativa acabou. Depois de ter dito o que disse de Luís Montenegro, tendo chegado ao cúmulo de o comparar com José Sócrates, com que cara é que vai prometer ao eleitorado um governo de direita, encostando-se ao PSD e governando ao lado do “novo Sócrates”?… André Ventura, por muito que confie no seu resultado eleitoral, fica bastante mais longe do poder. Agora, só lá vai com maioria absoluta…

Ao final de terça-feira, dia em que a moção de confiança foi rejeitada e o Governo caiu (votos contra de PS, Chega, BE, Livre, PCP e PAN e a favor de PSD, IL e CDS), ficou bem claro que o principal argumento de socialistas e sociais-democratas é atribuir ao adversário a culpa pela crise política. À hora em que escrevemos, terça-feira à noite, Montenegro está a dizer às televisões: “Tentámos tudo, até ao último minuto, mas o PS manteve-se intransigente. Quis levar o País para eleições.” Na verdade, os vários golpes de teatro do debate, com pseudotentativas de negociação em direto e o PSD a pedir uma CPI num prazo menor, como condição para retirar a moção de confiança, foram apenas números, de mau prestidigitador, construídos para que o PS não tivesse outro remédio senão recusar conversas. Se isto fosse sincero, o PSD tê-lo-ia tentado, com calma, por estes dias e antes do debate. A própria suspensão da sessão, pedida, à última hora, pelo CDS, antes da votação da moção, para mais nada serviu senão para completar a cena teatral e, talvez, para que os deputados assistissem, no recato dos gabinetes, à segunda parte do Barcelona-Benfica…

Para terminar, é preciso desmontar um argumento enganador. O Governo pediu ao Parlamento um sinal de “confiança” para clarificar a situação. Sucede que, como bem explicou o constitucionalista Vital Moreira, o Governo não depende da confiança da Assembleia. Depende, isso sim, da sua “não desconfiança”. Por isso, chumbar uma moção de censura nada tem que ver com viabilizar uma moção de confiança. Não é apenas semântica. Se assim não fosse, não haveria governos minoritários – evidentemente que um governo sem o apoio de uma bancada maioritária nunca tem a confiança do Parlamento, mas, quanto muito, a sua “não rejeição”. A manobra de Montenegro, bastante mal explicada, visa, simplesmente, evitar uma CPI antes de eleições (não se ralando muito se ela decorrer depois). É que se as ganhar, tem, ao menos, a força do beneplácito popular. Se as perder, também já não interessa nada.

Golpe de vista

A boa notícia da semana

Ao ganhar o contrato do fabrico do novo modelo elétrico da Volkswagen, a Autoeuropa consegue um seguro de vida por mais uns muitos e bons anos. Num momento de refluxo e de crise, com fábricas a fechar em toda a Europa, a marca alemã continua a apostar na sua unidade portuguesa, permitindo, ao mesmo tempo, que inúmeras empresas dependentes da fábrica em Palmela respirem de alívio. Estas coisas, por vezes, são mais importantes do que haver ou não haver um governo estável…

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Havia uma maioria absoluta de um partido que sustentava um governo. Poucos meses depois das eleições, o Ministério Público anunciou publicamente que tinha sérias dúvidas sobre a conduta do anterior primeiro-ministro. Sendo, na prática, impossível que o mais importante político governe quando o detentor da ação penal diz à comunidade tal coisa, António Costa teve de se demitir.

O Presidente da República, constitucionalista emérito, esqueceu-se de que as pessoas não votam para eleger um primeiro-ministro, mas sim deputados. Assim sendo, não perguntou ao partido detentor da confiança da maioria absoluta dos portugueses se tinha uma alternativa para chefiar o governo e conduziu o País para eleições.

Um ano e meio depois, o Ministério Público nada descobriu sobre António Costa e já toda a gente percebeu que nada havia para descobrir.

Resumindo, a incompetência (sejamos benévolos) do Ministério Público e a interpretação, digamos, criativa da Constituição por Marcelo Rebelo de Sousa levaram a uma crise política perfeitamente evitável e trouxeram-nos para um pântano em que estamos cada vez mais enterrados.

Claro que não é por causa do Ministério Público ou do Presidente da República que temos agora um primeiro-ministro que não percebeu que não podia ser ao mesmo tempo empresário e governante e que parece ter dificuldades em entender a dimensão ética necessária ao desempenho do cargo.

Não é por causa deles que um primeiro-ministro, para evitar uma comissão de inquérito que visaria o esclarecimento das mais do que fundadas dúvidas sobre o seu comportamento ético e legal, atira o País para eleições num momento particularmente complicado para Portugal e para o mundo.

E que fique claro, só há um responsável pela atual crise: Luís Montenegro. É ele que por razões meramente pessoais propôs uma moção de confiança. Não é por causa do País, das políticas do Governo, de bloqueios à governação (que não existiram), é só e apenas por causa da pessoa Luís Montenegro e das suas condutas fora do plano governamental. É o cúmulo da utilização de um instrumento político para benefício próprio.

O Ministério Público e o Presidente da República não têm culpa de que um primeiro-ministro ache que ganhar eleições o iliba de qualquer falha ética ou legal. Que ele não saiba que as eleições são um instrumento de escolha, mas que os seus resultados nada podem contra a lei, a Constituição e a mais básica decência.

Não, não têm culpa de que Montenegro siga a cartilha de Orbán e Trump.

Também não é da responsabilidade de Marcelo Rebelo de Sousa nem do Ministério Público que os ministros façam de advogados de defesa do primeiro-ministro e se esqueçam de que estão no Governo para governar. O corrupio de ministros nas televisões para falar de tudo menos das suas responsabilidades diz muito da forma como encaram a sua tarefa.

Não é de certeza culpa deles de que o PSD se tenha transformado num rebanho de funcionários partidários. Naquela agência de emprego, as pessoas trocam as suas opiniões por cargos. No partido que era um símbolo de liberdade, de pluralidade de visões (que até o levava a uma certa anarquia ideológica), agora vigora a videirice, a anemia e o medo. Tem sido deprimente ouvir os desabafos particulares de militantes para pouco depois os ver publicamente a dizer exatamente o contrário.

No PSD que conheci já teriam aparecido militantes mais e menos relevantes a denunciar toda esta situação. Já teria visto gente a pedir a demissão de Montenegro por evidentes falhas éticas, já haveria propostas para congressos extraordinários. Mesmo que nada depois acontecesse, haveria gente corajosa e com vontade própria. E que dizer de ex-líderes como Rio, Ferreira Leite ou Cavaco Silva, gente sempre muito vocal sobre questões éticas, será que se esqueceram da lição de Sá Carneiro sobre o partido e o País?

A réstia de decência e coragem, como de costume, veio de Jorge Moreira da Silva. Apesar de estar limitado por ser secretário-geral adjunto da ONU, foi o único que alertou para a nudez do rei, e não foi a primeira vez.

Muito menos será culpa do Presidente da República e do Ministério Público que o presidente da Assembleia da República não tenha a mais básica noção do cargo que ocupa e se ponha a tomar posição típica de cacique local em plena crise política.

Também não serão eles que criaram um ambiente de barricada à política que impede o diálogo entre os partidos pilares do nosso regime. E logo num período em que, por causa da situação internacional, serão necessários consensos alargados.

Enquanto o Ministério Público decide que governos devem ou não governar, o Presidente da República transformou-se em refém dos erros que cometeu. Porém, não é só por causa deles que a Justiça está como está, que vemos o Governo em falência ética, os principais partidos transformados em agências de emprego, a Assembleia da República numa espécie de tasca e a Presidência num verbo de encher.

Mais do que uma crise política, vivemos uma crise institucional séria. A maior desde o 25 de Abril.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

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Parece paradoxal e, provavelmente, é mesmo paradoxal. Em muitas matérias, ao longo dos anos, a União Europeia transformou-se num emaranhado difícil de desemaranhar. Mas também é verdade que, recentemente, temos tido exemplos que provam o contrário; que, na hora H, a Europa tem sabido reagir. Aconteceu na resposta dada à pandemia de Covid-19, decretada pela Organização Mundial da Saúde há cinco anos. E volta a acontecer agora, um mês e poucos dias após a tomada de posse de Donald Trump e o fim da aliança transatlântica.

Durante três anos, a Europa não se preparou para combater a ameaça russa, preferindo o conveniente apoio americano à resistência ucraniana. Aqui chegados, o tempo urge e, como diz o povo, é tudo para ontem. E é dos livros: quem não se prepara com antecedência acaba a remediar a situação e, com bastante probabilidade, a gastar mais dinheiro. Como disse a primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen: “Temos de rearmar a Europa. Gastar, gastar, gastar na defesa e na dissuasão.”

A reação do eixo franco-alemão não se fez esperar. Emmanuel Macron, que em tempos vaticinou de facto o fim da NATO, explicou que continua a contar com os EUA, mas também partilhou dúvidas quanto à reciprocidade do sentimento do lado de lá do Atlântico. O Presidente francês tem revelado fibra e, sobretudo, tem mostrado que está disposto a pôr o guarda-chuva nuclear ao serviço da segurança europeia. Merci bien, o futuro dos europeus agradece. O próximo chanceler alemão, Friedrich Merz, já tinha argumentado que a Europa deixara de contar com o célebre artigo 5º, segundo o qual um ataque a um membro da NATO é um ataque a todos os seus membros. E também negociou com o SPD um pacote de 500 mil milhões de euros em defesa e infraestruturas nos próximos quatro anos.

No último fim de semana, três dias depois de os líderes do Conselho Europeu terem aprovado o plano Rearmar a Europa, que prevê a mobilização de 800 mil milhões de euros para a defesa, Ursula von der Leyen voltou a sublinhar que “nada está fora de questão”, incluindo a emissão de eurobonds, no que toca a possibilidades de financiamento para que os Estados-membros possam aumentar a sua capacidade militar: “Estou aberta a tudo quanto for necessário.” Numa conferência de imprensa com o objetivo de fazer o balanço dos primeiros cem dias do seu segundo mandato, a presidente da Comissão Europeia alertou para a necessidade de um novo sentido de urgência. Sem nunca se referir a Donald Trump, falou sem rodeios diplomáticos, foi clara e assertiva: “Os nossos valores europeus, democracia, liberdade, Estado de direito estão sob ameaça.” “Vemos como a soberania, mas também os compromissos mais sólidos, são questionados. Tudo se tornou transacional”, acrescentou.

No entanto, Ursula von der Leyen não respondeu à proposta de ajuda militar de curto prazo da representante da diplomacia europeia, Kaja Kallas. A estoniana pediu aos Estados-membros que acelerassem esforços para apoiar a Ucrânia em 2025, entregando munições, drones e sistemas de defesa aérea “o mais rapidamente possível”. Na rede social X, Kallas escreveu que “Putin mostra não ter qualquer interesse na paz”: “Os mísseis russos continuam a chover implacavelmente sobre a Ucrânia, trazendo mais morte e destruição.”

No nosso cantinho à beira-mar plantado, já poucos sabem quem foram os Vencidos da Vida e, por isso, perdoe-se-me o final melancólico: não consigo deixar de assinalar a coincidência de, enquanto a Europa se prepara para a guerra, Portugal se preparar para uma série de miniciclos políticos. Independentemente dos casos que os motivaram, há razões que a própria razão desconhece. Os europeus são o alvo principal desta nova ordem mundial, o Hino Nacional exalta-nos e nem isso nos desperta na hora H: às armas, às armas!

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Foi solene, pesado e amargo o voto que derrubou o Governo. Ninguém saiu a rir, ninguém bateu palmas, ninguém se mostrou triunfante. Não, nada disso aconteceu na Assembleia da República. Na nossa democracia, foi apenas a segunda vez que um Governo caiu com a reprovação de uma moção de confiança, e essa raridade fez-se sentir em todos os deputados.

E o que se sente no dia seguinte? Como está a ser este dia? Azedo, ácido e avinagrado. Como tinha de ser, convenhamos. Não era este o momento para derrubar o Governo, no meio da confusão global em que estamos mergulhados, nem a matéria em disputa se afigurava inapelável. O dia é sombrio.

Sombrio no tempo e sombrio na política. Temos dois meses até às eleições, e este período será mais do que suficiente para que o caso da antiga empresa de Luís Montenegro continue a ser martelado diariamente. Já percebemos que o tema não se deu por finado. Não morreu de morte natural.

Esta será a campanha mais personalizada e demolidora que alguma vez se viu em Portugal. É necessário muito cabedal para a aguentar, e isso não parece faltar ao PM e à AD. Mas não vai ser bonito nem elegante, e muito menos interessante para o nosso futuro coletivo.

Que dia. Que dias.

Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.


Guterres e Mário Soares


Figura tutelar

Quando, em 1995, o PS venceu as eleições e António Guterres foi nomeado primeiro-ministro, o clima institucional, que se tinha vindo a degradar entre o Presidente Mário Soares e o primeiro-ministro Cavaco Silva, desanuviou-se tão depressa como um céu limpo após um forte aguaceiro. Dois líderes socialistas já tinham “torrado”, com Soares em Belém, sem que nenhum deles, Vítor Constâncio ou Jorge Sampaio, alguma vez tenham beneficiado do apoio do “Velho Leão”. Os três, Guterres incluído, tinham conspirado contra ele em célebres reuniões do chamado “ex-secretariado” do PS, no rescaldo das feridas abertas com as eleições presidenciais de 1980. Já em Belém, Soares só desajudou: no fundo, gostava que a imprensa o considerasse o “verdadeiro líder da oposição” e o seu patrocínio ao congresso Portugal, que Futuro?, em maio de 1994, numa iniciativa de contestação ao cavaquismo, deixava o líder do PS numa posição secundária. Só com a organização dos Estados Gerais do PS, a um ano das eleições, Guterres conseguiria a sua carta de alforria. Mas, nas suas memórias jornalísticas, o antigo diretor do Expresso, José António Saraiva, recentemente falecido, recorda um almoço com Soares em que o socialista solta um palavrão e, depois, explica: “Estava a dizer mal do Guterres, já mordi a língua…”

Guterres e Sampaio

Foto: António Xavier


O episódio Vara

Jorge Sampaio e António Guterres, mantinham relações frias desde que, em 1992, o segundo havia arrebatado ao primeiro a liderança do PS, depois de uma campanha interna violenta. No período em que coabitaram, mantiveram, genericamente, relações muito cordiais, mas houve um episódio de alta tensão entre ambos, que resultou na demissão de Armando Vara, ministro da Administração Interna (que, pouco tempo antes, substituíra Fernando Gomes). Enquanto secretário de Estado de Gomes, Vara criara a Fundação para a Prevenção Rodoviária, entidade privada destinada a gerir dinheiros públicos, para promover campanhas de prevenção rodoviária. A operação coloca as maiores dúvidas relativamente à sua transparência. Guterres é arrasado, no Parlamento, e é chamado a Belém. No dia seguinte, Vara é forçado a demitir-se (arrastando, com essa demissão, o novo secretário de Estado, Luís Patrão, amigo pessoal de Guterres). Na tensa reunião, em Belém, Sampaio foi bem claro com o primeiro-ministro: “Se não houver demissões, não vou ficar calado!” E pede ao assessor e constitucionalista Jorge Novais que prepare uma declaração para, se necessário, ser lida a seguir à audiência com Guterres, para pressionar a demissão de Armando Vara. Já não foi preciso.

Cavaco e Passos Coelho

Foto: Álvaro Isidoro


Espiral recessiva

Como antigo líder da JSD, Pedro Passos Coelho fora sempre uma pedra no sapato do então primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva. Desalinhado com o cavaquismo, reivindicativo relativamente às políticas de Juventude, crítico do governo no caso das propinas, Passos Coelho era persona non grata – mas estava destinado a ser o único primeiro-ministro do PSD durante o consulado de Cavaco Silva. Ainda por cima, no executivo pontificava também o líder do CDS, Paulo Portas, que, na qualidade de antigo diretor do semanário O Independente, contribuíra, com as suas manchetes, para a queda do cavaquismo. A coabitação decorreu sem atritos de maior, mas com alguns momentos de tensão pelo meio, sobretudo quando o PR começou a criticar o excesso de austeridade e falou, numa mensagem de Ano Novo, da “espiral recessiva” que estava a abater-se sobre o País, um discurso muito mal recebido pelo governo. No cômputo geral, Passos levou sempre vantagem sobre Cavaco: quando, na crise do “Irrevogável”, o PR tentou impor um acordo entre o PSD e o PS, o primeiro-ministro resolveu a coisa à sua maneira. E, mais tarde, quando o “pensionista Cavaco” quis colar-se ao descontentamento popular, queixando-se de que a reforma mal dava para as suas despesas, Passos nem precisou de dizer nada, de tal forma as declarações do Presidente se viraram contra ele.