“Um Primeiro-Ministro otimista e confiante com o amparo da sua maioria absoluta, uma ministra Temida e tremida, um coro de críticas da oposição.” Foi assim o regresso de António Costa ao Parlamento para ser inquirido, oito meses depois do último debate de política geral e com três meses de assuntos nacionais por discutir, uma tarde em que o tema quente foi o estado preocupante do SNS e das urgências hospitalares. “Ao mesmo tempo, a diretora-geral da saúde, Graça Freitas, apresentava o plano de contingência para o verão e dizia aos microfones que ‘o pior que nos pode acontecer é termos o azar de adoecer em agosto’. Inspirando muita confiança nas soluções encontradas, portanto. Se isto não é o caos, não se sabe bem o que será…”, arranca Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, no Olho Vivo desta semana.
Para Filipe Luís, “Marta Temido perdeu o peso político que ganhou com a pandemia. Os velhos problemas do SNS regressaram, ainda mais agudizados, e longe vai o tempo em que entrou triunfante, no congresso do PS do verão passado, como possível sucessora de António Costa”. O editor executivo da VISÃO sublinha que no debate no Parlamento, “Costa nunca defendeu explicitamente a sua ministra: defendeu, isso sim, o SNS, a sua capacidade de resposta e resiliência”. Mas longe vai também, o tempo em que dizia que não “podia ter melhor ministro”, como aconteceu, num momento de ainda maior stresse, com Eduardo Cabrita. “Pode significar duas coisas: que Costa aprendeu que há limites para defender o indefensável e que Temido tem menos peso no PS do que tinham anteriores ministros que tenham passado por idênticas dificuldades”, diz Filipe Luís. Mafalda Anjos concorda: “António Costa fez uma defesa apenas formal, ao dizer que a responsabilidade de tudo o que ocorre no Governo é dele e que quem escolhe os membros do Governo é o Primeiro-Ministro. Apontou falhas e problemas estruturais, elencou as reformas na calha, mas não ofereceu respostas para o essencial: porque é que os médicos estão a fugir do SNS e ficam vagas de especialistas por preencher? Aí está o busilis da questão.”
O ministro das Finanças argumentou que os problemas do SNS não se devem a falta de dinheiro, afastando responsabilidades financeiras. “Os problemas não se resolvem atirando simplesmente mais dinheiro. Aliás, o SNS tem recebido mais dinheiro e os seus problemas estruturais não parecem estar a aliviar-se. É preciso que esse dinheiro seja bem gerido”, aponta o jornalista Nuno Aguiar. “Mas se achamos que parte do problema é incapacidade de reter e atrair médicos para o SNS porque o privado paga melhor e dá-lhes melhores condições, isso resolve-se pagando mais a esses profissionais e valorizando as suas carreiras.” O SNS arrisca estar a percorrer um caminho intermédio que resultará na sua progressiva degradação. “Por incapacidade financeira ou falta de vontade, não é feito o investimento necessário no SNS, ao mesmo tempo que não se quer abrir a porta para uma intervenção mais forte dos privados. O resultado é uma degradação progressiva, em que o SNS acabará por ser usado apenas por quem não tem outra opção”, refere Nuno Aguiar.
O processo de adesão da Ucrânia na União Europeia é outro tema em análise no programa de comentário político e económico da VISÃO. Para Mafalda Anjos, “é legítimo que António Costa sublinhe que não são criadas falsas expectativas e frustrações para o povo ucraniano neste processo de adesão, que não pode ter uma fast track”. E acrescenta: ” A Ucrânia tem legítimas expectativas, mas tem um longo caminho a percorrer para cumprir requisitos de adesão à União Europeia, já com questões para resolver coma Hungria e a Polónia. Já antes da guerra era uma democracia jovem, com grandes problemas internos e de corrupção.”
“António Costa é o líder europeu com a posição mais sensata sobre a adesão da Ucrânia à União Europeia. E deve defender essa posição, no Conselho Europeu. Obviamente, deve vincar bem que não será Portugal a colocar qualquer entrave à adesão da Ucrânia, mas deve deixar registado, para memória futura, os seus avisos à navegação. Ser uma espécie de “grilo falante”, uma consciência crítica, na reunião do conselho”, entende Filipe Luís.

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