O fenómeno negacionista não nasceu com a pandemia, embora por cá o seu aparecimento tenha coincidido com a chegada do “bicho”.
Por esse mundo fora, há sempre um grupo de iluminados que, por ignorância ou má fé, decidem descrer no óbvio, no documentado, no facilmente comprovado.
Se limitassem as suas opiniões aos botões das próprias camisas, bem… era uma questão de fé e, a mais das vezes, de profunda burrice.
O problema é quando decidem partilhar essas alarvices em público e em alta voz!
E se lhes acrescentarmos a característica de figura pública ou de algum protagonismo, então o caso passa de ridículo a dramático!
Os movimentos neo-nazis na Alemanha e na Áustria afirmam a pé junto que o Holocausto mais não é que uma invenção, com fins judaicos inconfessáveis. De pouco serve mostrar-lhes Auschwitz, Bacau ou qualquer outro campo de extermínio. Para eles não passaram de campos de trabalho de prisioneiros de guerra!
Com a pandemia e face às medidas tomadas, houve quem se arvorasse em virologista e clamasse que tudo não passa duma bem urdida conspiração das farmacêuticas apoiadas pelos governos, cujos únicos interesses são, por um lado, o lucro e, por outro, o controle popular.
Teria dificuldade em aceitar uma declaração deste teor dum jovem que não tivesse vivido os tempos da ditadura. À força de os querermos poupar aos relatos do que foi um país amordaçado, cinzento, sem liberdade de imprensa, com músicas e livros proibidos, com prisões arbitrárias, sem liberdade de expressão, sem diversidade de pensamento político livremente expresso… Quisemos poupá-los e quisemos deixar para trás, esquecer!
Com negacionistas é impossível discutir! Não há argumento racional, prova evidente que não desmintam estapafurdiamente!
Pergunto-me se a questão estará numa necessidade de se autopromoverem ou se é muito simplesmente uma deficiência cognitiva séria.
Pois se até há gente que afirma a pés juntos que a Terra é plana, santo deus!
Por cá assistimos nos últimos tempos à negação do fascismo.
Desconheço se tão ilustre cabeça se refere ao fascismo em geral ou apenas ao que, segundo ele, não existiu em Portugal!
Teria dificuldade em aceitar uma declaração deste teor dum jovem que não tivesse vivido os tempos da ditadura. À força de os querermos poupar aos relatos do que foi um país amordaçado, cinzento, sem liberdade de imprensa, com músicas e livros proibidos, com prisões arbitrárias, sem liberdade de expressão, sem diversidade de pensamento político livremente expresso… Quisemos poupá-los e quisemos deixar para trás, esquecer!
E errámos!
A nossa juventude tem que saber que, há menos de 50 anos, éramos um povo de pé descalço, em que as mulheres não podiam assinar contratos, ter passaporte ou trabalhar sem o consentimento do marido ou do pai. Um país em que a mortalidade infantil era tão grande que era muito normal, na mesma família, a criança seguinte tomar o nome da criança morta. Um país entregue a meia dúzia de famílias que o tratavam como tratavam as suas próprias quintas: explorando-o! Um país em que 70% da população tinha como instrução não a mais que as primeiras letras e o número de analfabetos era o maior da Europa. Um país sem esperança que mandava os seus jovens morrerem numa guerra que não queriam, em locais que não conheciam e por razões que lhes eram alheias.
Esta é a História que é urgente contar aos jovens, para que não sejam enredados em negacionismos com agendas escondidas que afirmam que: “…bem o que houve aqui não foi bem fascismo. Foi assim uma coisa musculada…!”
Musculada nas torturas aos presos políticos! Musculada na repressão às mulheres, musculada no trabalho infantil!
Se poderia compreender uma negação de tudo isto de quem não o viveu, é-me inconcebível aceitar tais afirmações de quem tem obrigação de saber muito bem o que foi, o que aconteceu e porque aconteceu.
É triste verificar que em política vale tudo!
Até negar o passado, o óbvio, o que ainda tem marcas.
A minha geração errou ao não ter tido a coragem de imprimir nos filhos a clara visão das conquistas da revolução.
Revolução que teve inúmeros erros! Que hoje seria certamente diferente! Mas que terminou com o fascismo em Portugal!
A democracia nunca é um bem adquirido!
Os movimentos negacionistas da História a par dos extremismos que não têm soluções, mas transbordam de críticas, estão aí. Estão aqui!
Declarados ou encobertos, são os carrascos da democracia.
Há um passado sombrio ao virar da História. Que o futuro seja risonho e sobretudo livre!
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.