Como grande parte dos portugueses, tenho seguido com atenção os debates nos media entre os diferentes partidos.
Não querendo falar no facto de pouco se dizer sobre o programa de cada um e o seu debate, procurando-se isso sim “ganhar” o combate verbal, utilizando argumentos e táticas por vezes bastante questionáveis, existe um denominador comum: a sobrevivência do Estado Social.
Independentemente das perspetivas de cada um em relação ao que deve ser o papel do Estado na proteção dos cidadãos ao longo da vida e com uma especial ênfase no pós vida ativa/profissional, num ponto estão todos de acordo: se nada for feito, a Segurança Social entrará em rotura nos próximos anos. E quando dizemos “anos”, estamos a referirmo-nos à próxima década, o que é já ali ao virar do tempo.
De todas as medidas apresentadas, não escutei nenhuma que colocasse em destaque a curva demográfica e que propusesse de forma eficaz e rápida a sua inversão.
Naturalmente que são necessários apoios à natalidade, que implicam alterações ao Código do Trabalho, permitindo uma maior flexibilidade e disponibilidade das famílias, apoios em relação a creches, subsídios ou alterações no IRS que beneficiem as famílias numerosas, etc, etc.
Essas são as óbvias e imediatas. Mas, em bom rigor, irão ter pouco ou nenhum impacto nos próximos anos, porquanto são naturalmente morosas
Aliás, porque não têm em conta uma questão civilizacional importantíssima que se prende com a priorização generalizada da carreira no feminino. E por muitas alterações que sejam feitas é ainda à mulher que cabe gerar e fazer nascer novos seres.
As estatísticas mostram claramente que nos países desenvolvidos a maternidade chega cada vez mais tarde e também por essa razão limita muitíssimo o número de filhos.
Um cidadão estrangeiro que se encontre a trabalhar em Portugal e que pretenda trazer por força do reagrupamento familiar, mulher e filhos, terá grande dificuldade em conseguir fazê-lo em condições dignas e que proporcionem a possibilidade de estabelecer um projeto de vida a médio prazo
A inversão da curva demográfica só é possível acontecer a curto/médio prazo por via da imigração.
Portugal é considerado como um país com uma política migratória bastante aberta.
No entanto, esta perspetiva é bastante superficial e não corresponde totalmente à realidade, porquanto há um enorme caminho a fazer em relação a políticas consertadas em diferentes vertentes. Com efeito não basta que a legislação seja favorável ao movimento de pessoas. É essencial que as diferentes áreas sociais e económicas se envolvam e criem condições para a integração e fixação destas pessoas, sob pena de sermos apenas um país de trânsito e não de destino.
Comecemos por exemplo pela habitação, questão fundamental para o processo de acolhimento e integração.
A norma para qualquer cidadão português que pretenda arrendar casa, é a do pagamento duma caução de dois meses e um contrato geralmente por três anos.
Ora, para um cidadão estrangeiro residente legal em Portugal (já para não falarmos dos que se encontram em situação irregular por motivos independentes da sua vontade), o mínimo exigido são entre os seis e os 12 meses, consoante a duração do contrato.
Evidentemente que a esmagadora maioria depara-se com um obstáculo praticamente intransponível face aos preços de aluguer, que são muitas vezes inflacionados no caso de se tratar de estrangeiro, o que contradiz a nossa ideia de país acolhedor e não discriminatório.
Um cidadão estrangeiro que se encontre a trabalhar em Portugal e que pretenda trazer por força do reagrupamento familiar, mulher e filhos, terá grande dificuldade em conseguir fazê-lo em condições dignas e que proporcionem a possibilidade de estabelecer um projeto de vida a médio prazo.
Não é por acaso que saltam para os noticiários casos de sobrelotação de residências, situação que é degradante e que neste momento apresenta um perigo acrescido face à pandemia.
O acesso à saúde é outro problema que impede uma rápida fixação das pessoas no nosso país. Se é completamente verdade que, graças ao nosso SNS, ninguém fica sem assistência médica seja qual for a sua situação em território nacional, é incontestável também a grande falta de informação junto dos próprios serviços de saúde no que se refere ao atendimento destas populações.
A sobrevivência do nosso sistema de segurança passa necessariamente por uma política migratória consistente, que envolva toda a sociedade.
No entanto, continuamos sem definir clara e sobretudo concretamente que tipo de país e que estrutura de acolhimento e integração queremos ser relativamente aos fluxos migratórios.
E não, esta não é uma questão secundária. Dela depende o futuro do país.
Tão simples como isso.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.