O Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) publicou um artigo de opinião onde me acusa de ter cometido três grandes equívocos, a propósito de um comunicado em que critiquei a ingerência do Conselho Superior do Ministério Público no livre exercício do mandato de um advogado, previamente autorizado pela sua Ordem a fazer uma comunicação pública em defesa do seu constituinte, que tinha sido sujeito a uma enorme exposição mediática. A esses pretensos equívocos é dada uma resposta, com as certezas do Presidente do SMMP sobre este questão. Analisemos então as mesmas.
Em primeiro lugar, o Presidente do SMMP refere que nenhum membro do CSMP está lá na qualidade de representante da Ordem dos Advogados, o que é uma evidência, considerando a qualidade de advogado desses membros “meramente acidental”. No entanto, não se coíbe de aconselhar a Ministra da Justiça e a Assembleia da República, que escolheram esses membros do CSMP a escolherem apenas “personalidades onde não seja de antever, pela sua atividade profissional, conflito de interesses entre as funções de vogal do CSMP e os interesses privados que representam”. Temos assim que agora o SMMP pretende condicionar a escolha dos membros não magistrados no CSMP, pretendendo que os órgãos de soberania não escolham advogados. Ficamos assim com a certeza do Senhor Presidente do SMMP de que em Portugal um sindicato de magistrados acha que pode indicar ao Parlamento e o Governo quem deve integrar o órgão de fiscalização dos magistrados.
Em segundo lugar, o Presidente do SMMP acha que o CSMP não interferiu nas competências da Ordem dos Advogados quando censurou publicamente declarações feitas por advogado autorizado pela sua Ordem, em defesa do seu constituinte, situação em que a sua qualidade de membro do CSMP é que é “meramente acidental”. Na verdade, nenhuma disposição do Estatuto do Ministério Público pode condicionar o exercício do mandato de advogado, nem impedi-lo de defender o seu constituinte, não sendo aceitável a imposição pelo CSMP de um “dever de reserva” a um advogado no exercício do seu mandato, só por este integrar esse Conselho, quando o art. 93º do Estatuto das Ordem dos Advogados atribui aos Conselhos Regionais da Ordem competência para autorizar declarações públicas do advogado. Não tem por isso manifestamente razão o Presidente do SMMP, apesar da certeza da sua convicção.
A última certeza do Presidente do SMMP é achar que também não cabe na defesa do cliente as declarações que foram feitas pelo advogado em questão e que estas teriam sido censuradas pelo Conselho Regional de Lisboa. Só os Conselhos de Deontologia e o Conselho Superior da Ordem dos Advogados é que têm competência para avaliar o comportamento disciplinar dos advogados, designadamente no âmbito das declarações públicas que fazem. Se algum magistrado tem queixas relativamente ao comportamento de um advogado é aos órgãos disciplinares da Ordem que se deve dirigir, não cabendo a mais ninguém interferir no exercício do mandato pelos advogados. No tempo de Estado Novo é que houve casos em que magistrados destituíam advogados do seu mandato, substituindo-os pelo chefe de secretaria do tribunal…
Quando exerci as funções de Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados mandei abrir várias vezes processos disciplinares a advogados devido a queixas de sindicatos relativos ao comportamento daqueles para com os seus associados. Julgo ser, no entanto, a primeira vez que um sindicato, em lugar de apresentar uma queixa contra um advogado à Ordem dos Advogados, faz antes uma interpelação ao CSMP para que este censure declarações desse advogado, enquanto membro desse Conselho. E, demonstrando a influência que o SMMP pelos vistos tem nesse Conselho, este acolhe esse pedido, censurando os seus próprios membros no exercício da sua actividade profissional externa, o que extravasa claramente das suas competências como órgão disciplinar da magistratura, com o que se deveria antes ocupar.
Perante a certeza que resulta desta deliberação do CSMP não me espanta nada que três membros não magistrados tenham renunciado às suas funções neste órgão. O que me espanta foi os restantes membros não magistrados terem decidido lá permanecer.