Decorreu, em Luanda, a Cimeira da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). Que fez agora 25 anos. E se a “efeméride” foi assinalada, não se pode dizer que tenha sido comemorada. Nem o merecia. Entre o projeto e o sonho fundadores e a realidade não há umas diferenças ou barreiras, há um abismo. Que se começou a cavar logo no sistema de escolha do seu secretário-executivo: não por eleição do mais indicado para exercer o cargo, sem dúvida o grande idealizador e “concretizador” da Comunidade, José Aparecido de Oliveira – mas por indicação rotativa de países, exatamente para o afastar.
Sei muito bem a que isso se deveu, pois talvez mais do que ninguém acompanhei e apoiei Zé Aparecido na sua “cruzada” e luta, que desde sempre foi também a do JL, Jornal de Letras, em defesa da nossa língua e da aproximação entre os que a falam. É toda uma história por escrever. História em que, entre acertos e aspetos positivos, avultam o abandono de causas, o descaso, as insuficiências. Chegando ao extremo de, em escandalosa violação dos princípios e valores da própria CPLP, nela ser admitido como membro um país onde reina a tirania, a corrupção – e não se fala português!
Recordo ter sido o JL a, em 1993, ter a honra de organizar, com o apoio da embaixada do Brasil, a I Mesa Redonda Luso-Afro-Brasileira visando a criação da CPLP. Nela participaram figuras destacadíssimas da política, da cultura e do pensamento – do Brasil, de Portugal e dos PALOP. E pelos temas das suas várias mesas se pode ver ao que então se “aspirava”, numa, reconheço, utopia (“necessária”, disse Eduardo Lourenço). Entre esses temas, além dos sobre cooperação em todas as áreas, até os de sonhados Parlamento e Universidade dos povos de idioma comum. E, claro, o do IILP (Instituto Internacional de Língua Portuguesa), um instrumento decisivo da Comunidade, a que nunca foram alocados os recursos mínimos para prosseguir a sua missão.
No meio de tanta desilusão e inoperância, a assunção da presidência da CPLP por Cabo Verde, em 2019, trouxe esperança de se iniciar um novo caminho. Como, não tenho dúvida, o país e o seu Presidente, Jorge Fonseca, um homem de bem e de cultura, desejavam e desejam. Que era, porém, muito difícil, e a pandemia ainda tornou mais. Conseguiram, porém, a aprovação, em Luanda, de um Acordo de Mobilidade, visando a abolição de vistos, contribuindo para uma maior e mais fácil circulação das pessoas no seio da Comunidade. Mas, atenção, a “concretização” deste acordo em cada país depende ainda da sua aprovação e regulamentação na ordem jurídica interna. Veremos o que vai acontecer. E se este poderá constituir um primeiro passo (desconfio…) para uma ideal “cidadania lusófona”.
Entretanto, dos 51 (51) apelaram, aprovaram, congratularam, destacaram, registaram, reafirmaram, reconheceram, saudaram, tomaram nota, e similares, da Declaração Final da Cimeira, é esse acordo que mais se destaca, pela positiva. De par, pela negativa, com a completa omissão de qualquer coisa de relevante quanto à política da língua e à cultura. É caso para dizer: mais ação, mais lusofonia, mais língua – e menos paleio…
(Opinião publicada na VISÃO 1481 de 22 de julho)