Outro dia, um amigo meu contava-me como um mecânico o tinha tentado ludibriar. A caixa de velocidades do seu carro, já com alguma idade, produzia um barulho inquietante quando engatava a terceira. O diagnóstico do mecânico foi imediato e impiedoso: era preciso substituir a caixa de velocidades, pois era a única solução. E ainda por cima por um preço astronómico!
O meu amigo, que é cauteloso, teve a clarividência e tomou a precaução de pedir uma segunda opinião, a qual foi diametralmente oposta.
Desde então, o carro circula sem problemas e o barulho desapareceu.
Quando temos um parecer de um mecânico, de um canalizador ou de um cirurgião, e se nós não somos exatamente entendidos em canalizações de água quente ou em próteses da anca, é da mais elementar cautela dirigirmo-nos a um segundo profissional, no sentido de completar e conferir a informação que nos foi fornecida.
É, com efeito, ponderado que percamos algum tempo a refletir antes de lhes concedermos a nossa confiança.
A mesma coisa se passa na gestão dos assuntos de Estado, quando o Governo propõe despesas para o ordenamento do território, para o funcionamento da administração pública, para a defesa nacional, para a educação ou a saúde.
É que as despesas são na, maior parte das vezes, muito significativas e relevantes e podem vincular o Estado por muito tempo. São despesas que vão onerar os orçamentos seguintes.
Frequentemente, o Governo propõe, também, por um valor astronómico, que se mude a caixa de velocidades ou a prótese da anca do paciente, explicando que não temos outra escolha e que ficará tudo muito melhor que antes, porque iremos mais longe, mais depressa e por muito mais tempo. Se o diagnóstico é apresentado desta maneira, podemos com justeza desconfiar, porque manifestamente querem-nos forçar a mão para não nos deixar tempo para refletir.
Antes de dar o seu voto de confiança, o eleitor deve poder pensar, para pedir uma cotação e comparar as ofertas.
O eleitor escuta, avalia os prós e os contras e não assina, seguramente, um cheque em branco para a gestão do País.
Como exemplo, Orçamento do Estado para 2019, aprovado na semana passada, gera a maior carga fiscal de sempre, mantém uma das maiores dívidas públicas da Europa, conserva o desinvestimento na educação, na saúde e nos serviços públicos em geral, tem subjacente uma política eleitoralista e de interesse imediato e não acautela o futuro de Portugal em caso de sobressalto económico e financeiro. É, na verdade, um orçamento que prefere adiar sine dia a resolução dos nossos problemas coletivos. Conseguem apontar alguma reforma concreta que o atual Governo tenha realizado?
As mulheres e os homens políticos esquecem habitualmente que devem os seus lugares à confiança que as pessoas neles depositam.
Será que o Partido Socialista está consciente disto?