Esta é uma semana decisiva para o nosso futuro. Depois da obtenção do Acordo de Paris, em dezembro de 2015, integrando quase 200 países, a nova administração americana anunciará esta semana a sua posição sobre a participação neste Acordo.
Recordo, com uma memória viva dado que era o relator permanente do Parlamento Europeu para as alterações climáticas, um processo aparentemente semelhante quando o Presidente Bush decidiu, há 15 anos, não ratificar o Protocolo de Quioto, assinado pela administração Clinton-Gore. Mas, insisto, apenas na aparência estes processos são semelhantes. Se, há 15 anos, já poucas razões justificavam o abandono por parte dos EUA de um acordo climático global, hoje essas razões são mesmo imperscrutáveis.
Em primeiro lugar, ao contrário do invocado há 15 anos por muitos setores americanos, hoje não há qualquer dúvida quanto à base científica: o mundo está numa caminhada inexorável para as alterações climáticas. Todos os anos batemos recordes de aumento da temperatura. Se nada fizermos, não haverá surpresas: a temperatura aumentará mais de 5º C face ao período pré-industrial, o nível do mar continuará a subir, assistiremos com mais frequência a fenómenos climáticos extremos, vagas de calor, cheias, secas, incêndios de proporções dantescas, surtos epidémicos e degradação da biodiversidade.
Em segundo lugar, ao contrário do Protocolo de Quioto, que envolvia uma participação limitada, este é um acordo verdadeiramente abrangente e inclusivo, integrando quase 200 países representando 98% das emissões globais, estabelecendo metas vinculativas para todos os países (e não apenas para os desenvolvidos), tendo por objetivo limitar o aumento da temperatura a 1,5º C. Nesse sentido será necessário reduzir as emissões globais em 70% até 2050 (face a 2010) e garantir a neutralidade das emissões na segunda metade do século XXI.
Em terceiro lugar, quase 15 anos depois do Protocolo de Quito, todos os grandes estudos económicos confirmam que o combate às alterações climáticas, sendo urgente, é também gerível e pode ser custo eficiente se agirmos atempadamente.
Esta semana publicámos, na OCDE, um grande estudo – Investir no clima é investir no crescimento – que evidencia a imprescindibilidade de avançar com urgência para a concretização do Acordo de Paris.
Este estudo, incidindo sobre os países do G20 – que representam 85% do PIB mundial e 80% das emissões de gases com efeito de estuda – conclui que a integração, nas políticas económicas, de medidas de combate às alterações climáticas terá um impacto positivo no crescimento económico. Articular as agendas de crescimento e clima, ao invés de tratar o clima como uma questão meramente ambiental, pode adicionar 1% à taxa de crescimento nos países do G20 até 2021 e 2,8% até 2050. Se contabilizarmos as poupanças associadas aos custos evitados com as consequências das alterações climáticas, então o acréscimo de crescimento económico atingirá 5% em 2050.
O menu de políticas é claro: precisamos de combinar políticas climáticas – assentes na promoção das energias renováveis, da eficiência energética e da mobilidade elétrica, assim como na definição de preços de carbono (através de taxas de carbono e de sistemas de comércio de emissões) – com políticas económicas centradas no investimento em infraestruturas de baixas emissões.
O investimento assume um papel determinante. O cumprimento do Acordo de Paris envolverá um investimento de 95 biliões de dólares, até 2030, em infraestruturas nas áreas da energia, transportes, água e telecomunicações. Mas não basta investir. É fundamental investir atempadamente. O adiamento da tomada de medidas para depois de 2025 levaria a uma perda económica de 2%, nos 10 anos seguintes, nos países do G20, por comparação com a tomada imediata de medidas. Por outro lado, este adiamento acabaria por obrigar, mais tarde, à tomada de medidas mais exigentes, comportando maiores riscos de disrupção económica e ambiental.
Mas este investimento é claramente proveitoso. O Acordo de Paris exigirá um investimento anual de cerca de 7 biliões de dólares. Este valor é 10% superior (isto é, 700 mil milhões de dólares) a alternativas mais poluentes. Mas as infraestruturas de baixo carbono são mais eficientes do ponto de vista energético e originarão uma poupança anual de 1,7 biliões de dólares em combustíveis fósseis, mais do que compensando o custo incremental.
Em resumo, já não há disputa sobre a base científica das alterações climáticas. Já não há disputa quanto às consequências e custos da inação. Já não sobram dúvidas quanto aos benefícios económicos associados ao crescimento verde.
Hoje, dispomos de toda a informação de que necessitamos para agir. Mas, verdadeiramente, o que está em causa não é uma avaliação custo-benefício ou uma ponderação de natureza burocrática. O que está em causa é a ética do futuro. Um dia seremos julgados pelas próximas gerações e teremos de responder à questão fulcral: com a informação de que dispúnhamos fizemos o que era necessário para impedir o desastre ou, por comodismo, adiámos, transigimos e hesitámos?
Este é o tempo da liderança. E, neste tempo único, todos os governos têm de estar à altura das suas responsabilidades.