A formação profissional é uma das práticas mais visíveis da gestão de recursos humanos nas empresas. Apesar da sua generalização no terreno, apenas nos últimos 30 anos, após muitos anos de aridez empírica, se assistiu a um esforço significativo de investigadores para conseguirem demonstrar que a formação é um fator determinante nos resultados organizacionais. Os trabalhos de autores como Salas e Cannon-Bowers (2001), Aguinis e Kraiger (2009) e Ford, Baldwin e Prasad (2017) apresentam dados que sustentam que as organizações com melhores práticas de formação também alcançam melhores resultados financeiros e índices de melhor eficácia organizacional. Hoje em dia é normal as empresas mais bem sucedidas investirem entre 2 a 3% do seu orçamento da massa salarial na formação. A lei portuguesa estabelece 40h de formação obrigatórias para todo o trabalhador.
No entanto, como afirmam vários destes especialistas, parece subsistir um paradoxo – enquanto que, no plano organizacional, a formação tem uma imagem muito positiva, no plano individual (iniciativas individuais de formação), as dúvidas e o ceticismo tendem a persistir. A principal razão advém da dificuldade em se demonstrar, de forma clara e irrefutável, como os programas de formação se relacionam com o desempenho profissional de um colaborador. Ainda é uma tarefa controversa responder de que modo a formação influencia o desempenho, em que condições a transferência das aprendizagens para o posto de trabalho (deve) ocorre(r) ou por quanto tempo os efeitos se conseguem observar.
Fatores do meio, como o clima laboral, os estilos de gestão e liderança, a gestão por objetivos e feedback constante proporcionado pelas lideranças, a cultura de aprendizagem, bem como as políticas de gestão de pessoas também se revelam como condições críticas para se aprender e transferir para o posto de trabalho essas mesmas aprendizagens
A investigação tem tentado responder a estes desafios e os resultados tendem a ser pouco consensuais. Um dos temas que tem merecido mais atenção por parte de investigadores neste domínio tem a ver com a transferência das aprendizagens ocorridas na formação para o contexto do trabalho, denominada de Transferência da Formação (Holton, Bates e Ruona (2000); Goldstein & Ford, 2002).
Numa fase inicial, a investigação debruçava-se sobre os métodos pedagógicos e as condições de aprendizagem. Mais recentemente começaram a ser estudados os fatores individuais que afetam a experiência de aprendizagem do formando e a transferência da formação para o local de trabalho. A motivação para transferir (Gegenfurtner e colegas, 2009) ou a personalidade tendem a ser fatores individuais que ajudam a explicar este fenómeno. Um estudo desenvolvido por Ng e Ahmad (2018) sugere que indivíduos com elevados níveis de conscienciosidade, agradabilidade e extroversão tendem a transferir mais os conhecimentos obtidos em contexto de formação para o trabalho. Um estudo realizado pelo ISPA (Martins, 2019) numa empresa pública portuguesa identificou os seguintes fatores como aqueles que melhor explicam a transferência da formação: a motivação para transferir, a abertura à mudança e as crenças de auto-eficácia. Estes estudos tornam claro que, por mais rigorosos e inovadores que sejam os métodos pedagógicos, as predisposições individuais são absolutamente críticas e devem ser consideradas na equação em todos os momentos do processo formativo.
De igual modo, fatores do meio, como o clima laboral, os estilos de gestão e liderança, a gestão por objetivos e feedback constante proporcionado pelas lideranças, a cultura de aprendizagem, bem como as políticas de gestão de pessoas também se revelam como condições críticas para se aprender e transferir para o posto de trabalho essas mesmas aprendizagens (Minbaeva, 2005). O estudo realizado por Martins (2019) também sugere que a perceção de suporte da chefia é determinante para a transferência da formação.
Como concordam muitos investigadores, a complexidade e dinâmica do fenómeno transferência das aprendizagens é um dos mais desafiantes temas de estudo da psicologia aplicada. Mas, apesar da difícil missão, gestores, especialistas da formação e consultores têm de justificar os elevados investimentos que são feitos nesta área por razões de racionalidade de gestão e sustentabilidade organizacional. Devem definir estratégias e prioridades de aprendizagem e gestão do conhecimento crítico na sua organização, devem ser capazes de demonstrar que as práticas de trabalho são sólidas e informadas no conhecimento científico, utilizar medidas precisas e válidas de transferência da formação (consulte-se: Velada e Caetano, 2004; Antunes, Nascimento e Bates, 2008) e monitorar os processos de aprendizagem, resultados e efeitos no desempenho individual.
Sem a formação, aprendizagem e transferência do conhecimento não será possível adquirir novas competências. Para além das discussões sobre o impacto no desempenho, do retorno do investimento e dos fatores críticos para o sucesso da mesma, a formação foi e será uma prática de gestão crucial no desenvolvimento dos indivíduos e das organizações.
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