É consensual que, em fevereiro e março, quando a pandemia chegou à Europa ninguém deste lado do mundo estava preparado para o que iria viver a seguir. Se hoje a informação que temos sobre o vírus ainda não nos permite arriscar previsões seguras e plausíveis acerca do seu desenvolvimento, nessa altura havia um desconhecimento quase total. E era fácil, portanto, cair no engano de que o sistema hospitalar aguentava qualquer embate e se conseguia cortar as linhas de contágio usando umas quantas regras básicas de higiene e de distanciamento físico.
Os verdadeiros alarmes, na verdade, só soaram na Europa quando a situação em Itália entrou num caos galopante. Foi o momento em que se percebeu que, num caso semelhante, nenhum país tinha o seu sistema de saúde preparado para responder a um desafio daquela magnitude. E que era preciso virar todas as baterias e atenções para a busca de ventiladores, de gel desinfetante e de todas as armas que pudessem impedir o vírus de saltar de pessoa para pessoa. Perante a ameaça generalizada, a maioria dos governos avançou com ordens de confinamento, recolhendo as populações em casa, com a promessa de que iria “ficar tudo bem”. À primeira vez, tudo se perdoa…
Conhecemos todos o resto da história e sabemos o que se passou a seguir. Como percebemos que, sete meses depois, estamos quase a assistir à repetição do mesmo filme: os números de novos casos positivos voltam a bater recordes e alguns países regressam ao estado de emergência, como se não existisse alternativa. Felizmente, a progressão do número de óbitos, bem como de internados em cuidados intensivos, é agora muito inferior ao que ocorria na primeira vaga, mas esses não são dados que, por si só, nos façam tranquilizar. A ameaça de colapso do sistema de saúde continua a pairar como provável.
O que temos mesmo de perguntar é por que razão estamos perante o risco de passar por isto tudo outra vez? Porque vemos os casos a aumentar sem que nada nem ninguém consiga arranjar forma de travar essa progressão? Não é um problema de Portugal, sublinhe-se. Esta é uma realidade que ocorre um pouco por toda a Europa e também nos EUA.
Pode-se sempre argumentar que é uma fatalidade, e que nada se pode fazer para evitar esta situação enquanto não for descoberta uma vacina ou um tratamento eficaz para o vírus. Essa é, no entanto, a chamada observação de vistas curtas, de quem só olha para a forma como o vizinho do lado enfrenta a catástrofe. Perante uma pandemia absolutamente global, convém ter uma visão também global do problema e, acima de tudo, das soluções. E ter a humildade de perceber que, nesse campo, os países da zona da Ásia-Pacífico têm tido um comportamento muito mais eficaz de conseguirem identificar e eliminar, com rapidez, as linhas de contágio e, dessa forma, estancar a progressão de casos e, acima de tudo, reduzir a mortalidade provocada pela Covid-19.
Os números são públicos e avassaladores. Enquanto na Europa contabilizamos centenas de mortes por milhão de habitantes (900 na Bélgica, 727 em Espanha, 217 em Portugal ou 118 na Alemanha), nos locais onde o vírus chegou primeiro esses indicadores são, comparativamente, quase irrisórios: 13 no Japão, 9 na Coreia do Sul, 5 na Nova Zelândia (só para citar regimes democráticos).
É a diferença entre os países habituados a lidar com a gripe e os que, nas últimas duas décadas, tiveram de enfrentar as ameaças da SARS e do MERS, semelhantes ao do novo coronavírus. Eles aprenderam a lição e, depois dos erros cometidos nessa altura, mudaram procedimentos: investiram em testes, em máscaras, nos mecanismos de deteção e de rastreio e, acima de tudo, na partilha de informação precisa e factual com as populações, de forma a criar uma consciência coletiva dos riscos e de como se protegerem.
Por isso mesmo, não repetiram na segunda vaga os erros da primeira. É bom que aprendamos isso – até porque não nos vamos, quase de certeza, livrar de uma terceira. E se à primeira todos caem…