Milhares de pessoas vão em encontros por este mundo fora e é sabido que o sucesso ou insucesso de tal empreitada vai muito além da atração física. Todos parecem procurar por aquele ‘clique’, uma espécie de pressentimento que não se explica mas que efetivamente se sente. A pergunta de um milhão de euros que se mantém é: o que causa esse ‘clique’ e gera a atração inexplicável que vai além de uma mera inclinação física? Se o estimado leitor está na dúvida se entrou na rúbrica certa ou se por acaso está na secção de Life Style, digo-lhe que sim, por estranho que possa parecer, continuamos a falar de ciência.
Para tentar encontrar uma explicação para esta ‘faísca’ entre indivíduos, foi desenvolvida uma experiência com base naquilo a que chamaríamos em estrangeirismo blind date ou traduzindo à letra, um encontro às cegas. Vários desconhecidos foram colocados frente-a-frente, interagiram por um determinado período de tempo e vários parâmetros foram medidos. Foram inquiridos três segundos após verem a outra pessoa e, novamente, no fim do encontro, quanto à atração que sentiam pela pessoa à sua frente e quanto à sua vontade de a voltar a ver num novo encontro. Os responsáveis por este estudo criaram a hipótese de que, se esse ‘clique’ realmente existisse, teria de haver alguma manifestação física do mesmo. E mais, para que ambos sentissem essa inclinação, certos sinais teriam de ser observados em ambos os membros do casal.
Procurou-se por dois tipos de sinais: respostas miméticas, que incluem tudo aquilo que é feito de forma consciente ou que, pelo menos, a pessoa consegue controlar (temos como exemplos a expressão facial, gestos ou toque); e respostas síncronas, que incluem respostas fisiológicas que são inconscientes (neste caso, foram medidos o ritmo cardíaco e a condutividade da pele). Num aparte, a condutividade da pele refere-se à capacidade que esta tem de conduzir corrente elétrica. Esta propriedade varia com o nosso estado emocional e parece estar relacionada com as glândulas sudoríparas.
Voltando ao estudo e começando pela mimetização, foi encontrada uma relação positiva entre a atração e um maior uso de alguns gestos, nomeadamente sorrir, olhar nos olhos, movimentar as mãos ou simplesmente acenar. No entanto, a quantidade de gestos que cada indivíduo fazia ao longo do encontro foi relativamente constante. Ou seja, não parecia estar dependente do decorrer do encontro, mas sim da primeira impressão visual que as pessoas tinham uma da outra. De certa forma, estes parecem estar mais relacionados com atração física e não necessariamente com a ‘faísca’ que os investigadores procuravam. Falando de sincronismo, os resultados foram bastante mais conclusivos. Acontece que, à medida que o encontro decorria, em casais que quiseram avançar para um segundo encontro, houve um aumento de sincronismo de ritmo cardíaco e condutividade da pele. Ou seja, quanto melhor corria o encontro, mais os ritmos cardíacos das duas pessoas se sincronizavam e o mesmo para a condutividade da pele.
Ao contrário dos gestos miméticos, o sincronismo fisiológico não parece estar relacionado com atração física, mas sim com uma maior reciprocidade afetiva. Numa referência a outros estudos, os sincronismos de ritmo cardíaco e condutividade da pele já tinham sido identificados em casais com o aumento da intimidade e familiaridade, podendo ser despoletados através de contacto físico ou contacto visual. Quanto maior o tempo que passam juntos e a sua cumplicidade, maior o sincronismo. Interessante descobrir que esses dois sincronismos se iniciam logo num primeiro encontro e que podem mesmo estar por detrás daquela ‘faísca’ que nos leva à outra pessoa.
Baseado em: https://www.nature.com/articles/s41562-021-01197-3
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