A boa notícia é que há cada vez mais jovens a visitar museus, a má é que o têm feito munidos de sopa de tomate. Aconteceu novamente, desta feita em Haia: três activistas foram detidos depois de tentarem vandalizar uma obra de Vermeer. Os visitantes mais desatentos ainda hoje devem estar a pensar que viram uma instalação artística. Na verdade, era um protesto do movimento Just Stop Oil, que pretende levar o governo britânico a desistir dos combustíveis fósseis. Não sei se será estratégia ideal, esta do “deixa-me cá comportar-me como um louco, para depois ouvirem a mensagem muito séria que tenho para passar”. Pobre Vermeer, pobre Van Gogh, como se não lhes bastasse terem morrido na miséria, ainda têm de ser incomodados, tantos anos depois. A sopinha teria sido bem-vinda, sim, mas era na altura em que passavam fome. “A arte vale mais do que a comida?”, perguntaram os activistas. Não. Por isso mesmo, mais valia terem poupado essa latinha de sopa Campbell’s e terem-na oferecido a alguém que precisasse de comer. Pode ter surgido aqui uma cisão irreversível entre os activistas ambientais: aposto que os especialistas em desperdício alimentar não vão perdoar estes esbanjadores de sopa. Podiam ao menos ter aproveitado a excursão ao museu para aprender alguma coisa sobre história de arte, compensando assim todas aquelas sextas-feiras em que se baldaram às aulas, sob o pretexto da greve climática (excelente ideia, não nego, quem me dera ter-me lembrado disso em 1999, quando passava tardes a ouvir falar do estilo rococó).
“Esta pintura está protegida por vidro, não se preocupem. O futuro dos nossos filhos não está protegido”, disse um dos activistas, com ar de quem não tem filhos. Se tivesse, estaria tão ocupado a tentar tirar nódoas de tomate dos estofos do sofá, que não lhe sobraria tempo para apanhar um avião até Haia, só para ir maçar gente no museu Mauritshuis. Onde escrevi “apanhar um avião” deve ler-se “ir a pé”, porque é óbvio que estes indivíduos não se movimentam por meio de combustíveis fósseis. Depois de vermos uma obra de Monet ser metralhada com puré de batata, e outra de Van Gogh com polpa de tomate, temo que estejamos perante uma escalada de violência. O que se seguirá? Aconselho esparguete bem cozido. O meu filho mais novo tem por hábito arremessá-lo (sem critério, tanto atinge pinturas a óleo como a cara do irmão), e é muito chato de limpar. Mais do que o futuro do planeta, preocupa-me o futuro dos museus. A maçada que vai ser lá entrar… Nos aeroportos, graças a outro tipo de terroristas (que infelizmente não se lembraram de atirar molho de tomate às torres gémeas), passámos a ter de provar que não levamos mais do que 100 ml de água-de-colónia. Agora, por este andar, quando quisermos entrar no Louvre, teremos de ficar em pelota para mostrar que não transportamos connosco nenhuma arma perigosa, estilo polvo à lagareiro, para alvejar a Mona Lisa.
MAIS ARTIGOS DESTE AUTOR:
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.