Um pensamento que se apresente de forma básica, regra geral, tem maior adesão. Cognitivamente, exige processar menos informação. Facilita o processo decisório. Além de que, nesta nossa sociedade online, é mais fácil de compartilhar. Com a vantagem adicional de proporcionar uma sensação de segurança e conforto, ainda que ignore ou rejeite informações complexas que o possam contradizer.
Uma das temáticas clássicas do direito processual penal que atualmente é muito ressoada é a questão da duração dos prazos de inquérito. Com base na alegação de que existe um arrastar genérico dos inquéritos e que existe uma solução simples – estabelecer um prazo máximo para o Ministério Público deduzir acusação. Na mesma lógica, cogita-se a seguinte solução: se não se respeitar tal prazo, o processo será arquivado.
No fundo, uma argumentação paralela com a urgência do tratamento médico, onde a rapidez é crucial – melhora as chances de recuperação e reduzir futuros riscos.
É consabido que uma justiça fora do tempo não é justiça. Ajuda a aumentar a crise nas instituições mina a confiança no sistema e causa impacto económico decorrente da não resolução. Para as vítimas, o tempo de espera pode ter elevados custos emocionais. E por isso, é absolutamente relevante um sistema judicial eficiente e acessível.
Em Portugal, quando está em causa a liberdade de uma pessoa que esteja em prisão preventiva, um inquérito tem de ser concluído no prazo de quatro ou seis meses, consoante a gravidade dos crimes. Tudo terá de ser feito com urgência, que é sinalizada e atribuída, nomeadamente quando há perícias, inquirições, reconstituições e necessidade de realização de outras diligências probatórias.
Quanto aos outros inquéritos, a lei fixa igualmente prazos, que variam conforme a gravidade. Em caso de incumprimento, o inquérito terá de ser comunicado ao superior hierárquico (sim, porque existe efetiva hierarquia no Ministério Público), explicando razão de atrasos e prazo previsível.
E nos outros países, como é que fazem? Em França, o que eles chamam de “inquérito de flagrante delito” pode durar até oito dias. Também em Portugal temos os processos sumários, para que os julgamentos possam ser iniciados e realizados num prazo relativamente curto após detenção.
E os demais inquéritos? Em França, não têm um prazo fixo, mas devem ser conduzidos com a maior celeridade possível. Tal como na Alemanha.
Se se fixar um prazo absoluto (perentório), com a consequência de nulidade e arquivamento de autos, a questão que se coloca é: crimes altamente organizados ou que envolvam redes criminosas complexas poderão ser investigados com os atuais meios? Será possível fazer análise forense detalhada? E se existir cooperação internacional, deixa de se fazer, sabendo-se que estamos num mundo globalizado? E se os atos envolverem um grande número de arguidos ou vítimas, não se investiga? Se for necessária uma perícia contabilística ou financeira dependente de terceiros que demora meses, fecha-se os olhos? É que na vida real, as perícias demoram mais que um episódio de uma qualquer série policial que passa na televisão…
Caso existisse um prazo absoluto de inquérito, face à necessidade de adaptar a investigação aos crimes mais complexos, tal levaria à impossibilidade de acusações de crimes como corrupção ou branqueamento de capitais. No fundo, a negar um Estado de Direito Democrático. E os criminosos com mais recursos podem suportar os custos de longos processos, sobretudo se existir a motivação de não serem criminalmente responsabilizados por força da decorrência de um prazo.
Em conclusão, exija-se celeridade na justiça penal e meios para a concretizar. Pergunte-se qual o motivo de duração de um inquérito e como melhorar o sistema judicial. Mas se defender um prazo absoluto, tenha a consciência que é exatamente isso que um criminoso mais desejaria!!
Quer justiça ou que nunca mais se investigue crimes como a corrupção?
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