No calor das buscas o ex-líder do PSD, Rui Rio, veio reclamar “coragem” ao Governo, ao Presidente da República e aos partidos para fazerem uma “reforma da justiça e do Ministério Público”.
O próprio presidente da Assembleia da República, questionou se não estariam em causa “os princípios da necessidade” e da “proporcionalidade” e considerou que o segredo de justiça foi violado.
Um coro de outras vozes se juntou falando numa grande “disfuncionalidade do sistema judicial”, “febre justicialista do Ministério Público”, “surpresa e perplexidade”, “desproporcionalidade”.
Os principais responsáveis partidários, já na fase de rescaldo, acabaram por afirmar publicamente que não fazia sentido proceder a uma alteração legislativa a curto prazo e de forma irresponsável.
E ainda bem que imperou o bom senso!!
Pensar em alterações legislativas a pedido de envolvidos em processos judiciais ou de políticos levianos que comentam investigações em curso, que não conhecem, como se estivessem no café a discutir assuntos de “bola”, seria abrir uma verdadeira caixa de pandora.
O nosso sistema judicial já encerra, nos seus princípios e normas, aquilo que se reclama – necessidade e proporcionalidade, que devem conformar a atuação das autoridades judiciárias e dos órgãos de polícia criminal e compreende um conjunto de mecanismos de controlo exigentes e de recurso que garantem o equilíbrio e a equidade do sistema perante eventuais abusos ou erros judiciários.
Posso mesmo afirmar que temos um dos melhores sistemas de justiça da União Europeia e, tão importante como isso, um dos mais independentes.
E quando se reclama independência para o sistema de justiça, não significa, pretender um qualquer privilégio para os magistrados, irresponsabilidade ou arbítrio.
Trata-se de garantir a igualdade de todos os cidadãos perante o sistema de justiça e um sistema de freios e contrapesos (checks and balances system), para evitar poderes absolutos e um sistema de justiça na mão de quem tem o poder e por ele instrumentalizado.
O que irrita a alguns é terem que se subordinar a um sistema, que tem os seus defeitos e falhas, mas que funciona de forma independente, pelo que para atuarem no mesmo têm de se quedar aos mesmos mecanismos e regras dos demais cidadãos.
Todos conhecemos a vontade daqueles que apareceram a exigir uma reforma do sistema de justiça e que consiste em que o mesmo funcione, à moda provinciana que tanto adoram, que é a prerrogativa, de pegarem no telefone e ligarem ao Procurador-Geral da República, exigindo que interfira na investigação, ponha um freio nos magistrados ou altere o rumo ou a decisão de um processo, só porque acham que esse é um privilégio próprio, de classe, de quem detém o poder.
Imaginemos, agora, que todos os cidadãos visados em diligências processuais, tinham esse mesmo poder, o de vir para a comunicação social invocar abuso e desproporcionalidade de meios e exigir a alteração da lei ou exigir ao PGR que atue desta ou daquela forma!!!!
Será que teríamos a mesma reação dos responsáveis políticos que vimos a criticar a atuação da justiça e a exigir reformas? Será que os veríamos, no imediato, a pedir alterações legislativas ao sabor dos apetites de cada um dos incomodados?
Em jeito de conclusão.
O sistema de justiça tem meios próprios de controlo e sindicância das decisões que são tomadas pelas autoridades judiciárias.
Todos os cidadãos, independente da sua função social, devem habituar-se a exercer os seus direitos dentro dos mecanismos previstos no mesmo.
Não devem existir suspeitos ou arguidos de primeira e de segunda categoria.
O sistema de justiça deve evoluir de forma a garantir a todos igualdade no acesso e no tratamento.
Já é altura de se abandonarmos alguns resquícios do absolutismo e provincianismo nacionais, próprios de outros tempos!!!
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