O lugar que serve para nós como porto de abrigo, como refúgio, como retaguarda… o lugar para onde corremos sempre que nos sentimos em perigo, sempre que estamos encurralados, quando perdemos o chão ou quando procuramos um norte…
Este lugar é, para quase todos, a família, aqueles com quem crescemos, aqueles que nos deram coragem, nos levaram ao colo tantas vezes, nos substituíram quando as forças faltaram.
Foi para aqui que todos corremos quando, há um ano, o inimigo atacou. Quem estava fora regressou, do longe fez-se perto, as barreiras derrubaram-se e o nosso abrigo volta a ser ocupado.
Talvez há já muito tempo que não se olhasse a família desta forma, talvez há muito tempo que não nos conectávamos assim com as nossas raízes, talvez há muito tempo que não sentíamos que o mais importante é, no fundo, a família e aqueles que nos são próximos.
Mas, esta nossa necessidade de nos conectarmos, de estarmos perto, de estarmos juntos, foi também aquilo que nos colocou em risco. Foi nas reuniões familiares e encontros de amigos que mais nos desprotegemos. Sentimo-nos seguros lá e, por isso, arriscamos. Quebramos regras, furamos confinamentos, transgredimos, arriscamos… tudo para estar com os nossos. Há até quem afirme “se tivermos que ficar doentes, ficamos doentes juntos”.
Os laços familiares são enormes e levam-nos a cometer as maiores insensatezes. A escolha é difícil, “morrer da doença” ou “morrer de solidão”? Não saber se voltamos a estar com quem amamos, se poderemos recuperar o tempo perdido, se estaremos a deixar passar oportunidades, faz-nos querer estar, contra tudo e contra todos. Mas, mais uma vez é aqui que nos colocamos em risco e colocamos os nossos em risco.
Costumo dizer que amar é um risco, talvez esta seja mais uma situação em que tal se denota. Amar alguém pode ser muitas vezes arriscar tudo, até ficar doente, até transportar a doença para alguém. Este ano colocou-nos à prova de muitas formas e fez com que aqueles que mais amamos sejam aqueles que mais nos colocam em risco e aqueles a quem mais pomos em perigo.
Conseguimos estar longe de colegas e amigos, mas não resistimos muito tempo sem a família. É uma escolha, é uma ambivalência, é uma confusão de sentimentos contraditórios. Não sabemos o que está certo ou errado, estamos todos a aprender, a gerir a necessidade de proteção com a necessidade de amor. Juntos tornamo-nos mais fortes e é essa força que a família nos dá. Mas é também a nossa maior fraqueza e aquilo que nos faz quebrar todas as normas. Para onde cairá o nosso pêndulo?