É minha convicção de que a maioria dos portuenses, sobretudo o setor das camadas mais jovens, não sabe quem foi Carlos Alberto que deu o nome a uma das mais pitorescas e conhecidas praças do Porto.
Ora, este Carlos Alberto foi rei da Sardenha e, nos começos de 1849, andava empenhado na unificação de Itália. Na primavera daquele ano, no entanto, em Novara, foi derrotado pelas tropas austríacas e, na sequência desse desaire, abdicou do trono no seu filho, Vitor Emanuel, e abandonou a Itália. Menos de um mês depois, em abril (dia 19), Carlos Alberto chegou ao Porto, cidade que elegera para o seu exílio e para onde viajara sob o nome de conde de Barge.
Dizem as gazetas da época que “as autoridades citadinas “ o foram esperar ao Carvalhido que era, então, o limite da cidade. Lá compareceram o bispo, D. Jerónimo Rebelo; o governador civil mais o presidente da Câmara, que era Vieira de Magalhães, barão de Alpendorada, conhecido, particularmente, pelos maus tratos que dava à gramática.
Num jornal da época escreveu-se mesmo que, para se sair airosamente nesta inesperada situação, o presidente da Câmara “anda a estudar o discurso que há – de recitar na ocasião em que tiver que saudar o rei, para não empregar palavras como num faz minga, cunsante e cangirão…” Naqueles tempos a sátira nos jornais não poupava ninguém.
O rei Carlos Alberto, perdão, o conde de Barge, chegou ao Porto acompanhado por dois criados, Gamalleri e Vallenti. Viajou de barco até Vigo e desta cidade galega veio para o Porto montado num simples garrano. Quando o pequeno cortejo do régio exilado se aproximava do Carvalhido as autoridades da terra adiantaram-se ao encontro dele. O governador deu as boas vindas e o rei agradeceu a hospitalidade. Ainda Carlos Alberto não tinha acabado o agradecimento e já o presidente da Câmara preparava outro discurso. Mas a leitura foi de imediato interrompida. Foi o próprio rei que a interrompeu. Pediu, delicadamente, desculpa e lembrou aos presentes que vinha doente lembrando que, do que mais precisava, naquela altura, era de uma cama e que, por isso, o deixassem chegar depressa à estalagem.
“À estalagem, ah, isso não “ – protestou o bispo, oferecendo o seu paço para o alojamento de Carlos Alberto. O monarca disse aos presentes que nada queria que lhe lembrasse grandezas ou fausto e que apenas pretendia que o levassem a uma hospedaria. E assim foi feito. Carlos Alberto hospedou-se no palacete da praça dos Ferradores que fora residência dos viscondes de Balsemão e onde, na altura da sua chegada ao Porto, funcionava a célebre hospedaria do Peixe, nome do proprietário.
O rei vinha mesmo doente. Tão doente que os criados tiveram que o levar ao colo para os aposentos que lhe haviam sido destinados. Três dias depois mudou-se para uma vivenda na atual rua de D. Manuel II e a 14 de maio foi viver para a casa de campo do capitalista António Ferreira Pinto Basto, na rua de Entre Quintas onde hoje está o Museu Romântico.
Carlos Alberto esteve pouco tempo no Porto mas conquistou rapidamente o coração dos portuenses que o veneravam. Morreu na tarde do dia 28 de Julho de 1849 e a sua morte foi sentidamente chorada por toda a gente do Porto. Quem se der ao trabalho de ler os registos de nascimentos da segunda metade daquele ano e dos seguintes constatará que aos rapazes se dava sempre o nome de Carlos Alberto. Em 1856 foi dado ao velho largo dos Ferradores o nome do malogrado rei Carlos Alberto e o espaço foi promovido a praça. No edifício onde em 1849 funcionava a estalagem do Peixe, estão agora os Serviços Culturais da Câmara do Porto.