No final do século XX, a democracia portuguesa investia mundos e fundos num programa de celebração histórica do passado. Eram os anos da Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses e o tempo da Expo’98. Foi também o período em que à ponte 25 de Abril veio somar-se a ponte Vasco da Gama e em que ao Centro Comercial Colombo se acrescentou, a oriente da antiga capital do Império, o C.C. Vasco da Gama. A farra comemorativa foi farta e a ressaca está longe de ter sido curada.
Mas as “políticas identitárias” são insaciáveis. Querem que estejamos sistematicamente alerta para o risco de uma qualquer “perda de memória” e sempre disponíveis para nos prescreverem vacinas que nos tornem imunes ao “esquecimento”, à “crise de identidade” ou à “desmemória”, entre outras alegadas patologias que dizem assolar a nossa condição presente. Por isso, nos próximos tempos teremos de embarcar num programa de celebração dos 500 anos da morte de Vasco da Gama, campanha que inclui os atos ideológicos floridos do costume, com o primeiro-ministro da ocasião a ir aos Jerónimos depositar uma coroa junto às ossadas do defunto, e projetos editoriais rigorosamente científicos, ao cuidado dos altos dirigentes do aparelho cultural do Estado.