As mamãs moçambicanas são o pilar do lar, vão à machamba, vão à água, vão ao carvão e muitas vão sobreviver aos maridos e educar os filhos sozinhas. Dos homens espera-se apenas que tragam para casa mais dinheiro que problemas. A propósito da nossa visita à comunidade de Chinda, reuniram-se as condições para conhecermos em carne e osso oito mamãs Macondes, oito pilares de família e de uma série de tradições em vias de morrer.
De caras tatuadas, envolvidas em capulanas e com piercings no lábio, Cristina Tomás, Virgínia Nachomba Nabualo, Regina Chela, Regina Taoala Magulia, Ernestina Manamba Liava, Ernestina Tomé, Maria Simon Tobias e Equareta Samodja estavam à sombra e à nossa espera.
Os Macondes são uma etnia que se divide entre a Tanzânia, o Quénia e Moçambique, onde se concentram no planalto de Mueda, província de Cabo Delgado. O povo esteve mais ou menos protegido de guerras, negócios de escravos e outras influências externas até aos anos 20 do século passado, quando os portugueses conseguiram penetrar no mato grosso que envolvia a sua cultura. Esta “descoberta” tardia terá contribuído para preservar uma estética elaborada, visível nas tatuagens, máscaras, esculturas de madeira e danças Macondes, muito diferente das existentes no resto do país.
No dia 16 de junho de 1960 o Massacre de Mueda terá influenciado a fundação, dois anos depois, da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), enquanto movimento nacionalista com o propósito de acabar com o domínio colonial português. É curioso que parte do financiamento da guerrilha da FRELIMO nasceu do dinheiro das vendas de esculturas Macondes.
Homens e mulheres Macondes tatuam a cara e o corpo para comunicarem a sua etnia e poderem participar em rituais de iniciação. Todas estas Mamãs, por volta dos 12 anos, passaram por um doloroso processo de escarificação que decorou os seus corpos com figuras geométricas que procuravam atrair fertilidade e apaziguar as relações com os espíritos.
A preocupação com datas e anos não existe para estas mulheres. Nasceram há muito tempo, casaram-se na idade para casar, tiveram os filhos que tinham de ter e não fazem ideia das suas idades. O casamento não foi uma festa para elas, mas sim para a família que recebia o lobolo (dote) da família do marido. Era comum oferecer-se gado, um arco e flechas ou uma metralhadora e, mais recentemente, dinheiro. Quando repito a palavra maconde que designa o piercing que têm por cima do lábio superior, todas as mamãs se riem da minha pronúncia atabalhoada.
Estes pilares carregam na pele a arte dos Macondes e a sua cultura está intimamente ligada ao nascimento duma nova nação, mas adivinha-se no olhar agridoce destas Mamãs que carregar água para casa e tratar dos filhos foi e será sempre o mais importante para elas.
MINI DICIONÁRIO MACONDE PARA TOTÓS
ajala – mãe
assante niculambolela – muito obrigado ou “muito agradecido eu”
ciputu – ritual de iniciação das meninas Macondes que durante vários dias recebem formação sobre sexo, casamento e outras atividades.
dinembo – desenho ou decoração; palavra usada para “tatuagem”
jujumunu – mãe
liguilanilu – palavra que significa “compreendemo-nos todos”, o mesmo que cooperativa
lipiko – máscara
mali akulombela – lobolo; dote de casamento
mama – mãe
mapiko – dança tradicional dos Macondes; mapiko também é o nome dos bailarinos mascarados e da sua máscara
mpingo – pau-preto, madeira usada nas máscaras e esculturas Macondes
ndona – piercing em pau preto que as meninas aplicam entre o lábio e o nariz para assinalar que estão em idade para casar
shimakonde – língua maconde falada por 900 mil pessoas em Moçambique
wakudulumbuka – maluco; tótó
wakumanya – inteligente
yadi – tradição