No Centro do Rio, o mercado da Uruguaiana vende de tudo – de carregadores de telemóvel a bíblias. Fui procurar uma camisa da seleção (aqui, camisola quer dizer camisa de noite). Além de uma XL, com Ronaldo nas costas, meio escondida nas traseiras de uma barraca, só vejo camisolas do Brasil, Espanha ou Argentina. Mais adiante pergunto:
– Tem camisas de Portugal?
– Meu filho, tem muita gente perguntando. Estou perdendo negócio.
– Mas não há? Não fabricam?
Um brasileiro com cara de brasileiro, cliente potencial, aparece, interrompe e pergunta:
– Tem camisa de Portugal?
A vendedora olha para mim.
– Tá vendo? Eu não disse? Estou perdendo negócio.
Mais adiante, outro vendedor diz-me que os adeptos do Vasco da Gama esgotaram as camisolas de Portugal. O Vasco, fundado por portugueses, cujos primeiros acordes do hino são os mesmos de “A Portuguesa”, é um dos principais clubes do Rio e xodó dos emigrantes portugueses. Continuo a busca na Uruguaiana e acabo por encontrar o que quero. Trinta reais em dinheiro, 35 se pagar com cartão.
– Quer uma sacola?
– Não, não precisa. Vou vesti-la agora mesmo. Quero ir assim para casa.
Na paz
Cansados da violência das manifestações, os donos deste bar de sucos, na esquina da rua 7 de setembro com a rua Uruguaiana, decidiram apelar a traumas antigos para prevenir males futuros. E lembrando aqueles que sofreram há 64 anos, quando perderam a final no Maracanã, para o Uruguai, pedem que se parem os protestos e se poupem os turistas.
Maradona para montar e desmontar
Se o Mundial é tantas vezes uma máquina do tempo para a infância, nada melhor que misturar um ídolo com um brinquedo. O “The Guardian” online tem publicado vídeos, com bonecos de Lego, que reproduzem grandes jogadas de Copas anteriores.
O massacre
Um Espanha – Holanda não apresenta, à partida, as possibilidades dramáticas de um embate entre Argentina e Inglaterra. Mas o encontro disputado em Salvador, além de bom futebol, teve tudo o que se pediria numa boa trama de palco. Afinal, tratava-se do campeão e do vice- campeão do mundo, e ajustes de contas, no futebol das nações, são inevitáveis. Havia um terceiro protagonista, o público local, que serviu de coro acusatório e assobiou Diego Costa, a quem atribuiu o cognome de “Traidor”, por ser brasileiro, mas jogar pela Espanha. Em 1625, holandeses e espanhóis guerrearam-se por Salvador, então capital do Brasil, quando Portugal piava fininho às ordens de Felipe III. Os holandeses chegaram com 3400 militares, praticamente metade da população da cidade. Destruíram toda a iconografia religiosa e pilharam igrejas. Eu sei, é demasiado frequente fazer comparações entre a História e o futebol. Mas ontem, ao ver um grande plano da cara de Casillas, após o 5-1, era impossível não pensar nos holandeses a marchar imparáveis sobre Salvador.
Nota: os holandeses só ficaram um ano. Os espanhóis regressaram com 7 mil homens e recuperaram a cidade.
Brasil versão mini
Nas redes sociais, circulava um foto de dois miúdos do estado do Piauí, que pareciam as versões “criança” dos jogadores Thiago Silva e David Luiz. O antigo defesa do Benfica, conhecido pela sua cabeleira farta, resolveu reproduzir e publicar a foto com o colega de seleção.
Marcelolic
Quando a má sorte levou Marcelo a marcar o primeiro golo do torneio, na própria baliza, o jogador fez um sorriso pálido, nervoso, incrédulo, como se acabassem de lhe anunciar que era responsável por deixar escapar a baleia que engolira a família de todos os jogadores da seleção, incluindo a sua. O que é o sonho dos sonhos entre moleques – jogar uma Copa do Mundo, no Brasil e pelo Brasil – é também uma responsabilidade pouco igualável em outros ramos de atividade. Todos nós, em algum momento, lembramo-nos de um episódio lamentável do passado e, mesmo anos depois, sozinhos, a salvo, sentimos uma vergonha imensa, física. Tenho a certeza que, durante muitos anos, Marcelo irá sentir essa vergonha. Para ajudar, os brasileiros já o equiparam com um novo equipamento. E adaptaram-lhe nome.
Frases de outras Copas
“A Copa do Mundo às vezes lembra um concurso de misses, com mães desnaturadas na plateia. E aos olhos das mães alheias, o futebol do Brasil continua sendo o mais bonito, o mais alegre, o mais espetacular, essas coisas que nos habituamos a ouvir em língua estrangeira. Mesmo quando não está em seus melhores dias, padece de um mal passageiro, é uma miss resfriada, porque ao Brasil tudo se perdoa, exceto que não jogue como joga o Brasil.”
Chico Buarque, 12 de Julho de 1998
A Copa dos outros
Por norma, temos sempre uma segunda e uma terceira equipa quando se trata de um campeonato do mundo. Arthur Dapieve escreve sobre o tema: “Não conheço o cantão francófono de onde partiu uma bisavó, mas emocionei-me às lágrimas ambas as vezes – por terra e ar – em que cheguei a Portugal. Falta chegar por mar para berrar ´terrinha à vista!´ Em caso de eliminação do Brasil, Portugal seria uma aposta num triunfo da pátria-língua. Não faltaria simbolismo a um título lusitano obtido na maior ex-colônia”. Para ler no jornal O Globo.